PE: Empresas de ônibus do Grande Recife são processadas pelo MPT

O Ministério Público do Trabalho em Pernambuco está entrando com ações civis públicas contra as 18 empresas de ônibus da Região Metropolitana do Recife devido às condições de trabalho as quais são submetidos motoristas e cobradores. Os detalhes das ações foram divulgados na manhã do último dia 17.
A procuradora Vanessa Patriota explicou que as empresas estão sendo acionadas individualmente, levando-se em conta dados do INSS e de um estudo feito pelas Universidades de Pernambuco (UPE) e Federal de Pernambuco (UFPE). “Temos um primeiro bloco com sete ações, que entramos semana passada. Até o final de setembro, vamos entrar com as outras. Dependemos de relatórios que estão sendo concluídos”, detalha.
A pesquisa foi feita com 19 empresas de ônibus, mas apenas as 18 que atuam junto ao Grande Recife Consórcio de Transporte estão sendo acionados. Até o momento, o MPT entrou com ações contra as empresas Cidade Alta, Viação Mirim, CRT, Itamaracá, Pedrosa, São Judas Tadeu e Cruzeiro. “Uma empresa de microônibus acabou sendo incluída, mas ela não faz parte do nosso objetivo. Nosso foco nesse trabalho, que começou em dezembro de 2011, é o trabalhador da Região Metropolitana do Recife”, explica Patriota.
Um dos dados que chamou a atenção dos procuradores foi o alto número de benefícios concedidos a cobradores e motoristas de ônibus – foram quase cinco mil desde 2009. De acordo com dados do Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros no Estado de Pernambuco (Urbana-PE), são aproximadamente 14 mil cobradores e motoristas que atuam no Grande Recife. “É importante lembrar que esses são afastamentos maiores que 15 dias. Licenças médicas de dois, seis dias, são ‘invisíveis’ para o INSS”, destaca a procuradora.
A maior parte dos benefícios foi concedido por problemas osteomusculares, como hérnia de disco e lombalgia, seguido de traumas e fatores psicológicos. “Na pesquisa feita com os motoristas e cobradores, 68% deles revelaram já ter sido assaltados, muitos mais que uma vez, e aproximadamente 70% disseram não se sentir seguros no local de trabalho. Isso somado ao estresse, trânsito, você entende porque crescem os números de pessoas afastadas com depressão”, pontua Vanessa Patriota.
Os casos de excesso de carga horária também são alarmantes, aponta o procurador do Trabalho Leonardo Mendonça. “Não temos o número exato, pegamos dez dias de trabalho de todas as empresas. Cheguei a ver profissionais trabalhando 18 horas em um dia, além de vários trabalhando 16 horas todos os dias. Na hora que um motorista dorme no volante, o policial não pergunta há quantas horas ele está trabalhando.”, afirma o procurador.
A carga horária permitida por lei é de oito horas diárias e 44 horas semanais, sendo que são permitidas até duas horas extras por dia. “O problema é que essa hora extra é institucionalizada, é normal fazer o ‘tabelão’. Não sabemos exatamente a porcentagem, mas sabemos que são muitos. O que era para ser um caso extraordinário, virou regra. Você tem um subdimensionamento do número de profissionais necessários para o sistema, o que prejudica o próprio serviço prestado à população”, alerta Mendonça. Outro caso frequente é quando se concede folga somente após o sétimo dia trabalhado, enquanto a lei prevê seis e descanso no sétimo. “Quando você divide isso pelo ano todo, percebe que ficam sete dias a menos de folga”, afirma Mendonça.
O excesso de carga horária foi constatado através de dados passados pelo Grande Recife, explicou a procuradora Vanessa Patriota. “Para tirar o ônibus da garagem, o cobrador e o motorista têm que passar o cartão, assim como para devolver. Isso tudo fica registrado no sistema. O Grande Recife tinha a responsabilidade de fiscalizar isso, mas não o fez, por isso ele está sendo réu também em cada um dos processos destinados às empresas”, detalha Patriota.
Em carárter liminar, o MPT está pedindo que seja respeitado o limite de horas trabalhadas pelos profissionais. “As condições de trabalho, como apoio reguláveis para os pés, motores no fundo do ônibus, cadeiras ergonômicas, pedimos em caráter definitivo”, explica a procuradora. Há ainda denúncias de descontos indevidos, como casos de abater do salário danos aos coletivos. “Imagine em dia de jogo, que tem depredação, você descontar do trabalhador porque outro danificou? São casos de algumas empresas, casos isolados, por isso que as ações são para cada um individualmente”, aponta.
Mudança cultural: O coordenador do Departamento de Segurança e Higiene do Trabalho da UPE, professor Béda Barkokébas, admite que, antes da pesquisa, não acreditava quando ouvia as denúncias sobre as condições de trabalho. “Quando a procuradora me falou, eu não acreditei, mas quando fui fazer a pesquisa, mudei até minha atitude. Ao levar uma ‘fechada’ de um motorista de ônibus, penso que aquela pessoa está trabalhando há mais de oito horas, muitas vezes faz a refeição partida, dividindo a marmita para comer um pouco em cada parada. Não me irrito mais”, conta.
O objetivo principal é a mudança da cultura de trabalho a qual os motoristas e trabalhadores estão submetidos no Grande Recife, ressalta a procuradora do MPT, Vanessa Patriota. “Nosso primeiro levantamento foi feito com cinco empresas em maio de 2012, em que identificamos as péssimas condições de trabalho. Propusemos então um Termo de Ajuste de Conduta (TAC), que foi negociado durante quatro meses, com reuniões a cada 15 dias. Para nossa surpresa, as empresas não assinaram. Por isso, tivemos que entrar com as ações civis públicas”, afirma a procuradora do Trabalho.
O trabalho junto às universidades visava também a elaboração de cartilhas educativas e capacitações para diferentes setores das empresas de transporte, a fim de orientar sobre como deveriam ser as condições de trabalho. “Sabemos que muitas vezes a questão é relacionada a desinformação. Nossa proposta era dar um retorno à sociedade, nossa intenção sempre foi educar. Esse trabalhador por vezes quer fazer esses horários a mais porque pensa que está se matando para o filho estar na universidade. O problema é que ele está vendendo a saúde dele. Lá na frente, é ele quem paga ficando doente”, aponta a professora Laura Martins, do Laboratório de Ergonomia e Design Universal da UFPE.
A professora aponta ainda problemas quanto a posição para o trabalho, em especial dos cobradores, que muitas vezes não tem apoio para os pés ou os apoios não são reguláveis. “Você tem também as gavetas, onde guardam dinheiro, ocupando espaço deles. Fora isso, o primeiro troco do dia é do bolso do próprio cobrador, nem o dinheiro do troco as empresas dão. Ao longo do dia é que o profissional vai recebendo de volta”, conta Martins.
Procurado pelo G1, o sindicato das empresas de transporte, Urbana-PE, informou que as empresas ainda não foram notificadas. Através de nota, explicou que as companhias têm levado em conta sugestões e críticas construtivas, com o objetivo de ajustar procedimentos e adequar as frotas, dentro dos seus limites. O sindicato ainda afirmou não ter havido uso de critérios técnicos e embasamento científico na pesquisa encomendada pelo MPT.
Fonte: G1

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