Mesmo com 10 municípios, Região Metropolitana não possui táxis entre eles

A lei estadual que cria a Região Metropolitana de Natal foi aprovada em 1997. Após 15 anos, a Lei Complementar nº 152 não foi colocada em prática, apesar de abranger 10 municípios que circundam a capital potiguar. Somente quem mora nessas áreas de divisa sabe como é difícil não ter a quem se reportar na hora de pedir solução para os problemas que surgem no cotidiano dos bairros. Um dos serviços que mais causam “dor de cabeça” nessa parte da população é o transporte público. A reportagem de O Poti/Diário de Natal vai tratar da problemática dos taxistas e moradores de São Gonçalo e de Natal, que precisam respeitar um limite de circulação que impede o trânsito livre entre os dois municípios, sem atentar para o processo de conurbação vigente nessas cidades – quando a malha urbana de duas ou mais cidades se unem em consequência de seu crescimento geográfico.
Edmilson Fernandes mantém há 10 anos um táxi com a placa de São Gonçalo do Amarante. O taxista cooperado, em razão de um decreto do município de Natal, tem autorização para circular também na Zona Norte da capital. Atendendo a solicitação de uma cliente, ele saiu de casa, no conjunto Potengi, e foi até uma loja no Centro da Cidade pegá-la. Na volta foi abordado por um fiscal da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob), que questionou se ele estava pegando passageiros em Natal. “Fui pegar a minha cliente. Ela me ligou e estava numa loja lá na Cidade”, relatou Edmilson, quando se justificou para o fiscal de trânsito.
Não teve explicação que fizesse o guarda liberar Edmilson. O representante da Semob aplicou uma multa de R$ 358 e mandou o carro do taxista para um depósito, até a multa ser paga. O motorista prestou queixa na Delegacia do bairro das Quintas e seguiu para o depósito, na Avenida da Integração, junto com a cliente Francisca da Silva, que ligou para Edmilson porque não estava com dinheiro para pagar um táxi e “acertaria” a corrida depois. Francisca afirma que mora no Igapó e já faz costumeiramente corridas com Edmilson, que são pagas apenas no final do mês. “Me perguntaram se eu tinha ligado. Eu disse que sim. Mas eles mandaram levar o carro”, declarou a cliente.
O taxista ficou das 14h30 até às 17h esperando o filho conseguir dinheiro para liberar o carro ou pelo menos uma carona. O episódio aconteceu em uma sexta-feira, e o carro ficou preso no pátio até a quinta-feira da semana seguinte. O taxista conseguiu pagar a multa e marcar uma conversa com o secretário da Semob, Márcio Sá, que reafirmou a viabilidade da multa. “O secretário disse que era mesmo infração. Mas ele tirou as diárias que a gente pagaria no pátio”, esclareceu Edmilson.
O decreto, que permite aos taxistas de São Gonçalo circularem por Natal, parece um benefício, mas na verdade gerou um problema que ronda a vida desses profissionais. Um dos principais pontos negativos dessa divisão da circulação dos táxis é o geográfico. Ao cruzar a ponte de Igapó, no sentido Zona Sul – Zona Norte, ao lado direito fica o bairro de Igapó, que pertence a Natale no esquerdo está o Jardim Lola, de São Gonçalo do Amarante. Os municípios são divididos apenas pela avenida Tomaz Landim. A situação deixa indefinido qual deve ser o táxi para atender o público que transita da Zona Norte para as outras regiões da cidade.
“O taxista que sai da Zona Norte para outra área corre o risco de ser pego pela Semob”, lembra Edmilson. O secretário adjunto de Transporte de Natal, Jeferson Pedrosa, diz que a situação não tem solução e que a secretaria está cumprindo a lei. Segundo Jeferson, se a passageira estiver em Natal, mesmo ela ligando para o taxista, ele não pode pegá-la. “A passageira precisa sair com ele para o destino. O taxista também precisa ter uma nota fiscal com origem e destino e o valor a ser cobrado”, informou. Jeferson esclarece que os taxistas de Natal não podem ir para Zona Norte. A reportagem não observou a presença da Semob na ZN, o que impossibilita a fiscalização dos carros da capital na área. “As concessões de táxi são para circular no município”, justificou. Se em cada município deveria circular apenas a sua frota específica de táxis, os taxistas de São Gonçalo não deveriam estar na Zona Norte. Porém, o município da região metropolitana distribuiu demasiadamente concessões de táxis. Hoje a cidade tem 785 carros, enquanto a capital conta com 1.010. O decreto da então prefeita Wilma de Faria, permitindo a circulação na ZN, amenizou a situação de São Gonçalo, mas criou outra para capital potiguar.
Legislação evitaria problemas: Com cerca de 90 mil habitantes, São Gonçalo do Amarante tem 785 táxis, enquanto Natal tem 1.010 para uma população de quase um milhão de pessoas. Na capital, o decreto de lei n.º 2.954/84 exige uma proporção de mil habitantes para cada táxi em circulação. O número máximo já foi atingido em 2009, e desde essa data o número de permissionários permanece o mesmo. O diretor de Operações da Secretaria de Trânsito e Transporte de São Gonçalo do Amarante, Paulo Roberto, diz que a atual gestão não fez novas concessões de táxis e que o problema veio da quantidade concedida nas administrações anteriores. Questionado sobre a fiscalização do município em relação a circulação correta dos taxistas, Paulo respondeu levantando mais um ponto da burocracia existente na área de divisa com a capital. “De 80% a 90% dos táxis circulam na Zona Norte. Para fazer a fiscalização nós precisamos da autorização da Semob, porque lá é área de Natal”, justificou.
Na opinião de Paulo Roberto, se a lei estadual 8.316/03 fosse respeitada evitaria muitos problemas. A legislação em vigor há 10 anos assegura a livre circulação na capital do Estado, aos táxis que formam a frota dos municípios que compõem a Região Metropolitana de Natal. O texto deixa claro ainda, que apesar disso, fica vedado aos taxistas cadastrados nos demais municípios da Região Metropolitana fazer ponto, ocupar praças e postos de serviços de taxistas da capital. “Até onde sei, o táxi não pode ficar pegando passageiros, mas ir até lá não é proibido”, salientou o diretor de Operações.
Enquanto os taxistas de São Gonçalo estão preocupados em poder circular sem sofrer fiscalização em Natal, a categoria da capital enxerga os profissionais do outro município como uma forte concorrência. Embora, o presidente do Sindicato dos taxistas de Natal, Alex Manguinho, salienta que praticamente não encontra taxistas de São Gonçalo nas ruas da capital. Ele explica que desde foi permitido a circulação dos carros de São Gonçalo na Zona Norte poucos carros passam a ponte. “A gente tem se preocupado mais com os particulares”, lembrou. Porém, Alex não é favorável a um plano que unifique os táxis da Região Metropolitana. “Muitos desses municípios não tem controle das concessões”, opinou.
Saiba mais: Há dois anos um motorista de táxi ganhou uma ação judicial movida contra o a Semob. O Poder Judiciário determinou a liberação imediata do veículo, que foi apreendido por agentes da secretaria. No dia 5 de dezembro de 2009, o autor da ação circulava em seu táxi, transportando passageiros de São Gonçalo para Natal. Ele foi abordado por agentes da Semob que apreenderam o veículo, sob a alegação de captação ilegal de passageiros.
O taxista entrou com o processo pedindo o direito de continuar transportando pessoas do seu município para outro município. Para a juíza, a suposta infração cometida não permitia que ele tivesse apreendido o veículo. A magistrada tomou como ilegal a apreensão do carro do autor. Já sobre o transporte dos passageiros entre os municípios, ela entendeu que não houve objeção da Semob em relação a este direito.
Integração existente só no papel: Natal, São Gonçalo do Amarante, Macaíba, Extremoz, Ceará Mirim, Nísia Floresta, São José de Mipibu, Monte Alegre e Vera Cruz são os municípios que compõe a Região Metropolitana, criada até o momento, somente no papel. Há anos que esses municípios não se encontraram para tratar dos problemas de suas áreas de divisa. A lei que cria a Região Metropolitana foi de 1997 e até o momento poucos avanços foram vistos. O Conselho de Desenvolvimento Metropolitano de Natal (CDMN) é composto pelos nove prefeitos, pelo Governo Estadual, pela Assembleia Legislativa e pelo Parlamento Comum da Região Metropolitana de Natal. Esse seria um grupo com uma espécie de gestão compartilhada para apreciar os principais assuntos de interesse comum da Região.
“Desde que o Governo assumiu não teve nenhum reunião. Esse conselho funcionou mesmo entre 2005 e 2008. Depois tiveram poucas reuniões. O conselho é para discutir todas as agendas, inclusive, o transporte público, que tem causado bastante problema para população”, explicou o vereador George Câmara, membro do Parlamento Comum da Região Metropolitana. Ele explica que o Parlamento (que também tem se encontrado pouco) não pode substituir o Conselho, visto que uma Câmara Municipal não legisla sobre as outras. A reportagem tentou falar com o secretário estadual de Planejamento, Obery Rodrigues, que seria responsável pelo Conselho (subordinado à Seplan), sem sucesso.

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