Compartilhamento de carros elétricos fracassa em Paris

A ideia parece perfeita: em vez de adquirir um carro que ficará parado a maior parte do tempo, opta-se pelo uso compartilhado. Melhor ainda: os veículos são elétricos. Esse é o conceito básico do Autolib e seus carrinhos franceses, que, apesar da simpatia que despertam, tornaram-se um fracasso enquanto negócio.

Os veículos circulam por Paris e seus arredores desde 2011. Há 100 mil usuários inscritos e cerca de 4.000 automóveis em 1.100 estações.
É basicamente o mesmo esquema das bicicletas compartilhadas disponíveis na capital paulista. Porém, carros são mais complexos e caros que bicicletas.
Vincent Bolloré, dono da empresa que administra o sistema, viu o negócio tornar-se insustentável. Os custos com reparos e limpeza são tão altos e frequentes que deterioram as contas.
Outras soluções modernas de mobilidade urbana passaram a disputar a atenção dos franceses, mas essa não é a principal questão.
O maior problema está na gênese humana e no seu talento em deteriorar o que é público. Se o carro é de todos, não é de ninguém. Perdem os franceses, principalmente os 270 funcionários envolvidos na operação do serviço.
Em 2016, durante a cobertura do Salão do Automóvel de Paris, havia um ponto do Autolib em frente ao hotel em que eu estava hospedado, em Montparnasse. A pintura prateada esmaecida ressaltava os anos de uso.
Pela janela, pude ver guardanapos deixados ali por algum usuário. Perguntei sobre o serviço a um funcionário do hotel, que relatou problemas com a limpeza. Motoristas e passageiros deixam guimbas de cigarro, restos de fast-food e outras porcarias a bordo.
A imprensa francesa relata casos de arrombamento por moradores de rua, que dormem nos veículos. Usuários de drogas também são passageiros constantes.
O contrato atual de concessão do serviço deveria ir até 2023 e lucrar o equivalente a R$ 250 milhões. Entretanto, a interrupção do serviço deixa uma dívida igualmente milionária.
O contrato foi rescindido no fim de junho, e os carrinhos devem ser retirados das ruas de Paris até o fim deste mês.
Vincent Bolloré vai continuar investindo em mobilidade eletrificada, mas sem oferecer serviços públicos. Sua empresa produz baterias, setor que tende a crescer com a chegada de novos carros híbridos e elétricos.
Não se sabe ainda se outra empresa terá coragem de assumir o projeto Autolib e fazê-lo ser rentável.
Só há duas alternativas para isso: ou muda-se o sistema de compartilhamento, ou o ser humano muda.
Eduardo Sodré – Folha de SP

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