Enquanto a indústria da multa foi uma das principais vedetes da última campanha municipal, o debate da vez é sobre uma momentosa questão tecnológica: é juridicamente correto multar veículos que excedam a velocidade da via, desde que a medição seja feita não num ponto específico, mas por um algoritmo matemático que permita calcular seu deslocamento num trecho maior?
A discussão surgiu após a Prefeitura de SP anunciar nos primeiros dias de novembro a instalação de um novo sistema que irá identificar se o motorista respeita o limite de velocidade definido nas principais vias da cidade. Mas ao invés dos famigerados radares, que detectam a velocidade num determinado local, será por um sistema que calcula a velocidade média em determinados trechos da via.
A celeuma toda começou graças ao Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Por ele a fiscalização da velocidade deve ser local, ou seja, medida apenas em um ponto de aferição. Quem lê o CTB, entende como sendo um único radar. O sistema que a Prefeitura de SP instalou é constituído por dois radares, que mede não em um único ponto, mas faz a média entre dois pontos.
Instalada a polêmica, duas medidas foram tomadas: enquanto nada se resolve do ponto de vista legal, a Prefeitura não multa ninguém, apenas orienta o motorista infrator, através de carta enviada ao endereço do motorista; por sua vez o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) encaminhou um parecer jurídico à consultoria da AGU (Advocacia-Geral da União) no Ministério das Cidades. Pego de surpresa, apesar da tecnologia já ser velha conhecida de técnicos e especialistas, e de já vigorar em outros países, o órgão federal, responsável por regular a legislação viária no país, quer descobrir se pode resolver o imbróglio através de uma simples resolução do Contran (Conselho Nacional de Trânsito).
Se a resposta da AGU for negativa, a tecnologia, por mais moderna que seja, terá de se curvar à vontade dos deputados federais, pois a alteração dependerá de um projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional.
Tanto Portugal, cujo código de trânsito prevê fiscalização em “percursos controlados”, quanto o Reino Unido, em que rodovias inteiras são monitoradas de forma eletrônica, já resolveram há tempos essa discussão. Antes de ser um problema “jurídico”, a tecnologia foi posta em benefício da redução de mortes e feridos no trânsito. A lei adapta-se à defesa da vida, e não o contrário.
Terminado mais um longo feriado, teremos logo mais, como sempre, o balanço de mortos e feridos nas rodovias estaduais e federais de todo o país, que as Polícias Rodoviárias costumeiramente fazem. Se esta tecnologia já estivesse em operação ao menos nas estradas do país, com certeza os números da tragédia do trânsito seriam bem menores.
Diário do Transporte