As manhãs da diarista Maria das Dores Caetano, 42 anos, começam às 4h. Ela pega um carro da comunidade Lagoa Grande, zona rural de Ceará-Mirim, até a estação de trem. Às 5h20, a locomotiva (lotada) deixa a estação rumo “à cidade” – Natal – por apenas R$0,50. “Economizo R$7 de passagem com carro e ônibus”, contabiliza. Os 29 quilômetros que separam os municípios também são percorridos por Maria Betânia Rosene de Lima, doméstica, de Ceará-Mirim para o bairro de Cidade da Esperança. Ela é mais incisiva. “Se for para sair de Ceará-Mirim para pegar o trânsito de Igapó, é melhor ficar aqui mesmo”, sentencia.
Atravessar cidades para chegar a qualquer compromisso é a rotina dos 1,3 milhão de habitantes que vivem hoje na Região Metropolitana de Natal. São 727.377 passageiros que utilizam regularmente o transporte coletivo. E também uma frota – entre carros e coletivos – de 423.459 veículos, segundo a Secretaria de Mobilidade de Natal.
Mobilidade, porém, é apenas um dos problemas de quem vive na Região Metropolitana de Natal. Falta de serviços básicos, como transporte, saúde e educação, além da violência crescente, são questões que despontam devido à ocupação desordenada do território.
Criada por lei estadual em 1997, hoje é composta por dez municípios – Natal, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Extremoz, Ceará-Mirim, Macaíba, Monte Alegre, Nízia Floresta, São José do Mipibu e Vera Cruz. Mas a gerência dos municípios, que deveria ser compartilhada, nunca saiu do papel. O Comitê Gestor da RMN, criado na mesma lei, deveria reunir periodicamente prefeitos dos municípios, sociedade organizada e parlamentares sob a coordenação do Governo do Estado. Durante o atual governo, o comitê nunca se reuniu. A última ata data de julho de 2008, quando foi apresentado o Plano de Desenvolvimento Sustentável da Região Metropolitana de Natal – este também não aplicado. O plano, elaborado por professores da UFRN e da UFPE, trazia projetos viários e de gestão para integrar os municípios da RMN. E previa uma série de estudos para a inclusão de novos municípios na RMN – o que também não tem sido respeitado.
Segundo a economista Tânia Bacelar, convidada para elaborar o plano em 2007, Natal era um “germe” de metrópole. “Ainda não existia uma região metropolitana em Natal. Existia uma lei que havia sido criada, mas a definição legal não correspondia”, afirmou. Para ela, existem duas regiões metropolitanas de Natal: a funcional e a política. “Esse é um momento interessante para organizar o desenvolvimento da metrópole”, acrescenta.
A professora Maria do Livramento Miranda Clementino, coordenadora do Observatório das Metrópoles no RN, acredita que esse “germe” se consolidou somente entre Parnamirim, São Gonçalo, Extremoz e Natal. As duas primeiras perderam a característica de cidade-dormitório para consolidarem a própria economia. “Elas já desenvolveram algum tipo de relação e estrutura que não as configuram apenas como dormitório”, aponta. Entretanto, para as duas especialistas, é preciso apressar a organização desse crescimento antes do surgimento de novos gargalos.
A reportagem entrou em contato com a coordenadora estadual da RMN, Ana Karina Maia, solicitando informações sobre a implantação do plano de desenvolvimento da metrópole. As informações, porém, foram barradas pelo secretário de planejamento do Estado, Obery Rodrigues, segundo o qual o Governo preferiria não se pronunciar sobre o assunto.
Principais problemas: A gestão compartilhada de recursos e serviços entre os municípios da Região Metropolitana de Natal é uma das prerrogativas do Plano de Desenvolvimento Sustentável da RMN. Entretanto, seis anos após a entrega, quase nenhuma mudança foi sentida pela população. As limitações de cada município alimentam a dependência dos serviços com relação à capital.
A mobilidade ainda é o maior empecilho para o desenvolvimento da Região Metropolitana de Natal. A dependência de apenas dois corredores de escoamento do tráfego – BRs 101/304 e 101/406 –, que desembocam nas duas únicas pontes da cidade. O resultado são os congestionamentos usuais nos horários de pico, tanto no gancho do Igapó quanto na saída da Ponte Newton Navarro.
Para quem se desloca diariamente entre os municípios da RMN, uma das saídas é o sistema ferroviária que, atualmente, conta com apenas duas locomotivas.
A diarista Valdira Lopes, 37 anos, pega três conduções para chegar ao trabalho. A rotina começa às cinco da manhã, quando pega um ônibus da comunidade Vila de Fátima, Extremoz, para a estação de trem da cidade. De lá, mais 1h20 de viagem até a Ribeira, ao custo de 0,50 centavos. Logo depois, é a vez de embarcar em um ônibus para Ponta Negra.
Para Valdira, o trem é a melhor opção para escapar do trânsito. “Melhor o trem que não tem assalto, ninguém anda assustada e não tem engarrafamento”, opina.
Foto: Emanuel Amaral (Tribuna do Norte)
Com informações: Tribuna do Norte