O trânsito excessivo ou o reduzido número de passeios e faixas de pedestres são alguns dos motivos apontados por crianças de 6 a 11 anos para explicar por que não se sentem confortáveis em fazer seus deslocamentos entre a casa e a escola a pé. Os resultados são de um estudo da arquiteta paisagista Andreia Ramos, para a sua tese de mestrado pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), recentemente concluída, e têm por base um trabalho feito num agrupamento de escolas de Gondomar (cidade portuguesa da área metropolitana do Porto).
Foto: Nuno Ferreira Santos |
De acordo com o trabalho de investigação, menos de um quarto (24%) dos estudantes vai a pé ou de bicicleta para a escola. Os restantes alunos usam meios de transporte motorizados, sendo que 50% do total o fazem no automóvel particular da família ou de amigos.
O cenário poderia ser diferente se as crianças decidissem, concluiu Andreia Ramos. Foi perguntado aos participantes qual o meio de transporte que utilizariam no deslocamento casa-escola-casa se pudessem escolher. Oito em cada dez disseram preferir fazer o percurso por meios não motorizados.
As crianças evidenciaram “grande vontade de terem uma determinada autonomia” nos deslocamentos de que atualmente não dispõem, diz Andreia Ramos ao site do jornal Público.
No questionário aplicado aos estudantes, os jovens explicaram ainda que, sem a supervisão de adultos, não se sentem seguros nestes deslocamentos, e os principais motivos apontados estão relacionados com o espaço físico existente – o trânsito excessivo ou o reduzido número de passeios e faixas de pedestres. Só depois destes motivos aparecem nas respostas dos alunos questões relacionadas com a segurança pessoal, como o medo de serem assaltados ou de se perderem.
“Prioridade ao peão”
Estes dados permitem a Andreia Ramos concluir que o escasso uso de meios de transporte não motorizados nas deslocações entre casa e escola tem esta explicação: as cidades “não são pensadas para as crianças”.
“As cidades são projetadas pensando no transporte motorizado. Têm poucas preocupações com os acessos pedonais e são muitas vezes demasiado dispersas”, explica a arquiteta paisagista.
No estudo foram inquiridos 191 estudantes do Agrupamento de Escolas de Rio Tinto, no concelho de Gondomar, dos 1º e 2º ciclos — ou seja, crianças entre os 6 e os 11 anos. De modo a evitar que o cansaço ou a falta de atenção afetassem as respostas dos participantes, a investigadora aplicou o questionário por meio de jogos didáticos e visitas de estudo.
“Quando andávamos com eles na rua, eles ficavam maravilhados. Tinham liberdade e não estavam acostumados”, conta a arquiteta paisagista, que atualmente trabalha no instituto A Criança na Cidade, com sede em Vila Nova de Gaia (Porto). “As crianças parecem conceber a rua como o espaço do automóvel e, por isso, considera-se urgente recentrar a rua nos peões e especificamente nas crianças, para os casos dos percursos casa-escola.”
Andreia Ramos recomenda, assim, uma maior atenção ao conceito de zonas de coexistência, o que pressupõe a partilha dos espaços urbanos por diferentes utilizadores e tipos de meios de transporte, passando a ser dada “prioridade ao peão” e a outros modos de deslocamento não motorizados nos percursos casa-escola.
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