Aracaju: Mais protagonismo para o transporte público

Encontrar alternativas para adequar a cidade aos diversos meios de transporte, aliadas a soluções eficientes para diminuir os impactos ambientais da queima de combustíveis, é um dos grandes desafios modernos. Nesse sentido, a Prefeitura de Aracaju (SE) tem atuado para preparar melhor a cidade às futuras gerações, a partir da implementação de uma série de intervenções por toda a capital, com base em estudos técnicos e ações planejadas.
Foto: José Domingos/Ônibus Brasil
Em entrevista à Revista NTUrbano, o prefeito de Aracaju e vice-presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), Edvaldo Nogueira, destacou que atualmente a melhoria do trânsito deve ser feita com inteligência e tecnologia. “É um desafio imenso e que não se resolve de maneira simples. No caso de Aracaju, temos utilizado a tecnologia a favor do cidadão, pois entendo que as soluções nem sempre estão em obras de engenharia, mas em inteligência para tornar o trânsito e o transporte melhores”, destacou.
Confira a íntegra da entrevista:

Qual o futuro da mobilidade urbana e do transporte de Aracaju?
Estamos executando um ambicioso Projeto de Mobilidade Urbana, cujo investimento é de R$ 140 milhões. Nele, estão incluídos quatro corredores de transporte, construção de um novo terminal de ônibus e reforma de outros já existentes, instalação de 150 semáforos inteligentes, construção de uma Central Semafórica e implantação de 150 novos abrigos de ônibus. De modo que, neste momento, temos obras já iniciadas em três corredores — em dois, já bastante avançadas —, com a retirada do pavimento antigo, já muito deteriorado, e colocação de uma nova pavimentação. Também estamos em fase de conclusão da colocação dos semáforos, que logo entrarão em funcionamento. Ademais, trabalhamos paralelamente em ações complementares, como a recuperação de avenidas transversais aos corredores, recuperação das ciclovias e construção de rampas de acesso nas calçadas para pessoas com deficiência. Com os semáforos inteligentes, acrescentamos o uso da tecnologia para alívio no fluxo das vias por contarem com sensores que liberam a passagem dos motoristas de acordo com o tráfego apresentado. Acredito que, ao concluirmos todas as intervenções do projeto, teremos dado uma nova cara à mobilidade urbana de Aracaju.
Qual avaliação o senhor faz do desempenho das cidades em relação à mobilidade urbana e ao transporte público?
As cidades, de uma maneira geral, estão buscando caminhos nessa área, seja por meio da integração do transporte, seja na implantação de novos modais, seja no estímulo ao uso de meios alternativos, como a bicicleta. É um desafio imenso e que não se resolve de maneira simples. No caso de Aracaju temos utilizado a tecnologia a favor do cidadão, pois entendo que as soluções nem sempre estão em obras de engenharia, mas em inteligência para tornar o trânsito e o transporte melhores. Também estamos em diálogo com as cidades que compõem a região metropolitana para a instalação de um consórcio que nos dará condições de realizar a licitação do transporte público, passo que considero extremamente importante para a oferta de um serviço com mais qualidade.
De que forma o senhor pensa que deveriam ser feitas as políticas públicas de governo para o transporte coletivo ser visto como prioridade por toda a sociedade?
O transporte coletivo já é prioridade para parcela significativa da sociedade, que tem nele seu principal — quiçá único — meio de prover sua mobilidade diária. Creio que para que alcance relevância maior para toda a sociedade, esse tipo de transporte precisa passar a ser visto como prioridade pelo poder público, sobretudo a União, que hoje é quem detém a maior parte dos recursos na divisão do bolo tributário. À medida que o serviço de transporte melhora, o número de usuários aumenta e diminui a ocupação das cidades pelo transporte individual, ou seja, diminuímos o uso do solo urbano por modais particulares, priorizando o coletivo, resgatando assim a dimensão coletiva das cidades, do espaço público urbano. Então, eu acredito que a mobilidade urbana de maneira geral precisa estar entre as prioridades do governo federal, uma vez que essa é uma pauta já muito presente na vida das cidades. Quem não se lembra dos grandes protestos de 2013 que tiveram como ponto desencadeador justamente o reajuste da tarifa do transporte público em São Paulo? De lá para cá, tivemos mudança de governo duas vezes e até agora o transporte público não teve a devida atenção da União.
Como o senhor avalia as dificuldades das cidades e municípios na elaboração dos planos de mobilidade, tanto em conseguir recursos como na elaboração e implementação?
A mobilidade urbana tem uma pauta muito complexa, que demanda um grande montante de recursos, muito conhecimento técnico e muita compreensão da população. É um fenômeno que tem ligação direta com a função coletiva das cidades e o caráter do uso que a sociedade faz dela. A cidade é de todos, e quem garante essa dimensão social, coletiva é, em grande parte, o grau de mobilidade que todos possam ter no espaço urbano. É uma questão também de consciência das pessoas e dos dirigentes sobre o uso das cidades. Por causa disso, é natural que os municípios encontrem dificuldades na elaboração e execução de um plano. Mas, ao mesmo tempo, eu acredito que é possível que as cidades construam seus planos, a prova está no projeto que estamos executando em Aracaju. Com muito foco, planejamento e uma equipe competente é possível dar passos nessa área.
E sobre a Proposta de criação de um fundo de transporte que tramita no Congresso Nacional? Ajudaria no sistema de transporte público?
Avalio que uma proposta sobre esse tema deve ter um caráter mais amplo e não somente focado no financiamento da tarifa, como é a Emenda 200/2019 à PEC 45/2019. É preciso garantir, por exemplo, novos investimentos em infraestrutura. Além disso, reitero minha defesa de participação mais ativa da União nesse processo. Os municípios sozinhos têm dificuldade de lidar com esse tema, pois demanda uma quantidade muito grande de recursos. Mas, de toda forma, já vejo como um avanço existir uma proposta em tramitação que foque na redução do valor da tarifa, a partir de uma linha de subsídio público.

O senhor implementou serviços de mobilidade em suas gestões, que foram paralisados em outros governos.  Como implementar uma mobilidade eficiente com essa política de descontinuidade?
Tornando a mobilidade uma política de Estado e não de governo. Ou seja, uma atividade regular da União, estados e municípios, que trace planos de longo prazo, estabeleça metas e objetivos que não se inscrevam no âmbito da duração dos mandatos de governo, mas seja uma política perene dos entes nas diversas esferas. A descontinuidade de políticas e projetos é um mal que perpassa a mobilidade urbana e, infelizmente, prejudica todas as áreas da administração pública. Da minha experiência, o que posso dizer é que eu fiz tudo o que era possível para que o meu sucessor continuasse o projeto. Após a vitória dele em 2012, me reuni com ele, apresentei o projeto e até o levei para uma audiência com a presidente da República à época, Dilma Rousseff, dada a importância do projeto e dos recursos (R$ 130 milhões) que havíamos conquistado para a Mobilidade Urbana. No entanto, ao assumir, o prefeito preferiu alterar o projeto e elevar o seu valor, o que inviabilizou a execução. Ao voltar ao comando da gestão municipal, em 2017, corri atrás dos recursos e, após muito diálogo e articulação, garantimos a verba e o projeto está sendo tocado a todo vapor. 
Explica um pouco o que é e como está a implementação do serviço Busão Conectado?
O Busão Conectado é um sistema de rastreamento de todos os veículos do transporte coletivo, otimizando o gerenciamento do sistema de transporte pela SMTT e permitindo que o cidadão, através de um aplicativo, saiba os horários em que os ônibus passarão nos pontos. Já avançamos bastante nesse projeto, e a previsão é de lançarmos, em dezembro, o serviço, que garantirá ao cidadão acompanhar os horários dos ônibus. Com isso, o usuário ganhará em comodidade e no uso racional do seu tempo. 
E a rede de transporte fluvial?
A rede de transporte fluvial é um projeto com o qual sonhamos quando chegamos à Prefeitura, e considero uma ideia extraordinária para a nossa cidade. O Rio Sergipe, que liga pontos importantes de Norte a Sul e a região Noroeste da cidade, inclusive com possibilidades de ligação com outros municípios da região metropolitana, serviria a essa rede. No entanto, há uma grande dificuldade para financiamento desse projeto, dada a necessidade de recursos volumosos para esse empreendimento e a falta de agências que disponibilizem linhas de crédito para esse tipo de iniciativa. E, tudo isso, num cenário de crise econômica do país. Associado a isso, temos outra questão que é a necessidade de despoluição do rio, o que encarece ainda mais a proposta. Mas esse é um sonho que tenho e acredito que, passada a crise, será possível buscar meios de executá-lo. Além disso, é uma proposta que será incluída no Plano de Desenvolvimento que estamos elaborando para a cidade com propostas para Aracaju até 2055.

E qual o papel do Pró-Transporte? Essa linha de crédito é adequada para as necessidades dos municípios?
O Pró-Transporte é uma linha de financiamento com recursos do FGTS, com taxa de juros mais baixa, para financiar justamente programas de infraestrutura em mobilidade urbana, transporte, saneamento e habitação. Por ter uma taxa de juros mais baixa, ele se mostra sim mais adequado para investimentos em áreas importantes às cidades, como a mobilidade. Como os recursos da União e dos entes federados são escassos e disputam espaço com Saúde, Educação e pagamento de salários ao servidor, não acessar financiamentos como o Pró-Transporte significa, muitas vezes, não garantir à população melhores condições de vida em outras áreas.  É importante pontuar ainda que só consegue acessar essa linha de crédito quem tem regularidade fiscal e capacidade de pagamento, que é o caso de Aracaju. Desenvolvemos um trabalho de ajuste de contas severo, o que melhorou a avaliação da saúde financeira da cidade perante a Secretaria do Tesouro Nacional. De letra “C”, a Prefeitura evoluiu para letra “B”, o que foi, inclusive, destaque nacional no jornal Valor Econômico e no portal UOL. Isso nos permitiu ter acesso a recursos de financiamentos até com agentes estrangeiros, como foi o caso do financiamento de 75 milhões de dólares com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para obras de infraestrutura, sendo a principal delas uma nova avenida na região Oeste da cidade.
A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) tem planos estratégicos focados em trabalhar o tema mobilidade e transporte público nos municípios? Como funciona?
A mobilidade urbana é uma das pautas prioritárias da FNP, porque é um assunto importantíssimo para as médias e grandes cidades. Como representante de municípios com mais de 80 mil habitantes, a entidade participa, constantemente, de debates e trabalha pela construção de alternativas estruturantes, que viabilizem o financiamento do setor no Brasil. Diante da baixa capacidade de investimento das cidades, insistimos que a Cide Verde sobre os combustíveis, por exemplo, é uma política possível, já que baratearia as tarifas do transporte público. Propostas para a qualificação e o custeio do transporte público estão no estudo intitulado “Construindo hoje o amanhã”, uma parceria entre ANTP, NTU e FNP. O documento reúne cinco programas com ações necessárias para um transporte coletivo de qualidade.
Edvaldo Nogueira é vice-presidente Nacional da Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e prefeito de Aracaju, Capital de Sergipe. Foi duas vezes vereador, presidiu a Comissão de Finanças e participou da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Municipal de Aracaju. Foi eleito vice-prefeito de Aracaju em 2000, sendo reeleito vice-prefeito em 2004 pela mesma chapa. Assumiu a Prefeitura de Aracaju  em 31 de março de 2006, permanecendo no cargo até 31 de dezembro de 2012. Em 2016, Edvaldo Nogueira foi novamente eleito prefeito de Aracaju com 52,11% dos votos.
Matéria publicada na Revista NTUrbano

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