Entrevista: como será o VLP de São José dos Campos (SP)

Do Mobilize Brasil
Foto: Secretário de Transportes Paulo Guimarães Júnior

Já faz alguns anos, a cidade de São José dos Campos (SP) vem buscando projetos de mobilidade que permitam um transporte de massa ligando as duas áreas mais populosas do município, que tem cerca de 721 mil habitantes e quase 2,5 milhões de pessoas em sua Região Metropolitana. A cidade sofre também com o movimento pendular de pessoas e veículos que transitam entre as cidades vizinhas, especialmente Caçapava e Jacareí. Na semana passada a prefeitura anunciou a implantação de uma linha de veículos elétricos articulados na futura Linha Verde, para operação a partir de 2021. Para saber mais sobre o projeto, entrevistamos o secretário de Transportes e Mobilidade da cidade, Paulo Roberto Guimarães Jr. Na entrevista, por telefone, ele explicou que o sistema de transportes será o centro de uma nova área de desenvolvimento urbano na cidade, incluindo habitações, novas calçadas e ciclovia.

O que é exatamente a Linha Verde?

O projeto foi iniciado com a negociação feita pelo município de uma grande área ocupada pelas torres de transmissão de energia na cidade. A concessionária Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (ISA-Cteep) tem uma faixa de 110 metros de largura, que cruza toda a região sul, passa pela região central e segue até o final da região leste, e a prefeitura adquiriu esses terrenos, em troca do IPTU, o que já foi uma primeira inovação, já que pudemos incorporar, sem grandes aportes financeiros, uma área de 20 km de extensão com 20 metros de largura. Numa primeira fase, este projeto de corredor de transporte sustentável contempla a operação do VLP, além de ciclovias, calçadas e algumas praças. O restante da área, desses 110 metros, de acordo com a lei de uso e ocupação do solo, ficarão para empreendimentos que caberão à ISA-Cteep, ou seja, à iniciativa privada. A companhia deverá fazer o enterramento das linhas torres e empreender no local. Além disso, 5% dessas áreas serão destinadas à habitação de interesse social, para conseguirmos de fato construir um modelo de desenvolvimento urbano orientado pelo transporte sustentável. É basicamente essa a proposta da Linha Verde: trazer para dentro do corredor os conceitos de sustentabilidade, de centralidades urbanas, todas esses conceitos mais modernos do planejamento urbano.

Neste momento, o que a Prefeitura vem fazendo para viabilizar o projeto do VLP?

No começo do ano assinamos dois grandes contratos: um para a execução da fase 1 da Linha Verde, que vai ligar a zona sul à região central. Essa obra está orçada em cerca 55 milhões de reais, sendo 30 milhões de reais de aporte do governo estadual. E assinamos outro contrato, de forma simultânea, de 35 milhões de reais, sendo que destes, nove milhões e duzentos mil reais serão empregados por outorga onerosa, do novo sistema de estacionamento rotativo que implantamos na cidade. Esse valor que será aplicado integralmente na compra dos veículos para o corredor. Ainda em agosto definiremos a nova concessão do sistema de transporte público e a ideia é que as novas empresas de transporte operem também a Linha Verde. A prefeitura está entrando com todo o investimento – as obras de infraestrutura e mais a compra dos doze veículos – e vamos entregar toda essa infraestrutura e esse material rodante para as novas concessionárias do transporte público. O objetivo desse investimento é reduzir os valores envolvidos na licitação da operação de todo o transporte público, e com isso entregar ao usuário mais frequência, mais conforto, mais modernidade, com uma tarifa menor.

Já há alguma previsão de como ficará a nova política tarifária do transporte?

Estamos separando a licitação operacional em dois lotes, e o vencedor será aquele consórcio ou empresa que apresentar a menor tarifa de remuneração. Então partimos já do patamar inferior ao da tarifa atualmente praticada. Na licitação a tarifa técnica é de R$ 5,04, e a tarifa máxima de equilíbrio do sistema, considerando os dois lotes, para a futura concessão, é de R$ 4,98.

Como será esse VLP? Terá um trilho central ou será guiado por “trilhos virtuais”?

Em princípio, será guiado pelo próprio motorista, empregando um sistema de câmeras com infravermelho que dá mais segurança para a pilotagem. O que teremos aqui em São José dos Campos é o que se conhece na Europa por “tram-bus”, que é aquele modelo sem a guia, para se ter maior flexibilidade na operação, um dos requisitos principais que buscávamos. É baseado em um chassi de ônibus articulado, elétrico, que traz as características dos VLPs mais tradicionais. É diferente daquele que tem catenária (coletor de energia), ou dos que têm o trilho-guia.

Esse veículo tem alguma perspectiva de carregamento já nas paradas, ou a ideia é carregar à noite, na garagem?

Quando fizemos a conceituação do veículo, consideramos que ele deveria ter uma autonomia de 250 km com uma carga de três horas. Isso dá uma facilidade maior e dispensa a necessidade de carga nas estações de parada. Pelo nosso planejamento, essa autonomia é suficiente para que possamos fazer 100% das recargas nas garagens, e o recarregamento parcial nos horários entrepicos, fazendo o escalonamento dos veículos que são usados na operação. Uma característica, que é um diferencial talvez mundial desse projeto é a tecnologia que a Marcopolo lançou para os veículos rodoviários, e que nem estava no edital, mas que foi incluída com os contratos já em andamento, até em função da pandemia do coronavírus. Os VLPs serão os primeiros na área urbana a incorporar a tecnologia, na qual se tem o ar-condicionado sendo desinfetado a cada três minutos, os acabamentos – toda a superfície de toque como bancos e estofamentos – com aditivos antimicrobianos, para darmos mais segurança nesse chamado “novo normal”.

Quantos quilômetros terá a linha e como será iniciada a operação?

Serão 25 km, considerando a volta completa do sistema. Nessa primeira fase, prevista para entrar em operação em 2021, a linha vai ligar a região sul à região central da cidade. Teremos dois serviços operando, um que vai direto à região mais central da cidade, a praça Afonso Pena, no centro velho, e outro serviço que vai para o Terminal Rodoviário, no limite entre as regiões central e leste. Em outubro de 2021, será a entrega final de todos os veículos dessa primeira fase. O chassi já foi produzido pela BYD e já foi entregue à Marcopolo, que fará a carroceria. Nossa expectativa é que em outubro próximo, ou no máximo em novembro já tenhamos pronto o veículo de homologação, para passar pelos testes de validação. Esse processo já deverá estar encerrado nos órgãos federais em janeiro, quando esperamos que o veículo já entre em operação comercial para que em abril ou maio já tenhamos os primeiros veículos prontos para operar. Isso vai depender muito do andamento das obras, mas planejamos que em outubro de 2021 já tenhamos doze veículos operando em sua integridade.

Essa é a primeira experiência de SJC com veículos elétricos?

Com ônibus, especificamente, sim. Mas já temos uma experiência, há dois anos, com veículos elétricos na frota de segurança pública: temos 35 veículos 100% elétricos da guarda civil municipal em operação. E daí vem um pouco dessa nossa experiência com eletromobilidade. No final do ano passado, também criamos uma legislação para atrair veículos elétricos compartilhados e temos cerca de 30 desses veículos, no sistema dockless, operado pela empresa beepbeep.

Há algum cálculo da redução de emissão de poluentes com a entrada desses novos veículos em funcionamento na cidade?

Temos uma parceria com a Fundação Getúlio Vargas que está fazendo as análises. Não tenho agora os números, mas há toda uma expectativa de redução de emisão de carbono e de ruídos. A Linha Verde traz esse aspecto de sustentabilidade, com menos ruído e com menos intervenções urbanas de efeito barreira…

Qual a demanda esperada de passageiros/dia?

Começamos com uma demanda provocada de 22 mil passageiros/dia, podendo chegar nas nossas projeções a até 50 mil passageiros/dia. Estamos acreditando muito no projeto da Linha Verde como um atrativo de demanda, por isso optamos por um veículo diferenciado, moderno e confortável, para que consigamos realmente criar esse fator de atrativo de desejo e aumento de demanda. E agora com a Linha Verde, temos a expectativa de que nos novos contratos de concessão do transporte público a frota evolua de forma progressiva para a eletromobilidade.

São José é o centro de uma região importante no estado de São Paulo, o Vale do Paraíba, onde há um grande movimento pendular de pessoas circulando entre suas várias cidades. Há alguma perspectiva de se avançar para um transporte de massa que possa atender a esses passageiros, evitando que eles utilizem a Via Dutra, que chega a congestionar como uma avenida nos horários de pico?

Na verdade, o próprio projeto da Linha Verde tem essa característica. Se olharmos o mapa, veremos que a extremidade da linha sul onde inicia a linha verde faz limite com Jacareí e a outra extremidade na zona leste faz limite com Caçapava, que são as duas cidades mais integradas à SJC. Até por essa característica metropolitana da linha verde, houve o aporte do governo do estado de 30 milhões, lembrando que é um aporte e não um financiamento. Então, o projeto tem sim essa característica de fazer a integração regional dentro da região do Vale do Paraíba.

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