A dura rotina na travessia das pontes

A rotina de quem precisa atravessar o rio Potengi todas as manhãs começa com trânsito. Se não há como evitar o horário de pico – das 6h30 às 9h – o jeito é encarar a situação com fartas doses de  paciência e outras tantas de prudência. No final da tarde, o movimento inverso também requer atenção especial dos motoristas. Os gargalos do tráfego na entrada das duas pontes, Igapó e Forte-Redinha, principalmente nos dias úteis e sobretudo às segundas e sextas-feiras, revelam as consequências da falta crônica – e histórica – de um planejamento urbano capaz de absorver o aumento exponencial da frota de veículos, demanda potencializada pelo serviço insatisfatório do transporte público.
A TRIBUNA DO NORTE acompanhou o comportamento matutino do trânsito nos dois acessos. Na entrada da Ponte Newton Navarro, sentido Redinha-Praia do Forte, a reportagem constatou a presença de um elemento fundamental para evitar um colapso generalizado no tráfego das avenidas João Medeiros Filho e Moema Tinoco: o agente de trânsito – que nesse caso específico é da Polícia Rodoviária Estadual, pois a via está sob jurisdição do Governo do RN.

A presença do agente de trânsito foi a forma encontrada para minimizar os transtornos causados pela ausência dos acessos planejados, e ainda não executados, do projeto original da ponte.

“Geralmente trabalhamos em dupla, mas como meu colega teve que atender uma ocorrência de última hora fiquei sozinho”, disse o soldado Leomar Roberto, da CPRE. O procedimento, que deveria ser temporário, permanece em constante prática desde a inauguração da ponte sobre a foz do rio Potengi em 2007. “Estamos por aqui todo dia útil, a partir das 6h30, até o trânsito se normalizar”, informou Roberto. Ele orienta os motoristas avançarem o sinal vermelho, após a passagem dos veículos que estão vindo da Redinha e precisam atravessar a Newton Navarro. “A situação complica quando tem algum acidente em cima da ponte”. O agente explicou que, para realizar o mesmo procedimento na ponte de Igapó, é necessário apoio de equipe da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob) na altura do semáforo da empresa Compal, no Bairro Nordeste.

Tempo: Quase a totalidade dos veículos que cruzam a Ponte Newton Navarro, a partir da Redinha, são oriundos da confluência entre as avenidas João Medeiros Filho e Moema Tinoco, duas das principais vias que cortam os bairros da zona Norte de Natal. O semáforo que controla o tráfego proveniente da Moema Tinoco permanece aberto por, cronometrados, 20 segundos – tempo que permite a passagem de apenas 15 carros por vez, em média, para a João Medeiros Filho.

Os 20 segundos de sinal verde se alterna com o tempo de um minuto e dez segundos de sinal vermelho. “Tem gente que se arrisca, andando na contramão, para entrar na João Medeiros Filho”, informou o mecânico Marcos Antônio, 40, enquanto aguardava a vez de seguir. “O trânsito é complicado, tanto na ida como na volta, um problema que poderia ser resolvido se os acessos da ponte tivessem sido construídos”, observou Marcos.

Ao ver a reportagem da TN, a dona de casa Rose Fernandes, 38, reclamou de dentro do carro: “Tem dia que chego a passar uma hora para andar esses dois quilômetros daqui onde estamos até a ponte, é um absurdo! Quando não tem guarda ali na rótula vira bagunça”.

Trânsito fica complicado também no início da noite: Enquanto um agente organiza a situação do trânsito na Ponte Newton Navarro, em Igapó o quadro é bem diferente: lá, quem está de plantão todas as manhãs é o mecânico Carlão, 44 anos – “Meu sobrenome? Pode botar aí: Carlão Mecânico da Ponte”, sentencia. De acordo com o mecânico, que trabalha há 13 anos na área, “todos os dias o trânsito aqui é ruim, das 6h30 às 9h e das 18h às 22h o movimento é grande!”, garantiu.

Questionado se torce para algum carro quebrar, ele disfarça: “Eu não desejo isso, mas eles quebram mesmo. Dá muito problema de superaquecimento e de freios, e quando quebra para tudo. A sorte deles é que estou trabalhando por aqui. Qualquer coisa é só ligar 8754-2681, que vou na hora!”, disse, já fazendo propaganda do serviço.

Passarelas: O pouco de acostamento que existe se transforma em um terceira faixa, e até a calçada ‘vira rua’ para os motociclistas mais apressados. Todo o controle do tráfego é feito por dois semáforos: um em frente ao Hospital Hapvida Zona Norte; e outro na margem oposta, na altura da empresa Compal, no Bairro Nordeste. Como os equipamentos servem apenas para permitir a passagem de pedestres, a construção de duas passarelas seria providencial para conferir maior fluidez ao trânsito. Os engarrafamentos também são potencializados pela quantidade de buracos na via e a falta de recuo em pontos de ônibus.

No primeiro sinal, ainda do lado de Igapó, que passa um minuto e meio aberto e trinta segundos fechado, há radares para evitar passagem de motoristas no vermelho; já o segundo, no Bairro Nordeste, o tempo varia conforme o movimento de pedestres, que podem acionar botoeira (existente apenas no sentido zona Oeste-zona Norte). Os pedestres têm 20 segundos para atravessar quatro faixas, duas em cada sentido. “Durante a tarde a travessia é mais complicada, pois muitos alunos estão saindo da escola e precisam cruzar a avenida. O problema é que só existe botoeira de um lado, e às vezes demora muito para fechar a passagem dos carros, desse jeito muitos se arriscam”, disse o motorista desempregado Braynner Conde da Silva, 28, que faz o percurso diariamente.

Outra questão verificada na ponte de Igapó, e que pode dificultar o trânsito caso haja algum acidente, é a quantidade de pessoas que utilizam a bicicleta como meio de transporte. Como não há ciclovias nem ciclofaixas, o jeito é disputar espaço com os carros: “Rapaz aqui não tem boquinha não, tem que meter as caras para conseguir andar”, disse o vendedor Emanoel Azevedo, 31, que mora no bairro do Bom Pastor e vende cuscuz e tapioca na zona Norte. “Já vi muito acidente com gente de bicicleta, mas é o jeito”, lamenta.

Prefeitura não tem agentes suficientes: O diretor do Departamento de Engenharia de Tráfego, da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, Valter Pedro, informou que, “por enquanto”, não há como manter uma equipe para ordenar o trânsito diariamente no Bairro Nordeste – sobretudo no semáforo em frente a empresa Compal. “A princípio não temos pessoal suficiente para cobrir todas as demandas operacionais da Semob. Estamos com uma defasagem grande de agentes de trânsito”, avaliou Pedro. Ele ressalta que “não houve um afastamento total” das operações no local.

De acordo com o diretor, o Denatran “recomenda que, para cada mil veículos, no máximo dois mil, se tenha um agente”, ou cerca de 330 agentes atuando no trânsito de Natal. Na página eletrônica do Detran-RN, o órgão registra 339.869 veículos licenciados na capital do RN até ontem.

Atualmente a Semob contabiliza apenas 20 agentes trabalhando por turno. “Nosso efetivo é de 87 agentes, mas, contando com folgas, licenças, férias e remanejamentos, temos 60 homens nas ruas para dar conta do trabalho”, informou Kennedy Diniz de Araújo, diretor de Fiscalização de Trânsito da Semob. “Para uma fiscalização ideal deveríamos ter 70 agentes de trânsito em cada um dos três turnos”, calcula Araújo.

Um concurso público chegou a ser realizado pelo município no início deste ano, mas supostas irregularidades acabaram anulando o resultado; e o problema tramita na Justiça. “Enquanto não resolvermos essa pendência, não temos como abrir um novo edital”, disse o diretor de Engenharia de Tráfego da Secretaria Valter Pedro, para quem, na mais “desfavorável das hipóteses”, há necessidade urgente para preencher 150 novas vagas.

Alterações no traçado: O trânsito no complexo viário da Urbana será totalmente alterado com o início das obras de um novo viaduto naquela área, entre as Quintas e o Bairro Nordeste, fato que deverá complicar ainda mais o desafio de atravessar a ponte de Igapó. A Prefeitura admitiu alterações no traçado original para evitar a necessidade de desapropriações, tudo para superar as dificuldades impostas pela ação judicial impetrada por moradores que se sentiram prejudicados com o projeto. A previsão para o começo das intervenções está agendada para este próximo mês de setembro.

Fonte: Tribuna do Norte

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