Da Revista Technibus
Foto: Marcelo Casal Jr. (Agência Brasil)
Grande parte dos investimentos em deslocamento tem sido destinada para os automóveis, que acabam ocupando mais espaços públicos quando estão estacionados nas vias. Além desse privilégio de uso, os carros acabam por dificultar a circulação de outros meios de transporte, de pedestres e de veículos de atendimento público, como ambulâncias e caminhões de coleta de lixo, por exemplo.
Segundo a pesquisa Origem-Destino de 2017, só na Região Metropolitana de São Paulo um total de 1,5 milhão de automóveis são estacionados gratuitamente nas ruas em dias úteis. Pesquisas feitas em outras cidades apontam grande número de veículos que utilizam esse espaço público como estacionamento, um espaço que custa caro para ser construído e mantido pelo dinheiro de todos, mas que privilegia apenas a quem faz dele ponto de parada para seu automóvel, sem pagar nada por isso.
Estudo publicado pela ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), o Caderno Técnico 28, mostra que se houvesse cobrança pela utilização de vias urbanas como estacionamento, em todo o país, o valor arrecadado poderia chegar a R$ 160 milhões por dia, ou R$ 35,3 bilhões por ano, considerando 220 dias úteis.
Ao atualizar os valores mensurados dos recursos desse “subsídio oculto” de estacionamento de veículos no meio-fio, os números chegam a R$ 14,5 bilhões por ano, somente na Região Metropolitana de São Paulo, de acordo com o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) de fevereiro de 2023.
“Nos ambientes urbanos, os automóveis pouco pagam pela infraestrutura que consomem e não são cobrados pelas externalidades negativas que produzem (congestionamentos, acidentes e poluição). Está na hora de virar esse jogo”, diz Helcio Raymundo, um dos autores do estudo da ANTP.
O estudo analisa a possibilidade de cobrança e como a verba pode ser investida em outras modalidades de transporte. Para o estudo foram utilizadas informações de 533 munícipios com mais de 60 mil habitantes, levando em conta dados de 2014.
Os valores obtidos com as cobranças poderiam ser empregados em ações para melhorar, por exemplo, as condições de conforto e segurança de pedestres, ciclistas e usuários do transporte público. Entre estas ações, o estudo considera a criação de ciclovias, renovação de calçadas e a prioridade para os ônibus no tráfego geral, reduzindo o tempo de viagem dos passageiros.
Em resumo, uma justa distribuição ao invés da concessão de um privilégio.
O estudo do Caderno Técnico 28 foi realizado pelo Sistema de Informações da Mobilidade Urbana da Associação Nacional de Transportes Públicos – Simob/ANTP, que usou como ponto de partida três variáveis:
= Quantidade de viagens de automóveis que usam estacionamento gratuito junto ao meio-fio;
= Tempo médio de permanência no meio-fio; e
= Custo médio de estacionamento em locais pagos.
Considerando estes itens, aplicados a todos os municípios do Simob/ANTP, foi possível calcular quanto custa para a sociedade, segundo valores de mercado, estacionar no meio-fio.
O estudo aponta que a adoção das medidas propostas pode gerar outros benefícios na Mobilidade Urbana, como a redução de poluentes emitidos e os sinistros de trânsito. Mais: com os recursos obtidos, seria possível implantar, anualmente, quase três mil quilômetros de corredores de ônibus, mais de 100 mil minirrotatórias ou mais de 45 mil quilômetros de vias cicláveis, distribuídas pela Região Metropolitana de São Paulo.
Estas estimativas aumentam o debate sobre investimentos que deixam de ser feitos ao não se cobrar por um serviço público que, diga-se de passagem, não tem sua gratuidade garantida por nenhuma lei, portaria ou decreto.