Os passageiros do transporte público têm tido mais chances de pegar ônibus e metrôs mais vazios em cidades como Nova York, Los Angeles e Londres. Nos últimos anos, esses meios de transportes vêm perdendo usuários nessas metrópoles.
Foto: Ilustração/UNIBUS RN |
Entre 2017 e 2018, a rede pública da maior cidade americana deixou de levar 176 mil passageiros por dia, em média. Londres teve queda próxima no período: seu transporte público, que inclui os icônicos ônibus vermelhos e o metrô mais antigo do mundo, teve 106 mil viagens a menos.
Nos EUA, o total de usuários transportados nas cidades caiu 2% em 2018, na comparação com 2017, segundo dados da APTA (Associação do Transporte Público Americano). Em Los Angeles, houve 37 mil viagens diárias a menos, em média. Chicago (31 mil) e Washington (29 mil) também tiveram baixas.
Entre os diferentes modais, o ônibus é o mais afetado. “Nos últimos anos, muitas cidades tiveram aumento nos congestionamentos, o que atrasa as viagens e torna o ônibus menos atrativo”, disse à Folha Matthew Dickens, analista sênior da APTA.
No Brasil, os ônibus urbanos perderam 17% dos usuários que tinham entre 2012 e 2017, segundo a NTU, associação empresarial do setor. Já o transporte sobre trilhos teve alta de 21% no número de passageiros em 2018 em relação ao ano anterior, segundo a ANPTrilhos, devido à abertura de novas linhas. Apenas nove estados e o DF possuem trens, metrô ou bondes VLT.
Outras razões apontadas por Dickens para a queda nos EUA são a prática de home office, que reduz a necessidade de deslocamento, e a disputa com aplicativos de transporte, como Uber. “Esses novos meios são subsidiados pelas empresas para que tenham um preço competitivo em relação ao transporte público.”
Um estudo da Universidade de Kentucky publicado em agosto aponta que a chegada dos apps levou a uma queda de 1,3% no uso de trens e metrô e de 1,8% no de ônibus, a cada ano. A pesquisa levou em conta dados de 25 cidades.
“Esse efeito aumenta com o tempo, conforme cresce o uso desses aplicativos”, conclui o estudo. “Após oito anos, isso pode ser associado à queda de 12,7% no uso dos ônibus.”
Em Nova York, uma das poucas cidades que oferece dados públicos sobre os aplicativos, o total de viagens feitas por eles subiu de 60 mil para 600 mil por dia entre 2015 e 2018.
O estudo apontou ainda que a chegada de um serviço de empréstimo de bicicletas a uma cidade é capaz de aumentar o uso de transportes sobre trilhos, mas levar a uma queda de 1,8% nas viagens de ônibus.
A falta de público coloca as empresas de transporte em uma espiral de queda. Com menos usuários, há menos dinheiro em caixa. Para cortar gastos, a saída costuma ser eliminar linhas, diminuir a frequência dos coletivos e investir menos em renovação da frota. Isso torna o serviço ruim e afasta ainda mais passageiros, realimentando o problema.
Para quebrar o ciclo, governos e empresas buscam novas formas de obter dinheiro, principalmente a partir de novas taxas aos usuários de carro. Nova York aprovou um pedágio urbano em abril, cuja arrecadação será direcionada a melhorar o transporte público.
Outra frente, com avanços ainda tímidos, é oferecer viagens apenas sob demanda. Neste modelo, o usuário avisa por um aplicativo para onde deseja ir, antes de se dirigir ao ponto, onde passará uma van ou ônibus que leva apenas passageiros que reservaram a viagem antes.
O veículo faz uma rota maleável, para se adaptar à demanda: se não houver gente, não é preciso cumprir o itinerário todo, por exemplo. Isso reduz custos e evita rodar com lugares vazios.
Testes com essa tecnologia estão sendo feitos em Londres, Goiânia e São Bernardo do Campo, ainda em pequena escala. No futuro, essas vans poderão ser guiadas por computador, sem motorista, o que gerará mais economia.
“No futuro, a receita desse serviço poderá ajudar a custear o sistema”, diz Edmundo Pinheiro, presidente da HP, empresa de ônibus que testa as vans sob demanda em Goiânia.
“De modo geral, as viagens curtas e médias ajudam a equilibrar o custo das viagens longas. A perda dessas viagens menores, que estão indo para aplicativos e bicicletas, gera ainda mais desequilíbrio.”
Enquanto esses novos modelos não chegam, o transporte público poderia investir em maior integração entre os serviços. No Brasil, é comum que serviços intermunicipais e locais operem de forma isolada, embora circulem nas mesmas vias.
“Na Alemanha, o governo federal passou a só liberar investimentos para as cidades se os projetos forem integrados”, diz Cristina Albuquerque, gerente de mobilidade urbana do instituto de pesquisas WRI.
Outra sugestão dela é melhorar a comunicação. “O transporte público pode oferecer rapidez e pontualidade, mas não terá o mesmo conforto de um carro. É preciso deixar claro o que as pessoas podem esperar dele e ser capaz de cumprir.”
Folha de SP