Uber pode perder no TST precedente favorável

Do Valor Econômico
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom (Agência Brasil)

A Uber pode vir a perder um precedente no Tribunal Superior do Trabalho (TST) que não reconheceu vínculo de emprego com um motorista. A Subseção I da Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-I), que reúne 14 dos 26 ministros, começou a analisar se a decisão da 5ª Turma violou a Súmula 126 do TST. Por esse enunciado, a Corte não pode, por meio de recursos, reexaminar fatos e provas.

Proferida em fevereiro de 2020, a decisão questionada agora foi a primeira em que o TST se debruçou sobre a disputa entre motoristas e a Uber. Na ocasião, os ministros reverteram posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (2ª Região) a favor do reconhecimento da relação de emprego.

A discussão, na SDI-I é se os ministros da turma reinterpretaram o depoimento do trabalhador prestado em primeira instância, especialmente quando afirmou que poderia ficar desconectado (off-line) da plataforma sem limite de tempo (processo nº 1000123-89.2017.5.02.0038).

Para o colegiado, seria demonstração de que ele teria autonomia e relação à Uber. O TRT de São Paulo, porém, havia entendido que há subordinação porque o trabalhador também afirmou que havia incentivos para permanência on-line (conectado) e possibilidade de punição se ficasse off-line.

Em seu voto, o relator do caso, ministro Alexandre Ramos, não reconheceu a violação à súmula do TST. Afirmou que a turma fez um reenquadramento dos fatos.

“A turma concluiu ter elementos para um novo reenquadramento no sentido de que motoristas de aplicativos não têm subordinação porque possuem autonomia para aderir ao serviço, tendo confissão do reclamante [trabalhador] poder ficar off-line sem limitação de tempo. A turma fez um reenquadramento dos fatos, de que eles não ensejariam relação de emprego”, disse. Ele foi acompanhado pela ministra Maria Cristina Peduzzi.

Mas os ministros Augusto Cesar Carvalho, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho e Alberto Bresciani divergiram. Entenderam que a turma reexaminou fatos e provas. Isso porque o Tribunal Regional do Trabalho, ao analisar o depoimento, considerou que o motorista poderia ser punido pela plataforma, com o descredenciamento, por permanecer off-line.

A turma e o TRT também tiveram interpretações diferentes sobre o fato de que, do valor pago pelo usuário, o motorista fica com 75% a 80%. Para os ministros da 5ª Turma, configuraria parceria comercial. O TRT entendeu que não, ao ponderar que o trabalhador arca com diversas despesas – combustível, aluguel do veículo e provedor de internet, por exemplo.

“O tema é sensível. Nesse caso, há moldura factual rica para revelar que estariam presentes os quatro elementos necessários à configuração do emprego”, afirmou o ministro Augusto Cesar Carvalho. “A turma teria cindido o depoimento para dela não aproveitar e conformar as declarações sobre o tempo off-line, a lógica empresarial de estimular a permanência on-line e a ameaça de dispensa”, acrescentou.

O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Breno Medeiros, que relatou o caso na 5ª Turma. Não há ainda nova data para a retomada do julgamento.

De acordo com o advogado Fernando Abdala, um dos representantes da Uber no caso analisado pelos ministros da 5ª Turma, a SDI-I pode anular a decisão e manter o entendimento do TRT de São Paulo, favorável ao motorista, ou “avançar e entrar no mérito”.

Além de poder perder esse precedente, a Uber corre o risco de perder disputa semelhante na 3ª Turma. Falta um voto para a empresa ser derrotada. Dois dos três ministros do colegiado entenderam estarem preenchidos os requisitos para enquadrar o trabalhador como funcionário da empresa. O julgamento, retomado anteontem, foi suspenso por novo pedido de vista.

A sessão foi reiniciada com o voto do ministro Alberto Luiz Bresciani, que vai se aposentar neste ano. Ele seguiu o entendimento do relator do processo, ministro Mauricio Godinho Delgado, que havia proferido voto há um ano – em dezembro de 2020. Não foi concluído o julgamento porque o ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte pediu mais tempo para analisar a questão (processo nº 100353-02.2017.5.01.0066).

A deliberação na turma é importante porque pode abrir precedente no TST a favor do trabalhador. Até então, apenas duas de oito turmas da Corte – 4ª e 5ª – haviam analisado a disputa, em cinco processos. Todos a favor da Uber. Agora, a 3ª Turma pode abrir a divergência.

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