Presidente do Denatran/Contran suspende Resolução que iria multar pedestres e ciclistas a partir de abril

Maurício José Alves Pereira, presidente do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) e Contran (Conselho Nacional de Trânsito), assinou há pouco a deliberação 168/2018, que suspende os efeitos da Resolução 706/2017 que regulamenta os procedimentos para autuação e multa de pedestres e ciclistas por infrações cometidas no trânsito, segundo o Código de Trânsito Brasileiro.

O objetivo dessa suspensão, segundo informa Thiago França, presidente do Detran-MT, presente ao 60º Encontro Nacional dos Detrans (END) em João Pessoa, “é  permitir aos DETRANs e órgãos municipais de trânsito que possam participar de uma melhor e ampla discussão quanto aos procedimentos, regulamento e viabilidade da Resolução na prática”.
O presidente do Denatran assinou a Resolução em plenária do 60º Encontro Nacional, adiando a medida para março de 2019.
Logo após o lançamento da Resolução, as normas foram contestadas por entidades de ativistas e especialistas de trânsito e mobilidade.
Meli Malatesta, arquiteta, com doutorado em Transporte Cicloviário pela FAUUSP e presidente da Comissão Técnica Mobilidade a Pé e Mobilidade da ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos, afirmou na época que “discretamente, sem qualquer debate público que pudesse gerar polêmicas, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovou a Resolução 706/2017. Aprovada às pressas, na surdina, a Resolução afeta a vida de todas as pessoas, porque todos somos pedestres”.
Meli pontuou alguns dados, “apenas para lembrar”:
– No Brasil, 66% das viagens diárias são feitas exclusivamente ou complementarmente a pé. No entanto, os espaços públicos destinados à mobilidade urbana não acompanham esta proporção e priorizam os veículos e a velocidade;

– Pedestres são obrigados a ceder sempre a prioridade ao veículo motorizado. As exceções são raras e confirmam a regra;

– Os direitos dos pedestres, previstos pelo Código de Trânsito Brasileiro e pela Política Nacional de Mobilidade, não são colocados em prática pelo poder público;

– Motoristas raramente são autuados por infrações contra pedestres. Assim, o desrespeito é sistemático;

– O preparo dos motoristas pelos CFCs não é suficiente para garantir a prática dos direitos dos pedestres – mesmo onde há sinalização – sem que haja fiscalização.
Com este ambiente absolutamente hostil, as autoridades ainda querem castigar o pedestre?”, finaliza.
Já Luiz Carlos Néspoli, Branco, superintendente da ANTP, “ao publicar tal resolução, cujo ineditismo no Brasil repercutiu em toda a mídia, lamentavelmente, o CONTRAN contribuiu negativamente ao debate, dando margem a interpretações inadequadas do verdadeiro problema ao deslocar o pedestre da posição real de vítima para a de culpado. Antes de ser vítima do acidente de trânsito, o pedestre é vítima das condições físicas e ambientais a que está sujeito nas ruas das cidades”.
Por fim, Néspoli afirma: “Se o intuito da resolução do CONTRAN foi o de reduzir atropelamentos, a medida, além de propiciar ao motorista uma narrativa para os seus comportamentos inadequados, está longe de alcançar tal objetivo sem que antes se dê o tratamento adequado ao andar a pé nas cidades brasileiras e sem que antes se coloque em prática alguns dos princípios trazidos pela Lei de Mobilidade Urbana, como o da equidade no uso do espaço viário público e a prioridade aos pedestres. Medidas que tornem os espaços físicos mais adequados, aliados a políticas de redução de limites de velocidade em vias urbanas e a criação de Zonas 40 e Zonas 30, são as que de fato poderão surtir os efeitos desejáveis. Com ambientes mais organizados e as ruas menos hostis será muito mais fácil comunicar regras e obrigações e, com isso, estabelecer campanhas educativas aderentes à realidade, de resto mais eficazes do que o constrangimento legal pretendido”.
O adiamento da Resolução, prevista para entrar em vigor em abril, foi saudada por ativistas, especialistas e membros de Detran de todo o país.
Diário do Transporte

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