Da Tribuna do Norte
Foto: Magnus Nascimento (Tribuna do Norte)
Entregue durante a primeira quinzena de junho deste ano, a estação de trem de Nísia Floresta, na Grande Natal, ainda não tem data para começar a operar. Apesar do fim das obras – e da estrutura estar pronta para uso – a Companhia Brasileira de Trens Urbanos alega que a empresa responsável entregou as estações com problemas de segurança e na catraca. A empresa responsável não comenta o caso. Já o prefeito da cidade de Nísia Floresta, Daniel Marinho (PL), acusa a CBTU de atrasar o funcionamento da estação por “motivações políticas”. Para além dos motivos para o atraso, a população da cidade reclama da demora e torce pela rápida resolução do caso.
Nesta semana, a Tribuna do Norte foi ao local e encontrou uma estrutura bem conservada, com bilheteria, banheiros, catracas e iluminação. No entanto, o calçamento de acesso à estação, apesar de novo, está danificado. Mesmo sem funcionamento, as lixeiras estão tomadas de material como latas de cerveja e itens descartáveis, uma prova de que o local tem sido frequentado diariamente. O prefeito afirma que a preocupação é que a estrutura passe a ser utilizada para consumo de drogas e outras práticas que danifiquem as instalações. “À noite, mesmo com iluminação, tudo fica às escuras”, comenta Daniel Marinho.
A CBTU relatou ter identificado, após o recebimento da obra, “inconformidades nas instalações da estação” e que, por isso, “o trem ainda não começou a circular até Nísia Floresta”. De acordo com nota enviada pela Companhia, o consórcio Vipetro/Domo, responsável pela obra, foi notificado no último dia 7 para correção das “inconformidades encontradas nos serviços executados, tais como drenagem, instalações prediais, segurança (porta de emergência) e no controle de entrada e saída de usuários (catraca)”.
Segundo a Companhia, do ponto de vista técnico e operacional, “a empresa está pronta para iniciar as viagens até a Estação Nísia Floresta, as quais já estão incluídas na programação da grade horária”. De acordo com a CBTU, “até momento, o Consórcio não cumpriu a notificação enviada. Tão logo as inconformidades sejam sanadas, a CBTU informará a toda a população a data de início da operação do trecho”.
Procurado, o consórcio Vipetro/Domo confirmou ter entregado a obra, mas alegou não poder responder a nenhum questionamento por conta de questões contratuais junto à CBTU. Enquanto o serviço não chega, os moradores reclamam e se dizem frustrados com a situação. As irmãs Izaíres e Gizelda moram em Nísia Floresta desde criança, em um período onde ainda podiam desfrutar de viagens de trem para a capital potiguar. Elas vivem atualmente na Comunidade Estação, em frente ao local da estrutura que servirá de embarque e desembarque para o chamado Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).
O nome da comunidade é uma referência à Estação Papary, desativada depois que o transporte de passageiros por linha férrea foi encerrado no Município, na década de 1970. O novo equipamento para embarque e desembarque de quem irá utilizar o VLT foi construído em frente à antiga estação, que hoje é reconhecida como Patrimônio Histórico do Rio Grande do Norte.
Com o início da instalação da nova sede, o desejo de que o trem retorne ao Município virou expectativa de melhor qualidade para quem se desloca de transporte público entre Nísia Floresta e a capital potiguar. “Todo mundo está ansioso para que o trem venha para cá porque é um meio de transporte mais barato, que vai beneficiar a todos. Se a estação estivesse funcionando, ia ser mais fácil se deslocar para Natal ou Parnamirim. O problema é que ninguém sabe quando chega”, reclama a professora Izaíres Freire, de 57 anos.
A irmã dela, a agricultora Gizelda Freire, de 55 anos, também se queixa da falta do modal de transporte. “O trem vai melhorar porque a passagem para Natal é R$ 8 e para Parnamirim é R$ 5. No VLT, a gente só vai pagar R$ 2,50. Então, é um benefício muito bom. Diziam que a estação e o trem vinham e eu não acreditava. A estação veio, mas cadê o trem?”, questiona. O vendedor Ademilson Torres, de 59 anos, diz esperar ansioso pela chegada da operação.
“Vivem prometendo que o trem virá, a estação foi entregue, mas até essa data a gente ainda está aguardando”, aponta. O vendedor comenta que a chegada do VLT vai representar um alívio para o bolso de quem mora em Nísia Floresta e precisa se deslocar até a capital. “A gente que mora na comunidade, quando vai a Natal é preciso seguir até a rodoviária, pagando R$ 2 e depois pega um transporte para a capital. E aí, com a estação bem próxima, a gente só vai gastar os R$ 2,50 mesmo”, relata.
Para quem já usufrui dos serviços de VLT na Região Metropolitana, a reclamação é em relação aos intervalos das viagens. Lucinildo Martins, de 27 anos, veio a Natal para resolver questões pessoais. Ele procurou o trem de volta para Ceará-Mirim, por volta das 9h de quinta, mas soube que a próxima viagem para o destino só ocorreria ao meio dia. “Infelizmente vou ter que espera”, alega.
“Motivação política”, diz prefeito
Para o prefeito de Nísia Floresta, Daniel Marinho (PSDB), o atraso no início das operações do VLT tem motivação política. Isso porque, na opinião do gestor, a ideia é atrelar a obra ao governo atual. A construção da estação de Nísa integra um projeto encabeçado pelo ex-ministro do Desenvolvimento Regional, o senador Rogério Marinho (PL), que contempla a expansão do serviço no RN. O projeto está dividido em etapas, com investimento de R$ 100 milhões. A CBTU não comentou a declaração do prefeito.
A estação de Nísia faz parte da ampliação da chamada Linha Branca, que abrange cinco outras estruturas, totalizando 23,4 km de linha férrea, com investimento de cerca de R$ 78 milhões, de acordo com a CBTU. Em dezembro do ano passado, foram entregues as estações Bonfim e São José de Mipibu. “Acredito que tem um pouco de questão política. Se a obra for entregue agora, será preciso dar crédito a quem vinha construindo [a estação], mas o que se quer, na verdade, é desmembrá-la para que fique como um trabalho do atual governo”, avalia Daniel Marinho.
“No meu entendimento, estão dando um lapso temporal para que a população esqueça e, mais a frente, eles [o atual governo] cheguem como autores e executores da obra”, complementa Marinho. O prefeito reclama que, apesar das inúmeras tentativas, não consegue retorno algum sobre a questão junto à CBTU. “A população tem me cobrado sobre a chegada do trem, mas eu não sei o que fazer. A previsão inicial [para entrega] era setembro de 2022, depois passou para dezembro e, infelizmente, não cumpriram os prazos”, indica.
De acordo com Daniel Marinho, a chegada do VLT à cidade irá beneficiar cerca de 8 mil pessoas. “Nísia Floresta tem 32 mil habitantes, dos quais 10 mil vivem na área mais central da cidade. São eles quem devem aproveitar melhor os serviços e aí, a gente coloca a estimativa de 8 mil beneficiários porque são as pessoas que não têm carro particular. Mas o trem é um meio de transporte rápido, confortável e barato, então, outras pessoas vão querer utilizá-lo. Será um benefício muito importante para as pessoas carentes, que ganham um salário mínimo e não conseguem gastar diariamente R$ 16 [valor de ida e volta] para Natal”, destaca.
Além da estação de Nísia, outras três estruturas, que integram a Linha Roxa, aguardam para que as operações sejam iniciadas: Bela Vista, BR-101 Norte e Jardim Petrópolis. O ramal ligará a Região Metropolitana aos municípios de São Gonçalo do Amarante e Extremoz. A CBTU informou em nota que “as obras da Linha Roxa ainda continuam em andamento. Por enquanto, o trecho da via férrea foi protocolado pela construtora para entrega provisória à Companhia. Todas as providências estão sendo tomadas para o recebimento em consonância com as normas técnicas e o rito contratual”.
O prefeito Eraldo Paiva (PT), de São Gonçalo do Amarante, chamou atenção para o fato de que as novas estações irão atender a um público importante da Grande Natal. Para o gestor, no entanto, não existem motivações políticas para o não funcionamento das estruturas. “A nova operação vai adentrar uma área populosa muito importante, porque abrange o parque industrial da nossa região. Se o trabalhador estiver em qualquer bairro de Natal ou em Nísia Floresta, poderá chegar a Guararapes, por exemplo, com apenas uma passagem”, afirmou.
“Em relação à questão política, acho que isso não existe. É algo operacional da CBTU, porque é preciso ter novas locomotivas, contratar mão de obra e fazer sinalização. Existe uma programação de um governo que assumiu há apenas seis meses e precisa se adaptar. Isso [atrasar a entrega da operação] seria muito pequeno. Se um governo encontra uma obra parada, é preciso finalizá-la, como está acontecendo com vários projetos de moradia social”, complementa Paiva.