Do Portal NTU
Foto: Ascom/Dircas/Conder – Fotos Públicas/Ilustração
Por Luis Antonio Lindau, diretor do programa de Cidades do WRI Brasil
Luis Antônio Lindau, diretor do programa de Cidades do WRI Brasil: “Carros por aplicativo, bicicletas, patinetes, serviços de entrega e acessos a garagens competem pelo mesmo espaço entre as calçadas e o leito carroçável, tradicionalmente utilizado para estacionamento e circulação de veículos.”
No século passado, engenheiros de tráfego tinham como objetivo conformar o ambiente viário urbano para acomodar o crescimento exponencial dos carros privados. A então busca pelo aumento da capacidade viária — que em prol do carro consumiu até o espaço dos pedestres nas calçadas — cedeu lugar à necessária compatibilização da circulação de modos com características muito diversas.
O meio-fio é um recurso escasso e em disputa. Carros por aplicativo, bicicletas, patinetes, serviços de entrega e acessos a garagens competem pelo mesmo espaço entre as calçadas e o leito carroçável, tradicionalmente utilizado para estacionamento e circulação de veículos. A gestão conjunta desses múltiplos usos é um desafio inadiável nos grandes centros urbanos.
Enquanto no Brasil a substituição do estacionamento junto ao meio-fio por usos como faixas para ônibus ou bicicletas ainda gera polêmica, algumas cidades passam a tratar das múltiplas vocações do espaço, com a premissa que vale tanto lá quanto aqui: garantir prioridade, fluidez e atratividade aos modos mais sustentáveis de transporte.
Toronto (Canadá) desenvolveu um plano estratégico para gestão do meio-fio. Washington DC, San Francisco e Chicago (EUA) têm implementado zonas específicas de embarque e desembarque, apelidadas de PUDOs (pick-up/drop-off zones), geralmente em avenidas e locais com grande fluxo de pessoas. As experiências mostram sinais positivos, contanto que empresas de carros por aplicativos respeitem essas áreas.
Sobre as calçadas, é preciso regramento para patinetes e bicicletas compartilhadas, tal como o cercamento eletrônico de áreas destinadas para a estocagem desses veículos. Transferir para as calçadas o que se quer tirar da via — sejam áreas de embarque e entregas ou as próprias ciclofaixas — pode tornar mais precária a circulação do pedestre.
O pior cenário de uma avenida é o que permite carros estacionados de um lado do meio-fio, transportando zero pessoas, e uma calçada estreita e com pavimento inapropriado do outro. Infelizmente, é o que ainda predomina nas nossas cidades. O melhor é o que atende os preceitos da Lei de Mobilidade, que determina a priorização dos transportes ativo e coletivo sobre o individual motorizado. Esse cenário contempla calçada adequada e ciclofaixa que, além da bicicleta, consegue abrigar as inovações da micromobilidade.
A crescente demanda pelo uso de aplicativos e o aumento dos serviços de entrega torna urgente o regramento do uso do meio-fio e das calçadas. Não apenas para acomodar as inovações do presente e do futuro, mas para corrigir equívocos passados, redirecionando a prioridade, antes conferida aos veículos particulares, para o transporte coletivo e ativo.
Matéria publicada na Revista NTUrbano Ed. 42 Novembro/Dezembro de 2019