Placa Mercosul: autoridades discordam sobre QR Code e mudança a cada cidade

Desde o começo do mês de setembro, o estado do Rio de Janeiro emplaca seus carros seguindo novo padrão, que segue metodologia comum os países vizinhos (Argentina e Uruguai, por enquanto). Nos próximos dias, Acre, Alagoas, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Pernambuco, Sergipe e Rondônia passarão a usar este tipo de identificação também. O restante do país, incluindo São Paulo, estado com a maior frota, tem até dezembro para aderir ao formato.
Divulgação

As dúvidas, porém, seguem existindo. E a discussão sobre a pertinência do padrão — e de mudanças feitas apenas aqui no Brasil — se amplia. 
Há quase duas semanas, UOL Carros trouxe um tira-dúvidas sobre as chamadas “placas Mercosul”, mas apesar das questões respondidas por Denatran (órgão federal responsável pela regulamentação de trânsito) e Detran-RJ, alguns pontos seguiram obscuros para nossos leitores, que até classificaram certas normas como “desnecessárias”.
Veja alguns dos comentários daquela primeira reportagem, que separamos por representarem o pensamento de boa parte dos leitores:
“Como sempre o cidadão pagando o pato (a placa). Governo arranjando um jeito de arrecadar mais. Na transferência, pagava-se um valor; agora paga-se o dobro. Vai dobrar a arrecadação”. — Jovaine M de Castro
“Eu seria a favor se parassem com essa bobagem de lacrar placa nos departamento de transito brasileiros. Outra coisa que seria um enorme progresso é se a placa fosse vinculada ao dono do veículo e não vinculada ao veículo, assim, quando vendermos o veículo, basta o vendedor retirar as placas e o atual comprador colocar as placas dele”. — Thiago Eu
“Gente…[…] Quando trocar de município precisa trocar a placa pra trocar o QR Code… esse não precisa ser alterado, bastaria fazer um QR Code para o veículo, você lendo o código, abrem as novas informações. Vontade e nos fazer pagar mais, como sempre… e tem povo que acredita”. — HSianodel
Com essas e outras questões em mãos, procuramos novamente Denatran, Detran-RJ e até mesmo o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), órgão ligado à Receita Federal e responsável por desenvolvimento de tecnologias para a administração pública no Brasil — as ferramentas para a declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física, entre outras tantas, por exemplo, são desenvolvidas pelo Serpro.
Seja por e-mail, seja por telefone e, até mesmo, por mensagens de texto recebidas por nossa Redação, os órgãos nos esclareceram mais alguns pontos… mas também discordaram sobre um tema crucial. O dono de carro precisaria mesmo pedir nova placa (e pagar por ela) a cada mudança de domicílio? Isso não é totalmente contrário à noção de uma placa multiterritorial, justamente o caso da “placa Mercosul”? Vamos às novas respostas.
QR Code precisa mudar?
Logo após a publicação da primeira reportagem com dúvidas sobre o assunto, UOL Carros recebeu mensagens de texto de funcionários ligados ao Serpro, observando que a resposta do Denatran sobre o pagamento e confecção de nova placa a cada troca de município, usando a existência do QR Code como justificativa, não seria procedente. A base de dados da nova placa é do próprio Denatran, mas desenvolvida e hospedada pelo Serpro.
Esta foi a comunicação recebida por UOL Carros, que mantém o sigilo sobre remetentes: “O Denatran atribui a necessidade do cidadão ter que trocar a placa toda e pagar novamente ao QR Code, o que não é verdade. A verdade é que a justificativa tecnológica do Denatran não procede”.
Infelizmente, nenhum porta-voz do Serpro quis se pronunciar de forma oficial à nossa reportagem sobre o assunto.
Há duas semanas, o diretor-presidente do Observatório Nacional de Segurança Viária, José Aurélio Ramalho, já havia dado opinião semelhante: “É o departamento de trânsito mesmo quem diz que quanto menos eu tiver substituição de placa de um município para outro, menos riscos de fraude eu tenho”.
O Denatran, de toda forma, insiste em seu posicionamento, conforme resposta dada por e-mail: “O QR Code identifica a placa e a cada nova mudança de placa estabelecida pela legislação vigente, uma nova seriação de QR Code é adotada para rastreamento”.
UOL Carros tentou usar um leitor comum de QR Code (desses que podem ser instalados em qualquer smartphone) na nova placa, mas não obteve nenhum resultado válido. Acreditamos que leitores específicos deverão ser usados por autoridades de trânsito.
A grande questão aí é que, com o padrão definido pelo Brasil, cada troca de placa, seja por alteração de domicílio ou mesmo de uso do veículo, implica novas despesas.
Se olharmos para os “hermanos”, veremos que por lá não funciona assim: na Argentina, não é prevista a troca de placa em caso de mudança de cidade ou província, mas o dono precisa pagar algumas tarifas que podem somar outros R$ 40 ao alterar seu endereço.
Além disso, os dados do novo município ficam no sistema de informação, não são colocados fisicamente na placa.
Para onde vão as placas “velhas”?
Alguns leitores questionaram se as placas anteriores sem validade — sejam do padrão antigo, sejam do novo padrão do Mercosul, em eventuais futuras trocas de documentação.
Elas não poderiam cair nas mãos de quadrilhas, sendo usadas por golpistas ou criminosos para legitimar veículos “clones” (com placas semelhantes àquelas de carros regularizados)? 
Segundo o Detran-RJ, todas as chapas descartadas são destruídas pelo próprio órgão “na hora”.
E por que pagar tão caro?
Segundo os órgãos consultados, cada Detran estadual estipula o preço para a nova chapa, que já é obrigatória para veículos zero-quilômetro e na transferência de propriedade/documentação. No Rio, custa R$ 219,35 para automóveis e R$ 90,12, para motos — exatamente o mesmo valor da placa antiga.
Acontece que poderia ser mais em conta. Esse custo da placa antiga, como já dissemos, ocorre porque ela tem duas chapas metálicas (uma com o alfanumérico, outra com nome da localidade), mais o lacre. A nova placa tem apenas uma chapa metálica e o lacre poderia ser dispensado (já que não há elementos a serem unidos).
Além disso, há o custo do “processo burocrático”. No Rio, mesmo que para realizar somente o serviço de troca de placa, é necessário pagar dois “Duda” (a unidade de pagamento de serviços do Detran). Um Duda para confecção de placas e outro Duda como taxa do serviço de troca de placa.
“Vale salientar que a alteração só é obrigatória no ato da realização de alguns serviços, como transferência de propriedade e troca de jurisdição. Nesse caso, só será necessário pagar o Duda pertinente ao serviço que será realizado e o Duda de confecção de placa, ou seja, o Duda da taxa do serviço de troca de placa não se faz necessário”, confirmou o Detran do Rio.
Procuramos o Procon-RJ e indagamos se a prática configura cobrança dupla abusiva e/ou venda casada. O órgão informou, por e-mail, que não tem prerrogativa legal para atuar em tais casos. “Como esses são valores cobrados por órgãos públicos, não fica configurada uma relação de consumo, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor”.
O Denatran também se justificou jogando o ônus para os órgãos estaduais: “A cobrança de taxas é inerente a cada Detran, o Denatran não tem influência sobre estas cobranças”.
Mesmo com todas as respostas, seguimos acreditando que daria para cobrar menos. E olhamos para os “hermanos” novamente: no país vizinho, a placa nova custa o equivalente a R$ 52, enquanto a segunda via da placa (em caso de furto, quebra ou mesmo perda) sai por aproximadamente R$ 36. E, como dito, anotações burocráticos custam o equivalente a R$ 40.
Pelo visto, o “padrão Mercosul” não foi seguido à risca pelas autoridades de trânsito brasileiras, que preferem sobrepor seu próprio conjunto de regras.
UOL Carros

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