Orçamento para investimentos em transporte é o menor em duas décadas

Do O Estado de SP
Foto: Isac Nóbrega/PR

O ano de 2021 já entrou para a história da infraestrutura como o pior período de investimentos públicos na área de transportes nas duas últimas décadas. Nunca o governo federal investiu tão pouco em estradas federais, portos, aeroportos e ferrovias. A situação grave, aprofundada pelo rombo nas contas públicas, encontra alguma reação nas concessões que são feitas ao setor privado. Ocorre que nem tudo interessa a empresas, mas apenas aquilo que pode render lucro. Restam, assim, 55 mil quilômetros de estradas federais que, na melhor das hipóteses, terão dinheiro neste ano para tapar alguns buracos. Nada mais.

São os dados públicos e oficiais que revelam um cenário agonizante. A Confederação Nacional do Transporte (CNT) fez um levantamento dos aportes feitos exclusivamente pelo governo na malha de transporte do País, em todos os seus modais, desde 2001, a partir do sistema Siga Brasil. Os dados, então, foram corrigidos pela inflação a valores atuais, para evitar distorções e demonstrar, efetivamente, qual é a capacidade atual de investimento público no setor e compará-la aos anos anteriores.

Em 2021, depois de todo o imbróglio em torno do Orçamento da União, o que sobrou para investimentos em transportes foram R$ 7,4 bilhões. Para se ter uma ideia do que isso significa, esse volume é 17,7% do aporte público injetado no setor em 2012, quando o governo, em valores corrigidos até hoje, separou nada menos que R$ 41,8 bilhões (R$ 25 bilhões, em valores daquele ano) para investimentos em logística.

Na comparação do orçamento deste ano com o Brasil de 2001, o setor receberá menos da metade do que recebeu 20 anos atrás, quando contou com o equivalente a R$ 15,5 bilhões.

“Entendemos a relevância de ampliar concessões para minimizar esse problema e vemos esforço do Ministério da Infraestrutura em tentar mudar a situação, mas o cenário é crítico. Temos um orçamento raquítico que passa a prejudicar País”, afirma Bruno Batista, diretor executivo da CNT. “Sabemos que o momento é difícil em todos os setores, mas é importante notar que falta uma noção clara de política de investimentos para a infraestrutura. Essa redução drástica é uma aposta pouco inteligente do ponto de vista do investimento.”

Um ano antes de o presidente Jair Bolsonaro assumir o Palácio do Planalto, o governo havia dedicado, em 2018, R$ 11,1 bilhões ao setor. Em seu primeiro ano de governo, essa cifra caiu para R$ 10,1 bilhões. No ano passado, fechou em R$ 10,6 bilhões. Neste ano, finalmente, conta apenas com R$ 7,4 bilhões.

Com esse recurso em caixa, o poder de atuação do governo vai limitar, basicamente, a fazer operações de conservação em estradas federais, sem incluir manutenções mais ambiciosas ou projetos de ampliação de capacidade, pavimentação ou duplicação. Só o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), órgão do Ministério da Infraestrutura responsável por contratar essas obras federais, precisa de mais de R$ 6 bilhões por ano para fazer os serviços básicos de conservação nos 55 mil km de estradas. Ocorre que não há só estradas pelo caminho. É preciso cuidar ainda de hidrovias, portos, aeroportos públicos e obras ferroviárias.

Concessões. O ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, reconhece as dificuldades e a limitação de mudar o cenário. “Temos um dos piores orçamentos neste ano, de fato, mas estamos buscando formas de reagir. Estou focando muito na transferência de ativos para a iniciativa privada, correndo ao máximo com as concessões, porque é isso que vai dar algum sossego”, afirmou à reportagem. “Como o orçamento atrasou muito neste ano, alguns projetos não foram tocados ainda. Então, devemos ter alguma sobra em dois meses, para priorizar alguns projetos. Vamos fazer um esforço danado para sobreviver.”

Entre os empreendimentos que, segundo Tarcísio, não podem parar estão obras como as que estão em andamento na BR-101 na Região Nordeste, na BR-116 no Rio Grande do Sul e em trechos ferroviários da Ferrovia de Integração Oeste-leste (Fiol), empreendimento tocado pela estatal Valec na Bahia, que teve parte de seu traçado concedido no mês passado.

A aposta em concessões é importante, mas não se trata de um remédio de efeito rápido. O histórico do setor mostra que um projeto de concessão demora, na melhor das hipóteses, dois anos para ser concluído, entre etapas de licenciamento, modelagem financeira e efetiva realização de leilões, para só então começar a receber recursos.

A expectativa do setor é de que haja algum “espaço político” no Congresso para recompor parte do orçamento com emendas parlamentares. “Na maior parte dos países, o indutor da malha de transporte é o investimento público. É preciso começar a dar o peso e a importância necessária para essa questão do transporte. Essa situação é uma tragédia para todo o País”, diz Bruno Batista, da CNT. “Os impactos da baixa qualidade acabam sendo pagos pelo consumidor. Isso tudo vai para a prateleira, não tem como escapar.”

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