Empresas de ônibus de Natal têm R$ 160 milhões na Dívida Ativa

Da Tribuna do Norte
Foto: Andreivny Ferreira (UNIBUS RN)

A crise no sistema coletivo de Natal, com o desequilíbrio financeiro alegado pelas empresas do transporte coletivo, que reduziram a frota em 60% e ameaçam diminuir ainda mais a quantidade de linhas e viagens, tem mais um agravante: os débitos dessas empresas já inscritos na dívida ativa do Município, do Estado e da União. Os R$ 160.350.820,03 devidos podem comprometer a participação na esperada licitação do sistema de transporte da capital e até impedir que tenham direito ao benefício da isenção do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), cujo projeto tramita na Câmara Municipal.

No levantamento feito pela TRIBUNA DO NORTE nos portais da Tributação de Natal (https://directa.natal.rn.gov.br/open.do?sys=DIR&a=wqf45tfes) e das Procuradorias Geral da Fazenda Nacional – PGFN (https://www.listadevedores.pgfn.gov.br/resultado) e do Estado do Rio Grande do Norte – PGE (http://divida.pge.rn.gov.br) não constavam débitos na dívida ativa de nenhum desses entes apenas para as empresas Transporte Cidade do Natal e Viação Cidade das Dunas. A Guanabara, Santa Maria e Reunidas têm dívidas apenas com o Município de Natal e as empresas Nossa Senhora da Conceição e a Transflor (Via Sul) devem também à União, com débitos relacionados ao não pagamento de tributos, multas trabalhistas, débitos previdenciários, entre outros ligados aos órgãos federais.

O levantamento foi atualizado na última quarta-feira (18), podendo já ter havido alteração nos valores. A que aparece mais endividada é a Via Sul, respondendo por 85,7% (R$ 137.508.733,7) do débito de todas as empresas juntas.

Somente ao Município as cinco empresas de ônibus têm R$ 56.387.993,20 inscritos na dívida ativa. O portal da Tributação não detalha a razão dos débitos, mas a inscrição na dívida ativa costuma se dar por falta de pagamento dentro do prazo de vencimento da cobrança de impostos, taxas, multas, indenizações, entre outros.

A inscrição na dívida ativa possibilita a cobrança judicial do débito, cabendo à Procuradoria Geral do Município (PGM) fazer essa cobrança. Porém, em Natal isso pode trazer implicações para as empresas que planejam participar do processo de licitação do sistema de transporte que permanece sem data para ocorrer.

Além disso, o Projeto de Lei 202/2022 que o prefeito Álvaro Dias encaminhou à Câmara Municipal para conceder isenção do ISS às concessionárias e permissionários de transporte público coletivo, também veda que empresas inadimplentes tenham direito ao benefício.

A partir pode surgir outro agravante, já que o objetivo do projeto é amenizar o impacto da crise financeira no sistema provocado pela queda do número de passageiros durante a pandemia da covid-19 e pelo aumento de custos como o dos salários dos funcionários e a alta do preço dos combustíveis. Essa forma de amenizar os prejuízos busca evitar que mais linhas sejam retiradas de circulação e a frota seja ainda mais reduzida, deixando a população ainda mais prejudicada.

O projeto já foi aprovado nas comissões de Justiça e de Finanças da Câmara e deve seguir para a Comissão de Transporte, que vai avaliar aspectos do mérito da proposta, inclusive o inciso I do primeiro artigo que menciona como condicionante “Encontrar-se, a partir de 1º de julho de 2022, o contribuinte beneficiário, em situação fiscal regular, comprovada através de Certidão Negativa de Débitos Municipais ou Certidão Positiva com Efeito de Negativa de Débitos Municipais”.

Com dívidas, empresas operam por força de liminares: O presidente da Comissão de Transportes da Câmara Municipal de Natal, vereador Milklei Leite (PV), disse que o fato de as empresas de ônibus operarem mesmo com dívidas milionárias sempre foi alvo de questionamento da comissão de transportes da Casa, inclusive já foi realizada audiência pública na Câmara para tratar o assunto com a participação do presidente do Seturn, Agnelo Cândido, Secretário de tributação Ludenilson Lopes e o secretário da STTU, à época, Paulo César.

“Descobrimos que a operação dessas empresas inadimplentes ocorre de forma tranquila por meio de liminares que o Seturn impetra na justiça, e a Secretaria de Tributação é obrigada a emitir certidão negativa ou positiva com efeito de negativa, para as empresa do transporte público por ônibus”, explicou o vereador.

Para ele, a inadimplência em todas as esferas é prejudicial porque, além do prejuízo aos cofres públicos, gera uma sensação de impunidade para a sociedade. “As atuais empresas operantes não possuem contratos vigentes de concessão do serviço público. Com isso, as obrigações dessas empresas só são cumpridas quando são convenientes ou viáveis para elas, enquanto o cidadão é penalizado com a falta do serviço que quando chega é de forma precária”, constata.

Uma das saídas apontadas é a licitação dos transportes, porém, a STTU ainda não definiu uma data para a abertura dessa licitação de transportes da capital, alegando as mudanças do mercado e aumento de custos que implicam na elaboração do certame. “Sou um dos maiores defensores na Câmara municipal da licitação do transporte público, pois entendo que só assim teremos um serviço justo e de qualidade para o povo. Contratos emergenciais só prorrogarão o atual problema e sustentarão por maior tempo essa inadimplência”, conclui o parlamentar.

Não é de hoje que a Câmara identifica irregularidades no serviço do transporte coletivo. Em 2015 uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) foi instalada no Legislativo Municipal para apurar se havia alguma relação de confluência de interesses entre a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (STTU) e o Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Natal (Seturn).

Durante o trabalho, os vereadores que formaram a CEI identificaram multas não pagas das empresas de ônibus. De acordo com informações repassadas à comissão pela STTU e pela Secretaria de Tributação do Município, as multas somavam R$ 11 milhões em dez anos, sendo que apenas R$ 26 mil tinham sido pagas e apenas R$ 700 mil estavam inscritas na Dívida Ativa. Além disso, R$ 6 milhões tinham prescrito e o restante estava em aberto.

Convocado a dar explicações, o presidente do Seturn, Agnelo Cândido, disse na ocasião que a soma das multas demonstravam uma “perseguição do Município contra as empresas” e que as empresas eram multadas até quando os motoristas paralisavam suas atividades em greve. “Num único dia em que pararam nós recebemos 20 mil multas e fizemos a nossa defesa. O que entendemos ser justo, pagamos, o que achamos que está irregular, recorremos”, disse aos parlamentares.

O relatório final da CEI foi enviado para outras instituições fiscalizadoras como o Ministério Público e o Tribunal de Justiça.

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