A frota gaúcha envelheceu. Hoje, está mais comum encontrar veículos acima de 30 anos circulando pelo Rio Grande do Sul do que 10 anos atrás, quando 19% da frota estava nesta faixa de idade. Levantamento do Departamento Estadual de Trânsito (Detran/RS) mostra que, em 2018, havia 21,3% nessa condição, maior percentual da última década. No Brasil, veículos com esta idade representam 11,8% do total, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).
Hoje, está mais comum encontrar veículos acima de 30 anos circulando pelo RS, como o Monza, do que 10 anos atrás. André Ávila / Agencia RBS |
O crescimento, de 2,3 pontos percentuais em 10 anos no Rio Grande do Sul, pode ser relacionado a diversos fatores, como a consolidação dos transportes por aplicativo, desinteresse dos jovens por carro próprio, além da recessão, apontada pelo coordenador do Departamento de Assessoria Técnica do Detran/RS, Silvério Kist.
— Quando começou a crise, reduziu a entrada de carros novos no mercado, e a consequência foi o envelhecimento da frota — pontua.
A análise é partilhada pelo economista e professor da Feevale Ricardo de Souza Leão:
— A partir de 2013, a crise começou a se acentuar no país e, pela falta de procura, os investimentos dos empresários na produção também retrocederam.
Os números mostram que, além de os veículos com mais de 30 anos terem aumentado, os mais novos perderam espaço nas ruas. Em 2009, a maior parte da frota tinha entre um e cinco anos. No ano passado, a parcela mais representativa era a de cinco a 10 anos. Os veículos com um a cinco anos, líderes do ranking até 2014, apareciam apenas em quarto lugar.
O professor de Educação Física Matheus Trindade, 28 anos, comprou seu primeiro veículo zero-quilômetro em 2012. À época, tinha como meta trocar de carro a cada dois anos, mas nunca conseguiu. Perdeu o emprego em 2014 e se viu obrigado a permanecer com o automóvel até hoje. Com seis anos completados em 2018, o veículo está na faixa de idade mais representativa.
– É um carro bom, gosto dele. Mas, o ideal é não ficar muito tempo com o mesmo veículo por conta da desvalorização. O problema é que passei por uma fase ruim e não consegui trocar – lamenta.
Em 2009, 5% dos veículos no Estado tinham no máximo um ano de uso. O percentual começou a retrair em 2012, chegando ao menor percentual em 2016: 1,9%. Nessa mesma época, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caía pelo segundo ano consecutivo e confirmava a pior recessão da história do país. A participação percentual desta faixa de idade voltou a subir nos dois anos seguintes, porém permaneceu aquém do resultado de 2009.
Especialista defende calendário de inspeção
Doutor em transporte e ex-pesquisador do Laboratório de Sistema de Transporte (Lastran) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, João Fortini Albano destaca que o envelhecimento da frota reacende a polêmica sobre implementar um calendário de inspeção veicular obrigatória.
– À medida que os veículos vão ficando mais velhos, torna-se importante verificar as condições de freios, amortecedores, pneus e demais itens que possam oferecer risco à segurança no trânsito se não estiverem em ordem – sublinha Albano.
O crescimento médio da frota também foi afetado. De 2009 a 2010, o aumento foi de 6,6%, enquanto que de 2017 a 2018 subiu 3% – menos da metade. A virada se deu de 2012 a 2013, quando a expansão média anual passou de 6,8% para 6,4%, iniciando a curva descendente.
Dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) mostram que a venda de veículos no país caiu 21,8%, em 2015, e 20,3%, em 2016, no auge da crise. O envelhecimento e a redução do aumento da frota na década mostram que as pessoas precisaram se adequar à recessão, avalia o coordenador do Detran.
— A população estabeleceu para si uma reeducação do consumo. Pessoas deixaram de comprar o segundo carro familiar, passaram a utilizar transporte público ou por aplicativo. A bicicleta foi ganhando espaço. Ou seja, o jovem não tem aquele interesse de antes por carro — acrescenta Kist.
Gaúcha ZH