Da Folha de S. Paulo
Foto: Divulgação (PMPA)
Pela primeira vez desde 1995, Porto Alegre não terá passe livre no seu sistema de ônibus em dia de eleição. O benefício previsto em anos anteriores para facilitar o voto nos domingos eleitorais na capital do Rio Grande do Sul foi um dos que caíram em uma revisão da lei municipal que rege as gratuidades no transporte público, ocorrida em dezembro do ano passado.
A lei, de autoria do Executivo, foi aprovada à época por 20 votos a 13 na Câmara Municipal e sancionada pelo prefeito Sebastião Melo (MDB). Até o momento, a prefeitura diz que não pretende voltar atrás.
A medida é criticada por políticos de esquerda, que veem nela uma forma de dificultar o voto de eleitores de baixa renda, aumentando a chance de abstenção. Conforme o Datafolha, o eleitorado que recebe até dois salários mínimos é o mais populoso e seria o mais favorável a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A mudança na lei repercutiu em redes sociais e chamou a atenção de influenciadores como Felipe Neto, que a chamou de “escandalosa e imoral”.
À época, Melo justificou a medida com o argumento de que os locais de votação são bem distribuídos pela cidade e costumam ser próximos às residências dos eleitores.
A tarifa de ônibus em Porto Alegre é de R$ 4,80, mais do que a multa de R$ 3,51 estabelecida pela Justiça Eleitoral para quem não votar. Ou seja, caso seja necessário pegar um ônibus para chegar à seção eleitoral, é mais caro votar do que não votar.
A vereadora Bruna Rodrigues (PCdoB) encaminhou à presidência da Câmara Municipal um pedido de providência junto ao Executivo em caráter de urgência.
Na justificativa, argumenta que o custo de aproximadamente R$ 10 (somadas as passagens de ida e volta) faz com que “a população mais vulnerável, que mais precisa do Estado, que mais tem razão para escolher seus representantes, fique impossibilitada de exercer seu maior dever cívico”.
Já o vereador Leonel Radde (PT), em vídeo divulgado em redes sociais, atribuiu a medida à base governista de Melo que, segundo ele, “sabe que os mais pobres votarão pelo ‘fora Bolsonaro’ e contra os seus representantes” em cargos no Legislativo. Melo foi apoiado pelo bolsonarismo nas últimas eleições municipais.
Até dezembro passado, a prefeitura concedia passe livre — e arcava com os custos no sistema de transporte— até um limite de 12 datas, incluindo eleições, vacinação e um domingo por mês. Às vésperas das eleições, o prefeito citava a lei de 1995 para estabelecer, por decreto, as datas eleitorais como sujeitas ao passe livre.
Somados os dois dias das eleições presidenciais de 2018, o sistema de ônibus de Porto Alegre transportou cerca de 1,19 milhão de passageiros. O custo para os cofres municipais foi de R$ 2,5 milhões. Em 2020, durante a pandemia, aproximadamente 493 mil passageiros se deslocaram de ônibus nos dois dias das eleições municipais, a um custo de R$ 1,8 milhão. Porto Alegre tem 1.103.600 eleitores, conforme o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
A nova lei restringe a concessão de gratuidade a duas modalidades: uma para o feriado municipal de Navegantes (2 de fevereiro) e outra para campanhas de vacinação. Conforme o Diário Oficial, Porto Alegre só utilizou três datas até agora: além de Navegantes, aplicou em duas datas para campanhas de vacinação.
Questionada se existe a possibilidade de reverter a decisão até o próximo domingo por decreto do Executivo, a prefeitura disse que “a matéria é regulada por lei” e que “não tem no horizonte nenhuma medida em [sentido] contrário.” A secretaria de Comunicação Social salienta ainda que o fim da gratuidade não foi específico para estas eleições.
Questionada pelo vereador Matheus Gomes (PSOL) no Twitter, o perfil oficial da Prefeitura de Porto Alegre respondeu que a cidade “assim como outras capitais brasileiras” não teria passe livre. Escreve ainda que “o projeto tramitou na Câmara e nenhuma proposta de emenda foi apresentada para manter o passe livre no dia da eleições”.
Na verdade, duas emendas foram apresentadas com esse propósito, uma dos vereadores Gilson Padeiro (PSDB) e Moisés Barboza (PSDB) e outra das vereadoras Bruna Rodrigues (PCdoB) e Daiana Santos (PCdoB). Ambas ficaram de fora do texto aprovado.