Em apenas 20 minutos, as expectativas da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana se transformaram em frustração: a segunda tentativa da Prefeitura/STTU, em licitar o sistema de transporte coletivo de Natal, também foi considerada deserta pela Comissão Especial de Licitação. A sessão aconteceu novamente no Parque da Cidade, e da mesma maneira como ocorreu durante a primeira tentativa, realizada dia 31 de janeiro, nenhuma empresa entregou propostas para assumir a operação das linhas de ônibus que circulam na capital do Rio Grande do Norte.
A sessão foi acompanhada por empresários do setor de transportes e representantes de empresas. Eram aguardados três envelopes de cada interessado: um contendo proposta de preço, outro trazendo documentos para habilitação legal, e o terceiro com informações sobre capacidade técnica.
Apesar do resultado, o reajuste da tarifa é admitido pela gestão municipal. Ainda não há valor definido, nem data prevista para uma nova tarifa entrar em vigor. “A questão permanece no âmbito da STTU. O Conselho de Transportes vai avaliar a situação, e assim que for emitido um parecer sobre o tema o Gabinete Civil vai analisar os índices de reajuste e definir uma data para a nova tarifa entrar em vigor”, informou a assessoria de imprensa da Prefeitura de Natal, após o certame. Na terça (4), dois dias antes do certame licitatório, o Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros de Natal – Seturn protocolou pedido para que a passagem urbana passasse de R$ 2,90 para R$ 3,50, um reajuste equivalente a 20,68%.
O presidente da Comissão Especial de Licitação, Luciano Nascimento, também antecipou que “provavelmente” o edital passará por ajustes. “Vai depender do estudo que será apresentado pela STTU”. Ele não adiantou quais seriam esses ajustes.
Walter Pedro, adjunto da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, reforçou que os ajustes serão propostos “após alguns direcionamentos que possam facilitar a participação de empresários na licitação. Como o edital foi elaborado com base em uma lei, qualquer modificação precisará passar pela Câmara Municipal”, frisou.
Terceira tentativa
Antes de dar a sessão por encerrada, o presidente da Comissão Especial de Licitação, Luciano Nascimento, chegou a ligar para a recepção das secretarias de Mobilidade Urbana e de Administração (Semad) para checar se havia chegado alguma proposta pelo correio. “Ainda não será marcada nova data para uma terceira tentativa. Primeiro temos que analisar a situação junto com a comissão técnica da STTU e a Procuradoria Geral do Município para, então, chegarmos a uma decisão”, destacou.
Nascimento assegurou que não há limite de sessões por se tratar de uma concessão: “A lei (complementar) 149/2015, que embasou a elaboração do edital, determina que, no caso de contratação por concessão, deve ser através de licitação”.
O edital está licitando dois lotes para a modalidade Regular 1 (ônibus), cada lote possui 37 linhas, e estão previstos investimentos da ordem de R$ 350 milhões ao longo de 10 anos – tempo de vigência do contrato.
‘O modelo gera insegurança’
Bate-Papo com Rubens Ramos, engenheiro de Transportes.
Como o senhor avalia o resultado dessa segunda tentativa para licitar o sistema de transporte?
Esse resultado não é necessariamente negativo, pode zerar o jogo. A prefeitura está propondo algo que é equivocado do ponto de vista empresarial – separar a despesa da receita. O empresário de transporte investe, tem a despesa, enquanto a arrecadação é feita por um terceiro. Nenhum empresário vai aceitar essa dinâmica, e o modelo gera insegurança ao deixar o caixa com outra empresa, que em algum momento vai repassar.
Que outro ponto o senhor destaca para aprimorar o edital?
Embora seja positivo a licitação dividir a cidade em duas áreas, a rede permanece ineficiente e com custo excessivo. Hoje vemos muitos ônibus andando vazios, algo inviável financeiramente.
O padrão de ônibus exigido no edital, com piso baixo, teria dificuldade para trafegar em Natal?
Esse pensamento está errado. Os ônibus de piso baixo não precisam de um tapete de asfalto para andar: passa pelos mesmos lugares onde um carro de passeio passa. Não existe isso, só se a via for para 4×4. É um ônibus normal sem degraus para embarcar, com a comodidade de uma suspensão à ar, que pode tornar os veículos altos ou mais baixos que os comuns.
‘É preciso combater as fraudes e o excesso de gratuidade’
Bate-Papo com Nilson Queiroga, consultor técnico do Seturn.
Reduzir as exigências não reduz a qualidade do serviço de transporte a ser licitado?
O sistema de transporte urbano de Natal anda, como se fosse, de fusquinha velho e sonha em ter uma Ferrari: a cidade não tem condição financeira para bancar, e a malha viária não comporta. Não há garantia de que vão tirar os quebra-molas e resolver o problemas das lagoas (poças de águas nas vias), esse ônibus de piso baixo não é canoa. A Prefeitura terá que gastar mais do que está sendo exigido no edital para melhorar a infraestrutura urbana.
Como melhorar o sistema?
Há anos que o Seturn vem alertando a STTU e todos os usuários que dependem de transporte: Natal vem adotando uma política que torna cada vez mais inviável operar o sistema. Empresas tradicionais estão perdendo a condição operacional, com extremas dificuldades. É preciso combater as fraudes (como os falsos estudantes), o excesso de gratuidade, introduzir subsídios para diminuir o impacto dos impostos nos custos e desonerar o valor da tarifa. A rede está obsoleta e precisa ser repensada. Os empresários, que têm experiência para servir a cidade e melhorar a qualidade do serviço, não participaram da elaboração dessa legislação estabelecida unilateralmente. Falta diálogo.
Fonte: Tribuna do Norte