Passe Livre em Natal: direito ou privilégio?

Todo mundo é a favor do passe livre, sobretudo se a pessoa se diz de esquerda. Ora, quem pode ser contrário?! Eu também queria que a medida fosse implementada. Mas é fundamental dizer de onde o dinheiro vem, até para não criar um favorecimento, ao invés de um benefício.
O PT municipal lançou uma nota bem genérica sobre o assunto. Elencou IPTU, ITIV e ISS – dentre outras verbas secundárias (publicidade de parada de ônibus, etc) – como impostos capazes de subsidiar a passagem aberta. Na verdade, apenas citou contribuições da prefeitura, que já servem para financiar outros serviços. Não se preocupou em investigar o Plano PluriAnual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei do Orçamento Anual, para compreender a destinação das receitas do poder público e saber se, de fato, há a possibilidade de custear a ausência de catracas nos ônibus.
A atitude é temerária, pois que, na verdade, não sobra dinheiro. Falta. Tais impostos servem para pagar o atendimento no posto de saúde, a educação, etc. Tirar esse dinheiro de outras pastas para custear o transporte urbano implica, indiretamente, pegar recursos de serviços universais para pagar uma tarifa, que deve ser bancada pelos empresários contratadores de mão de obra.
Acho improvável que a medida seja levada adiante. Mas, nesses termos, a ação não tem nada de progressista, ou melhor, inclusiva. Só “barateia” o custo global de mão de obra para os empresários, que não mais pagarão pela locomoção de seus funcionários.
Agora, seria preciso fazer estudos mais elaborados sobre a implementação do IPTU progressivo. Criar condições para pagar mais quem tem mais. Quem tem imóvel inutilizado, arca com mais. Desembolsaria mais também quem especula sobre terrenos, algo ainda comum. Há mecanismos no estatuto das cidades. Seria bom qualificar o debate, consultá-los e procurar os meios para sua devida implementação.
E que tal sobretaxar também quem tem carro e melhorar, com a arrecadação, o transporte público, como recomendou o IPEA?! Quem incrementa o custo global das cidades, que agüente.
Ainda assim, os recursos oriundos de tais ações deveriam ser empregados para reformar os postos de saúde, reabrir a unidade do Jiqui, etc; e, quem sabe, melhorar a mobilidade urbana. Mas não bancar um custo, que deve sair do bolso dos produtores, ou de quem apresenta condições financeiras para tanto. Pensar na sua direta destinação para a tarifa zero, sem atentar para, como dizia no passado, a “totalidade concreta”; implica não perceber outras desigualdades tão ou mais urgentes do que a da mobilidade. Que as urgências sejam devidamente equacionadas.
Enfim, é preciso cuidado para não reivindicar um privilégio. Hoje, por exemplo, um estudante de classe média paga meia passagem, enquanto que um pobre tarifa cheia. Hoje, a periferia entra com mais do que quem mora no centro. Isso pode ser considerado um direito, um ataque a desigualdade ou a consagração do status quo?!

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