Criação de novas diretrizes para o transporte público é reivindicação histórica de empresas e prefeitos

Do Jornal O Estado de S. Paulo
Foto: Arquivo (Marcopolo / Via Secco Comunicação)

A construção de um novo marco legal para o transporte público coletivo no Brasil surgiu de uma necessidade emergencial. Todos os sistemas ficaram estrangulados com a paralisação de atividades em virtude da pandemia da covid-19, a partir de março de 2020.

Não que o tema não fosse discutido antes disso. Um modelo apelidado de “SUS do Transporte” é uma reivindicação histórica de empresas e prefeitos. Mas a discussão sempre esbarrou na resistência do governo federal em participar do financiamento.

O transporte coletivo é um direito social incluído pela Emenda 90 no artigo 6º da Constituição. Os defensores do “SUS do Transporte” acreditam que, por ser um direito social, é obrigação de todos os entes da Federação participarem da gestão e do financiamento. Daí a necessidade de um marco legal que estabeleça as responsabilidades de municípios, Estados e da União, assim como ocorre no SUS “original”, o Sistema Único de Saúde. A Constituição estabelece ainda que cabe à União instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive na área de transporte.

Em 2012, com a lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana, foram criadas as primeiras diretrizes, mas que não eram suficientes, na visão de operadores do sistema, como empresas e prefeitos. A pandemia escancarou isso.

“A demanda do transporte já vinha caindo, mas com a pandemia ficou insustentável. Os sistemas começaram a entrar em colapso, teve intervenções em várias empresas. Daí surgiu a ideia de criar uma referência nacional para o setor. Se julgou muito importante ter um marco regulatório. Essa foi a gênese”, detalhou Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP).

Projeto no Senado
Em setembro de 2021, o então senador Antonio Anastasia (PSD-MG) apresentou um projeto de lei para atualizar a Política Nacional de Mobilidade Urbana. Foi o primeiro movimento legislativo para a construção do marco legal do setor. O projeto tramitou nas comissões temáticas do Senado, mas não chegou a receber pareceres para ser levado a plenário. Ao final da legislatura, em janeiro de 2023, o projeto foi arquivado. Anastasia, atualmente, é ministro do Tribunal de Contas da União (TCU).

Também em setembro de 2021, o governo federal criou um fórum consultivo de mobilidade urbana para debater soluções. O fórum, do qual participaram entidades representativas de prefeitos, empresas de transporte, fabricantes de ônibus e trabalhadores, debateu e apresentou, já em março de 2022, uma minuta de projeto de lei para o marco legal. Essa minuta foi aprimorada, esteve em consulta pública entre novembro de 2022 e fevereiro de 2023 e recebeu 870 contribuições.

Procurado, o Ministério das Cidades informou apenas que a pasta vai se manifestar após a finalização do texto, que passará por audiências públicas em agosto e deve ser enviado ao Congresso em setembro.

Para Edvaldo Nogueira (PDT), prefeito de Aracaju (SE) e presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), o texto proposto é um grande avanço.

“Definiu a repartição tripartite do transporte público, definiu o papel de cada ente federado. No mundo inteiro o transporte, principalmente nas metrópoles, é bancado com dinheiro federal. Aqui também precisa ser. A passagem não consegue mais bancar o sistema. Vamos ter um marco regulatório que reflita o verdadeiro federalismo.”

Não há prazo fixado para que o texto seja aprovado, mas a expectativa da FNP é de votação ainda neste ano.

Para Néspoli, da ANTP, o fato de o projeto estar sendo discutido inicialmente no âmbito do governo federal é positivo porque cria um compromisso. “Sendo proposta do Executivo, e adotando esse princípio de participação de União, Estados e municípios, o governo é parte envolvida e estará comprometido.”

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