Para quem não conhece, pode parecer fácil saber quais os pontos em um determinado trajeto que os ônibus mais lotam e esvaziam.
Mas a questão não é tão simples assim. Nem sempre pela bilhetagem eletrônica é possível ter estes dados de forma precisa. Muitas vezes, o passageiro logo depois que embarca, não passa pela catraca. Quando vai passar, o ônibus já está em outro lugar e a geolocalização não vai informar exatamente onde ocorreu o embarque. E sobre o desembarque? Não tem como mensurar pela bilhetagem também de forma precisa. Pelas integrações com outras linhas, é possível ter uma noção. Mas nem todo o mundo faz integração. É possível até subtrair o total de passageiros que se integraram com outras linhas com os que não fizeram integração. Mesmo assim, não dá para saber precisamente onde ocorreu o desembarque do passageiro não integrado.
Isso sem contar com passageiros que não usam cartões, como idosos com 65 anos ou mais que têm o direito ao transporte só mostrando o RG.
Há também uma questão importante. Numa mesma linha, no decorrer do dia e da semana, pode haver vários padrões de demanda. Por exemplo, o ônibus que passa perto de fábricas, normalmente pode ter lotação maior no início da manhã e no final da tarde. Se a mesma linha também passar perto de faculdade, também pode ter lotação no início e final da noite. Ainda mais, se esta mesma linha passar perto de uma grande igreja, pode lotar aos domingos também, nas entradas ou saídas de missas ou cultos.
Claro que perto de fábricas, faculdades e igrejas é fácil saber onde o ônibus vai esvaziar na ida e encher na volta. Mas de onde veio e, depois, para onde vai esta demanda?
Além disso, há outra questão importante para o conforto do passageiro. Não seria uma boa você saber se o ônibus que se aproxima está muito cheio e saber se o próximo vai demorar e se está vazio?
Mas isso só seria possível se os ônibus, em vez de catracas, tivessem porteiros contando todo mundo que entra e sai.
Pois é, mas a tecnologia permite tudo isso e já está sendo testada na Grande São Paulo, inclusive com premiação internacional já.
Trata-se do “Milênio Bus”, um sistema de sensores e contadores eletrônicos instalados nas portas do ônibus.
O dispositivo é testado em um veículo da Metra, que opera o Corredor ABD de ônibus e trólebus.
O projeto foi elaborado por jovens engenheiros brasileiros e já recebeu um prêmio internacional de inovação em transporte na Suíça.
A ideia teve desenvolvimento na 1ª Hackatona Metropolitana da EMTU e Metra e é de responsabilidade de engenheiro de produção Renato Rodrigues, de 30 anos, engenheiro de controle e automação, Marcel Ogando 28 anos, e do estudante de Engenharia de Controle e Automação, Fábien Oliveira, 22, que juntos compõem a equipe Top Down.
Eles ganharam a Olimpíada Internacional de Tecnologia e Inovação (ICC’2017) em Martigny, na Suíça, que ocorreu entre os dias 30 de agosto e 19 de setembro. O evento reuniu cerca de 40 pesquisadores do mundo todo.
Se contadores eletrônicos podem até não ser algo tão novo, embora muito pouco usado nos transportes de passageiros, transformar os dados em informações úteis para os usuários pode significar mais poder de escolha, como entre pegar um ônibus lotado e esperar mais um pouco e poder ir até sentado.
A ideia dos Milênio Bus consiste na criação de sensores capazes de verificar em tempo real quantas pessoas embarcam e desembarcam dos ônibus. O intuito é que as informações de lotação do coletivo possam ser compartilhadas pelos usuários por meio de um aplicativo, no qual também será possível realizar compras de crédito do transporte.
A iniciativa do grupo surgiu durante a 1ª Hackatona Metropolitana, promovida pela Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos (EMTU) e pela Concessionária Metra. A equipe foi uma das vencedoras do evento de tecnologia e mobilidade urbana e passou a desenvolver o projeto no laboratório de inovação das empresas, o [E] LAB – Experimentos em Transportes. Com o avanço no dispositivo, os rapazes se inscreveram na Olimpíada Internacional – diz nota da EMTU enviada ao Diário do Transporte.
O presidente da EMTU, Joaquim Lopes, diz que é interessante que as soluções partam de quem usa o sistema de transportes e sabe de suas dificuldades e necessidades.
“É uma satisfação saber que um projeto em construção no nosso laboratório tem reconhecimento. Isso reforça que, quando chamamos a sociedade para participar de ações com o setor público o resultado é sempre muito surpreendente”
Na mesma nota, a coordenadora do Núcleo de Parcerias + Inovação da EMTU, Renata Veríssimo, afirmou que o interessante é saber que o grupo começou a pensar em soluções a partir de dificuldades reais no trânsito do Brasil e que podem ser utilizadas em diversas partes do mundo. “A importância de eles trazerem essa vitória é ver que o [E] LAB – Experimentos em Transportes está atuando como espaço facilitador de inovações no transporte”, afirma.
Além do título de vencedores da Olimpíada Internacional de Tecnologia e Inovação, a equipe Top Down recebeu um cheque de cinco mil francos suíços, equivalente a R$ 18 mil.
O grupo já instalou protótipos dos sensores em um dos veículos da Metra e está em teste no Corredor ABD, operado pela empresa e gerenciado pela EMTU, complementa a nota.
Além de informar melhor o passageiro sobre a lotação, ao retratar de maneira mais fiel o comportamento da demanda, a tecnologia pode ajudar no melhor planejamento de linhas e dimensionamento da frota, além de possibilitar seccionamentos de linhas ou mesmo prolongamentos mais condizentes com a realidade.
Hoje em alguns horários faltam ônibus e, em outros, os ônibus circulam extremamente vazios.
Diário do Transporte