NTU: Parada que faz falta

Uma pessoa decide jantar fora. Escolhe o restaurante e vai até o local, mas, logo na entrada, é surpreendida por uma poça d’água. Com dificuldade, supera o obstáculo e chega à recepção descoberta, onde é informada sobre o tempo de espera e obrigada a aguardar debaixo da garoa e do frio. Quando, finalmente, é convidada a entrar, dá de cara com um ambiente sujo, com paredes quebradas e mesas defeituosas. Alguns buracos no telhado são notados. A comida, entretanto, é boa. Saborosa e temperada na medida.
Foto: Ilustração – Arquivo/UNIBUS RN
Tendo em vista tudo o que a pessoa vivenciou, do momento em que saiu de casa até a chegada do prato, é possível afirmar que ela teve uma boa experiência? Certamente não. O mesmo ocorre no transporte público. Não adianta oferecer aos passageiros ônibus novos, confortáveis e limpos se o caminho até o veículo for cheio de barreiras e inconvenientes, tais como ausência de calçadas, terminais confusos e mal projetados, e pontos de parada depredados ou expostos à insegurança e às variações do clima.
“O caminhar é o primeiro alimentador do transporte público. Então, o cuidado que temos de ter com calçadas, infraestrutura, cobertura, é imprescindível. Costumo dizer que o primeiro desafio de uma administração pública de transporte é colocar o serviço na agenda política principal, e a infraestrutura de apoio e acesso vem junto”, afirma o engenheiro civil Romulo Orrico, que atua em pesquisas de planejamento, economia e regulamentação de redes de transporte, e já foi secretário de Administração do Estado do Rio de Janeiro e subsecretário de Transportes da cidade do Rio.
Assim, é impossível falar em melhoria do serviço sem considerar a importância da chamada infraestrutura de embarque e desembarque, que inclui justamente pontos de ônibus, terminais e calçadas. Buscar fontes de financiamento para a operação, baixar a tarifa e investir em BRTs e faixas exclusivas para ônibus são pontos-chave. Mas também é fundamental garantir acesso confortável e seguro nas plataformas dos terminais e ao longo do trajeto, sem deixar de lado as pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.
“A parte de infraestrutura de transporte no Brasil ainda é muito deficiente. A falta de investimento público permanente nessa área tem representado um grande atraso na melhoria do sistema. Faltam recursos, e o que é disponibilizado normalmente vem por meio de financiamento, mas os municípios, responsáveis por organizar o serviço, não têm condições de endividamento para tomar empréstimos”, lamenta o presidente executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Otávio Cunha.
Segundo levantamento realizado pela entidade junto à sua rede de contatos técnicos de empresas associadas, há 194 terminais e seis estações de integração em 17 municípios. As cidades com maior número dessas estruturas são Natal e São Paulo, com 28 unidades cada; Rio de Janeiro, com 25; e Curitiba e Goiânia, com 21 cada. A gestão dessas estruturas varia entre poder público, iniciativa privada ou associações. E é aí que chegamos a um dos principais impasses: quem deve, realmente, cuidar desses terminais?
Operadoras de transporte
Para Otávio Cunha, antes mesmo de responder a essa pergunta, é preciso preencher duas lacunas presentes na concepção de terminais no país. A primeira é um planejamento mais eficaz da operação: “Em Brasília, por exemplo, o BRT Sul possui bom pavimento e estações bem construídas, mas que vivem abandonadas porque não há alimentação de linhas. Os ônibus lotam no Gama (ponto inicial da rota) e vão direto para o centro. Isso sem falar nas estações inacessíveis para o usuário. É um bom projeto de engenharia, mas não de transporte”.
Já a segunda brecha diz respeito à previsão, ainda no projeto, da manutenção das estruturas, que deve ser feita corretamente ao longo do tempo. “O problema é que os investimentos são feitos apenas num primeiro momento, para inaugurar. Uma coisa é a obra, outra coisa é a prestação do serviço. Tem que cuidar dos veículos e dos espaços, e os custos são elevados, precisam ser calculados e previstos no projeto”, recomenda o presidente executivo da NTU.
Em Goiânia (GO), quem cuida dessa gestão é o RedeMob Consórcio, formado por cinco empresas operadoras do sistema de transporte na capital e na região metropolitana. O contrato com a Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC) passou a valer em 2008. As obras de infraestrutura dos terminais ficam com a CMTC, enquanto a administração e a manutenção são do consórcio. Desde então, houve revitalização de estações antigas e construção de novas na rede, composta por 18 municípios com 283 linhas integradas. Uma realidade diferenciada, onde é possível percorrer até 100 km com um único bilhete.
Ao assumir os 21 terminais, o RedeMob melhorou a gestão, com segurança eletrônica e física — em comunicação direta com a Secretaria de Segurança Pública via rádio, telefone e sistema
on-line —, limpeza, ordenação de filas, display com informações em tempo real e organização do comércio, com a retirada de 2,3 mil camelôs e pesquisas com o público para definir que serviços seriam permitidos. Além disso, 16 terminais ganharam bicicletários. Balanço final: queda na insegurança e salto na satisfação.
Em 2005, pesquisa da CMTC evidenciou reclamações em relação aos terminais e aos ônibus. Já na última consulta realizada, em 2016, não houve queixas sobre terminais. “Antes disso, o poder público tinha condições de manter, mas, com as concessionárias, ganhamos qualidade em segurança, higiene, conforto e manutenção contínua. Os terminais se tornaram um novo cartão de visita para o transporte coletivo de Goiânia”, afirma o presidente da CMTC, Benjamin Kennedy.
Num sistema em que apenas um terminal chega a receber 400 mil pessoas diariamente, a conquista é inegável. Assim como os benefícios para a população. “Terminais são importantes para baratear as viagens. Temos integração muito alta, pessoas que fazem até cinco trajetos pagando somente uma passagem. E nosso foco é o transporte público, tanto que colocamos pouco comércio. Por um lado, ganhamos menos receita complementar, mas por outro oferecemos um ambiente confortável para o serviço principal”, ressalta o diretor executivo do RedeMob Consórcio, Leomar Avelino Rodrigues.
Terminal Bandeirantes – Goiânia (GO) / Foto: Arquivo RMTC
Mas, se há avanços, também existem dificuldades. Além da queda de cerca de 30% na demanda nos últimos cinco anos, e da perda de fluidez — ônibus que antes faziam 10 viagens, hoje realizam seis ou sete —, as empresas operadoras enfrentam a barreira dos altos custos. O uso de 3% da receita na gestão dos terminais, previsto na licitação, não se concretizou. Segundo o RedeMob, a manutenção de toda a estrutura compromete 7% da arrecadação, mais que o dobro. Atualmente, o consórcio trabalha em um processo para rever o contrato com a CMTC, que aguarda os dados para tomar providências.
No que diz respeito às calçadas e abrigos dos pontos de ônibus, o problema é um pouco mais complexo, já que a responsabilidade não é concentrada, mas sim de cada região metropolitana. Ao todo, há 6,6 mil pontos de parada e somente metade com abrigos. Boa parte está deteriorada ou vandalizada. O consórcio tem feito manutenção em 20 estruturas para servirem de modelo e os municípios estão implantando abrigos, mas ainda há muito a ser feito. O mesmo ocorre com as calçadas. Apesar da construção de calçadas com acessibilidade no corredor da Avenida T-7, a maioria ainda não dispõe dessa facilidade.
Empresas especializadas
Distante de Goiânia, Fortaleza (CE) implantou seu sistema integrado, com sete terminais e tarifa única, em 1992. A gestão e manutenção dos terminais ficaram a cargo da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor) até o final de 2015, quando a Socicam — uma empresa especializada em gestão integrada de espaços públicos em infraestrutura de mobilidade, com experiência em administrar estruturas rodoviárias, de portos e aeroportos —, por exemplo, assumiu o serviço.
Além de melhorar a gestão dos terminais, a contratação da empresa permitiu que profissionais da Etufor ficassem 100% focados em mobilidade urbana. “Com apenas um mês, conseguiram o que não alcançamos em 20 anos, chegando a 85% de avaliação positiva. E liberamos cerca de 300 funcionários para cuidar da operação do sistema, intervindo em linhas com filas grandes e colocando ônibus reserva, em vez de ficar de olho em camelôs”, comemora o vice-presidente da Etufor, Antonio Ferreira.
O sistema da capital cearense atende um milhão de pessoas por dia, com a operação de 2,1 mil veículos feita por 11 empresas urbanas e seis metropolitanas. O fim do comércio de ambulantes foi apenas uma das medidas tomadas pela Socicam, que também tornou os terminais mais limpos, seguros e organizados. Tudo isso com o mesmo recurso utilizado anteriormente pela prefeitura, de R$ 2 milhões mensais. Além disso, o poder público ampliou e reformou dois terminais. Nos demais, ocorreram pequenas reformas.
As mudanças foram aprovadas, conforme mostra uma pesquisa do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus) feita em 2017 com 1.190 passageiros para avaliar a percepção sobre a qualidade dos terminais, a segurança e os serviços oferecidos. Desse total – sendo a maioria dos deslocamentos por motivo de trabalho ou estudo –, 90% considerou que os terminais facilitam o deslocamento pela cidade. Quesitos como tempo de espera na parada, tempo de viagem, segurança, conforto, lotação e qualidade do serviço foram bem-vistos pelo público.
“A pesquisa revelou um apreço muito grande da população pelos terminais. Fortaleza vinha passando por um cenário de violência muito forte. Então, ao chegar aos terminais, os passageiros enxergavam um oásis, pois se sentiam mais seguros. Já é cultural o uso desses espaços. Às vezes as pessoas podem até fazer um trajeto mais funcional, mas optam por ir aos terminais, até porque há serviços”, comenta o presidente do Sindiônibus, Dimas Barreira.
Serviços que poderiam ser mais bem explorados, segundo Dimas. Apesar de as lojinhas de conveniência, lanchonetes e afins serem importantes para o público que transita pelos terminais, o potencial desses espaços pode ser muito superior. Prova disso é o shopping Parangaba, que se firmou economicamente em tempo recorde. Inaugurado ao lado do terminal de mesmo nome, com ligação direta por passarela, o shopping virou exemplo de empreendimento bem-sucedido.
Terminal Messejana / Maio-2018.Foto: Prefeitura de Fortaleza
Agora, o desafio é integrar cada vez mais. Com a adoção do bilhete único a partir de 2011, Fortaleza implantou, em 2013, a integração temporal — que, ao contrário da integração física, em que é preciso passar pelo terminal para fazer mais de um trajeto com uma só passagem, permite a conexão entre as linhas em qualquer ponto de parada, dentro de determinado espaço de tempo. No caso da cidade, o passageiro pode usar mais de um ônibus no intervalo de duas horas.
No início, entretanto, a integração só podia ser feita em sentido único. A adesão foi baixa. Então veio o reconhecimento biométrico e a redução das fraudes. Passou a ser permitido ir para qualquer sentido com apenas uma passagem, dentro de duas horas. “As 15 mil integrações por dia saltaram para 120 mil. Essa é uma grande política, que possibilita vários usos para o serviço de transporte e com bons retornos ao público, mas, em Fortaleza, não serviu para esvaziar terminais. As pessoas querem viajar direto ou integrar via terminal. É cultural, elas gostam”, observa Dimas Barreira.
Em relação aos pontos de ônibus e às calçadas, a capital do Ceará ainda tem muito a melhorar — assim como todo o país. Por lá, são seis mil pontos, entre abrigos completos, de concreto, tubulares feitos com acrílico, e também aqueles sinalizados somente com uma placa afixada ao poste. O objetivo é buscar a integração entre os cerca de 100 km de faixas exclusivas e investir mais em calçadas, que precisam melhorar em termos de acessibilidade. Embora praticamente 100% dos ônibus tenham elevadores, nem sempre as pessoas com mobilidade reduzida conseguem chegar ao ponto de parada.
Existe modelo ideal?
Diante de tantas possibilidades no universo dos terminais e dos pontos de ônibus, são muitos os questionamentos sobre os caminhos mais indicados. O que é consenso é a necessidade de planejamento e união de forças. Planejamento para reorganizar a rede de transporte, pensando nos trajetos e nas integrações de forma inteligente. Em municípios grandes e médios, consultorias ou empresas públicas com equipes especializadas podem ajudar nos projetos.
Já os pequenos podem contar com seminários, congressos, workshops e cursos promovidos pela Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). No momento, a entidade promove o Guia Básico de Gestão para a Melhoria da Qualidade do Serviço de Ônibus. O objetivo é sensibilizar gestores públicos e privados sobre o tema, com destaque para o desenho da rede e programação dos serviços, que devem ser feitos de acordo com as particularidades de cada cidade.
A união de forças, como fica claro, está ligada à unidade na administração. Segundo o superintendente da ANTP, Luiz Carlos Néspoli, o Branco, a fragmentação da competência de construir e fazer a manutenção e a gestão das vias públicas, com divisões dentro da própria estrutura das prefeituras, é um problema. “Seria importante que os assuntos intimamente relacionados com a mobilidade urbana, como o tráfego geral, a sinalização de trânsito, os sistemas de transporte e as calçadas (o que inclui abrigos de pontos de parada), ficassem sob uma mesma gestão centralizada da mobilidade urbana, com foco nas pessoas que ali circulam”, recomenda.
Esse foco também precisa existir ao se pensar os critérios para instalar terminais e pontos de parada: analisar a concentração da população e das construções em determinadas áreas é essencial, sem deixar de lado a demanda e o perfil de cada cidade. Ao planejar a integração, a dúvida é entre a física (feita nos terminais) e a temporal (em qualquer ponto, com bilhete único). Para o presidente executivo da NTU, essa é uma situação em que uma opção não anula a outra.
“A integração temporal é mais interessante porque consegue otimizar o deslocamento da pessoa, eliminando percursos negativos. O passageiro não precisa ir ao terminal se ele está num ponto em que pode seguir direto. Está provado que um modelo só com terminais fixos é contraproducente, mas a integração física também é importante; portanto, o ideal é combinar, dar opções aos passageiros”, defende Otávio Cunha. O engenheiro civil Romulo Orrico concorda: “Não existe um padrão, mas sim um olhar voltado para a população”.
– Embarque em nível e acessibilidade
– Pagamento antecipado – diminui o tempo de embarque e o tempo total de viagem
– Interseções controladas por semáforos inteligentes – melhoram a velocidade
– Informações (linhas e horários dos ônibus) em tempo real para os passageiros
– Veículos modernos
– Estações fechadas, bem iluminadas e seguras
O mesmo vale para os pontos de parada. Há unanimidade quanto à distribuição dessas estruturas com foco na experiência do usuário, evitando longas caminhadas, por exemplo. Limpeza e segurança também são critérios básicos. Já os serviços de comunicação e informação aos passageiros requerem uma discussão mais aprofundada. Se, de um lado, o conceito de smart cities — que propõe tecnologias como quiosques de consulta e Wi-Fi em todos os pontos — é uma meta mundo afora, no Brasil ainda há debates. “Colocar na rua é um desafio em termos de custos, vandalismo e manutenção por intempéries do tempo”, pontua o presidente do Sindiônibus, Dimas Barreira, que considera a informatização por meio de aplicativos mais eficaz.
Na avaliação de Romulo Orrico, é importante personalizar os pontos de ônibus. “Cidades mais quentes e mais frias deveriam ter abrigos diferentes. Sempre de acordo com a realidade de cada público, inclusive em relação às informações. Hoje, essa comunicação é primária, quando existe. Quem não conhece a rotina ali, não vai usar o transporte público. Ou facilita a vinda de mais pessoas, ou o sistema vai perder a utilidade”, alerta o engenheiro civil.
Quem deve pagar a conta?
Como toda e qualquer discussão em torno do transporte público coletivo, é impossível não considerar o fator financeiro. Em um sistema com queda constante de demanda e dificuldades para sustentar a operação e realizar investimentos, dinheiro importa, e muito. Quanto à infraestrutura de embarque e desembarque, cabe primeiro retomar a pergunta feita no início da matéria: quem deve, realmente, cuidar dos terminais?
O superintendente da ANTP acredita que a discussão não é sobre o mais competente na missão — poder público ou iniciativa privada —, mas sim sobre a participação de cada um no processo. “A facilidade do ente privado em gerenciar os recursos na quantidade e no prazo necessários é maior, por todas as restrições que cercam a administração pública”, exemplifica Branco.
Um caminho que tem sido considerado é o das Parcerias Público-Privadas (PPP). Mas não é qualquer PPP, e sim a modalidade de concessão patrocinada, em que o poder público utiliza recursos do orçamento para complementar a remuneração do parceiro privado, pelo fato de as tarifas cobradas da população não serem suficientes para dar retorno ao serviço. Um bom exemplo já ocorre na concessão das rodovias, na qual as empresas recebem o pedágio e uma contrapartida adicional da administração pública.
“Considerando a incapacidade dos municípios de fazer esses investimentos, um modelo de PPP em que o empresário seja responsável pelas obras, manutenção e operação do serviço, e o poder público amortize o investimento, poderia agilizar a melhoria do transporte no país. Em um contrato de 15 anos, o município teria esse prazo para ressarcir. Mas não seria uma concessão como a que temos hoje, e sim uma com segurança jurídica maior”, destaca Otávio Cunha.
Nas capitais goiana e cearense, tal modelo já vem sendo pensado. Em Fortaleza, o bom trabalho com uma empresa privada à frente da gestão dos terminais levou a Etufor a realizar uma licitação para credenciar empresas a apresentar um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI). Assim, três companhias receberam o direito de fazer estudos sobre a viabilidade de uma PPP na atual gestão. Esses estudos foram concluídos e indicaram que sim, a parceria entre o poder público e a iniciativa privada é vantajosa.
Agora, o processo está em fase de conclusão para aprovação na prefeitura e lançamento da concorrência. “O estudo de modelagem mostrou, inclusive, que quatro terminais são edificáveis, ou seja, podem ser ampliados e ter uso residencial ou comercial, por exemplo”, explica Antonio Ferreira, vice-presidente da Etufor. “Entendo que as PPPs são uma saída para desenvolver o Brasil em um ritmo mais acelerado e liberar o poder público para investir em outras áreas, como saúde e educação. Não há recursos para o governo fazer tudo”, complementa.
Em Goiânia, a CMTC também estuda a possibilidade de uma PPP. A previsão é que, assim como em Fortaleza, a capital de Goiás faça um chamamento para que empresas analisem a viabilidade de uma parceria público-privada. “Apesar de a gestão atual funcionar bem, queremos verificar vias para atrair mais recursos para o sistema. Passar para a iniciativa privada, com exploração de shopping e outras categorias não relacionadas ao transporte, pode ser interessante”, ressalta Benjamin Kennedy.
Mas de onde viriam os recursos que o poder público repassaria às empresas como complemento nessas PPPs? Entre as opções que têm trazido esperança ao setor está a elaboração de uma proposta de emenda à Constituição que possibilite uma cooperação mais efetiva entre governos federal, estadual e municipal, para criação de um fundo nacional para mobilidade urbana. Tudo isso foi debatido em audiência pública da Subcomissão Especial de Mobilidade Urbana, na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), presidida pelo senador Acir Gurgacz (PDT-RO).
A proposta do setor é criar um fundo que banque 50% dos custos de operação, mas também surgiu, do próprio Senado, a sugestão de um segundo fundo, este para infraestrutura em geral, que incluiria pontos como saneamento básico e transporte. “Com esse recurso, a tarifa média, que gira em torno de R$ 4, cairia para R$ 2, o que atrairia muitos passageiros. Se o fundo de infraestrutura for aprovado também, estaremos no melhor dos mundos”, diz Otávio Cunha.
Também há movimentação na esfera municipal. Em Goiás, municípios e Estado discutem a implantação de um fundo de desoneração do serviço, o chamado Fundão. Seriam R$ 240 milhões anuais oriundos do emplacamento e licenciamento de veículos particulares para investimentos em operação e infraestrutura. Por ora, há uma minuta de projeto de lei que ainda não foi encaminhada para a assembleia legislativa. “Mas já passou da hora de termos também um fundo nacional. Como o transporte público é um direito social desde 2015, e o Congresso ainda não atentou para a criação desse fundo?”, questiona Benjamin Kennedy.
Para o presidente do Sindiônibus, Dimas Barreira, a criação de fontes de financiamento a partir do privado é mais do que justa: “O transporte individual é o claro exemplo da falência do coletivo. É conveniente para quem usa e inconveniente para todos. Os passageiros custeiam o transporte público, a gratuidade de todos e pagam impostos, enquanto o veículo particular onera a cidade. É uma relação muito invertida. A rede precisa de financiamentos cruzados para baratear a tarifa e incentivar o uso”.
Construindo Hoje o Amanhã
O documento setorial “Construindo Hoje o Amanhã”, lançado em março de 2019, traz propostas para o transporte público e a mobilidade urbana sustentável no Brasil, e, claro, não poderia deixar de fora a infraestrutura. Um dos programas propostos prevê ações para priorização do ônibus no sistema viário, com investimentos em faixas exclusivas, corredores junto a canteiros centrais, e em sistemas BRT com estações de grande porte (ver Infraestrutura, pág. 40). Nesses projetos deve-se considerar o entorno, visando melhorar o acesso à rede de transporte.
Os benefícios são inúmeros: aumento da velocidade comercial, redução dos congestionamentos, redução no consumo de combustível, na emissão de poluentes e também nos custos operacionais — portanto, na tarifa. Mesmo com tantas vantagens, o superintendente da ANTP aposta no convencimento como o maior obstáculo do programa.
“Um dos primeiros desafios é convencer a sociedade e parte dos gestores públicos da importância de via exclusiva para o ônibus nas cidades brasileiras. Poucos sabem que a velocidade média comercial gera impacto no custo final e, por sua vez, na tarifa”, observa Branco.
Matéria publicada na Revista NTUrbano Ed. 41 Setembro/Outubro de 2019

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