A ideia de criar o ônibus surgiu nos debates da Transparência Hacker, fórum online que questiona a omissão de dados públicos na internet. Em julho de 2011, o projeto foi colocado no Catarse – site de financiamento colaborativo – e não demorou muito para que 464 apoiadores doassem um total de R$ 58.593, superando a meta inicial de R$ 40 mil.
Até agora, foram realizadas 13 “invasões”, como foram batizadas as intervenções do ônibus. O nome não foi escolhido à toa. Ao chegar à cidade-alvo, o grupo convida participantes usando uma estratégia bem mais prosaica: por meio de um megafone. Depois de reunir algumas pessoas, perguntam qual é o maior problema da região e propõem soluções através de oficinas de rádio, blog, mapeamento cartográfico e análise de dados, entre outros.
O ônibus costuma se tornar um chamariz para as crianças. Mas não se engane pensando que o projeto é brincadeira. Numa invasão à cidade de Ribeirão Preto (SP) em abril deste ano, foi o público infantil que apontou alguns policiais como um dos principais problemas de uma comunidade, acusando oficiais de abuso de autoridade. Elas afirmaram, ainda, que o problema só cessava com a chegada da imprensa. Foi aí que a equipe hacker questionou: e se vocês fizessem o papel dos jornalistas? Começava uma oficina sobre como elaborar um blog.
Mas o ônibus não foi concebido a partir desse modelo. “Na verdade, tivemos a ideia inicial de fazer um mutirão de oficinas sobre projetos de lei criados popularmente”, conta Pedro Belasco, cientista social e hacker do grupo. Ele se refere aos projetos de lei de iniciativa popular, que permitem que cidadãos brasileiros proponham suas ideias para a Constituição Federal. Não é tão simples quanto parece. De acordo com a regulamentação nacional, para que um projeto de lei vigore é preciso uma adesão mínima de 1% da população eleitoral do país por meio de assinaturas vindas de pelo menos 0,3% dos eleitores de cinco estados distintos. “Poucas pessoas sabem que isso é possível. Apesar da burocracia que o processo envolve, queremos explicar seu funcionamento”, diz Pedro, levantando as sobrancelhas.
Uma das invasões em que os hackers chegaram mais perto desse objetivo foi a de Parati (RJ), em maio deste ano. Nela, o público decidiu elaborar um projeto de lei pela universalização da banda larga. Aliás, para os ativistas do Ônibus Hacker, a conclusão pertence sempre ao público. Quem está em busca de respostas diretas deve sair da rota do busão. Lá, eles seguem a lógica do ensino através do questionamento. “Não tenho dúvidas de que o ônibus é um ambiente de educação informal”, afirma Lívia, entre uma baforada e outra do cigarro. “Ele é um gerador de incertezas. O que muda para quem participa das oficinas é a apropriação crítica da tecnologia”, completa.
Apesar das certezas sobre a lógica educativa do ônibus, ele ainda é incerto em alguns aspectos, como tempo de estadia no local escolhido. Um dia é pouco, três é demais. “Se ficamos muito tempo, as pessoas acabam se acostumando com nossa presença”, afirma Lívia. A forma de administração financeira do projeto é outro ponto nebuloso. A hacker esbarra na definição de um funcionamento através da “bagunça total hippie e absoluta”. Mas não é só de paz e amor que vive o busão. Só o estacionamento custa R$ 300 mensais. Na primeira troca de peças, eles dizem que foram gastos R$ 10 mil. Pedro Belasco conta que, depois de ficar no vermelho, o grupo pensou em alternativas para se manter. “Queremos usar parte do tempo livre para vender serviços com o ônibus”, diz.
Com ou sem verbas, eles já se preparam para a próxima invasão. Nos dias 20 e 21 de setembro, o Ônibus Hacker estará no Centro Cultural São Paulo realizando uma feira de compartilhamento de torrents (servidores que permitem que arquivos de mídias sejam compartilhados com mais agilidade), oficinas e mapeamento cartográfico da região. Até o fim do ano, o busão cogita expandir fronteiras. Lívia e Pedro contam que há planos de workshops no Paraguai. Serão mais alguns quilômetros para os 18 mil rodados desde a compra do ônibus.
Fonte e foto: Autoesporte