Uma das principais exigências das empresas de ônibus para a licitação, o subsídio da tarifa do transporte público não é viável atualmente para a Prefeitura de Natal por insuficiência financeira, segundo o prefeito Álvaro Dias. A licitação, seis meses atrasada em relação ao prazo inicial para ser lançada, deve prever o subsídio, a ser feito através de um fundo de financiamento criado em 2015, mas que não está previsto no orçamento de 2020 – sem isso, o fundo não pode ser utilizado este ano.
Foto: Ilustração/Arquivo – UNIBUS RN |
De acordo com Álvaro Dias, o subsídio do transporte por parte do município é o “ideal”, mas a arrecadação atual “não permite que essa questão possa ser sequer suscitada”. “Eu acredito que com o subsídio concedido pelo próprio município poderia se modernizar a frota, fazer com que houvessem investimentos mais significativos, para instalar ar-condicionado, haver mais conforto. Mas, na atualidade, não se pode nem pensar nisso”, declarou no dia 18 de dezembro, em entrevista à TRIBUNA DO NORTE.
Os subsídios foram aprovados na lei de licitação do transporte público, ainda em 2015, para a administração municipal cobrir os benefícios concedidos aos passageiros, como a gratuidade para idosos, a meia tarifa para os estudantes e as integrações. Atualmente, para arcar com os benefícios, as empresas cobram 95 centavos na passagem (R$ 4). Ou seja, o custeio é feito pelos usuários do transporte que utilizam a passagem inteira.
Prevista para ser aberta este ano, a licitação vai regulamentar o Fundo Municipal de Transportes Coletivos (FMTC) com o objetivo de financiar em 20% o subsídio das tarifas, informou o presidente da Comissão de Licitação da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (STTU), Newton Filho. Mas, sem a previsão no orçamento atual, ele não pode ser utilizado pelo menos até o ano que vem. A informação foi confirmada pelo procurador-geral do Município, Carlos Castim.
Outro impedimento para a implementação do subsídio é a ausência de uma lei específica para a criação de um “programa de concessão de subsídios”, prevista na legislação municipal de 2015 que regulamentou o transporte (Lei Complementar Nº 49/2015). Atualmente, não há nenhum projeto de lei na Câmara Municipal com o objetivo de criar essa lei.
Em 2016 e 2017, com o lançamento de dois editais de licitação do transporte, a ausência do subsídio foi um dos fatores que levou os empresários a não participarem dos processos. Na avaliação do consultor técnico do Sindicato das Empresas de Transporte Urbanos (Seturn), Nilson Queiroga, sem o custeio dos benefícios feitos pela prefeitura a tendência é a perda de passageiros por encarecimento do preço da passagem.
Entre 2014 e 2018, o transporte coletivo de Natal registrou uma queda de 20 milhões de passagens nos ônibus, entre inteiras, meias e gratuidades. A razão para isso está ligada ao preço da passagem, que se tornou R$ 1,30 mais cara no período na tentativa das empresas manterem a receita. No Brasil, essa é a segunda maior causa para o abandono do ônibus, segundo uma pesquisa feita pelo Conselho Nacional de Transporte em 2017.
“Sem subsídio, o preço fica muito mais caro para o usuário, que arca com o benefício da meia tarifa e das gratuidades. Com a chegada de novos formatos de transporte, esse modelo vai entrar em colapso porque há situações em que se torna mais barato dividir um carro por aplicativo do que pegar um ônibus”, explicou Queiroga. O consultor também afirmou que as informações sobre a licitação são desconhecidas, mas que “se não houver subsídio de novo, vai pesar negativamente para o sucesso”.
Modelos de subsídios
No Brasil, o subsídio tarifário é utilizado de dois modos: através da isenção de impostos ou com os repasses para as empresas. Um estudo elaborado no ano passado pelo Seturn indica que somente seis capitais brasileiras, inclusive Natal, não utilizam nenhuma forma de custeio.
Carlos Castim, Procurador-geral do Município: licitação está perto de ser lançada. Foto: Magnus Nascimento/Tribuna do Norte |
O modelo com o custeio pago pelas prefeituras é mais conhecido em São Paulo, onde o Município chegou a gastar R$ 3 bilhões em 2019. Para este ano, a previsão é gastar R$ 2 bilhões.
Edital de licitação foi adiado quatro vezes
Um ano depois da sanção da lei que realizou mudanças na regulamentação do transporte, o edital de licitação ainda não foi lançado. A demora incomoda o prefeito Álvaro Dias, que declarou estar preocupado com a questão. “Tem demorado mais que o usual”, informou o prefeito. A data de abertura foi adiada quatro vezes, desde que os anúncios se iniciaram, em junho do ano passado.
O processo se encontra desde o dia 18 de dezembro na assessoria jurídica da Secretaria Municipal de Administração (Semad) com diligências pedidas pela Procuradoria-Geral do Município. Segundo o procurador-geral Carlos Castim, restam algumas dúvidas jurídicas em torno do processo. “Precisamos esperar essas diligências serem respondidas para dar o parecer em relação ao edital”, disse.
Já a parte técnica da licitação está finalizada, disse Newton Filho, responsável pelo processo na STTU. Ele justificou a demora devido à complexidade da matéria. “Como é uma licitação de grande porte, há muitos detalhes que precisam ser observados, mas acredito que está perto de ser lançada”, informou.
Nilson Queiroga, consultor técnico do Seturn: sem subsídio tarifa fica mais alta. Foto: Adriano Abreu/Tribuna do Norte |
No primeiro edital de licitação de transporte lançado pela STTU, no fim de 2016, o tempo entre a sanção da lei e o lançamento do processo durou 1 ano e 6 meses, segundo o processo protocolado na Prefeitura de Natal. O edital deu deserto. Seis meses depois, em maio de 2017, a prefeitura fez outra tentativa, também frustrada.
A prefeitura decidiu realizar mudanças na lei aprovada em 2015 para se adequar aos pedidos dos empresários, aprovando a previsão de 20% das receitas do Fundo Municipal de Transporte Coletivo (FMTC) para o subsídio, redução gradual da idade mínima para gratuidade dos idosos de 65 para 60 anos e idade média de veículos de até 4 anos. As mudanças foram aprovadas em dezembro de 2018 pela Câmara Municipal de Natal.
Desde então, o lançamento da licitação é esperado para melhorar a frota de ônibus de Natal, que é a mais velha entre as capitais do nordeste, com a tarifa mais cara.
O que
Fundo Municipal de Transportes Coletivos (FMTC) Criado em 2015, o FMTC é um fundo para melhorar os recursos de investimento no transporte urbano de Natal. A legislação atual fixa em 20% das receitas o uso desse fundo para subsídios de passagens. Entretanto, ele ainda não funciona por falta de regulamentação.
O FMTC vai ser abastecido por:
Outorgas da licitação;
Estacionamento rotativo (em licitação);
Receitas decorrentes de multas aplicadas aos serviços públicos de transporte coletivo;
Receitas de convênios, termos de cooperação, ajustamento de condutas, acordos ou contratos;
Receitas de publicidade dos veículos;
Transferência direta do Tesouro
Tribuna do Norte