Do PORTAL UNIBUS
Foto: Andreivny Ferreira (PORTAL UNIBUS)
Um estudo técnico produzido pelo Instituto Jevy Cidades aponta que a cidade de Natal tem condições financeiras para implantar a tarifa zero no transporte público, com impacto estimado de apenas 3% sobre a receita anual da prefeitura. Isso representaria um custo de aproximadamente R$ 158,7 milhões por ano — valor considerado viável diante do orçamento da capital potiguar.
A estimativa faz parte do programa Mobiliza Tarifa Zero, desenvolvido pelo Jevy Cidades, organização fundada pelo especialista em mobilidade urbana Giancarlo Gama. A iniciativa tem como foco apoiar cidades brasileiras na transição para um modelo de transporte público gratuito, com base em justiça climática, inclusão social e sustentabilidade financeira.
Os dados foram publicados em reportagem assinada pelo jornalista Everton Dantas, do portal Novo Notícias.
O estudo sobre Natal foi elaborado a partir de uma metodologia que leva em consideração o modelo adotado por cidades brasileiras que já implementaram a gratuidade total ou parcial no transporte. Nesses casos, a remuneração às empresas operadoras ocorre por quilômetro rodado — e não por número de passageiros —, o que garante maior previsibilidade financeira, qualidade no serviço e gestão mais eficiente dos recursos públicos.
“Natal vive um cenário de crise semelhante ao de outras capitais brasileiras. Se nada for feito, o sistema vai colapsar. É o que chamamos de ciclo vicioso da tarifa: a queda no número de passageiros provoca aumento na tarifa e redução da qualidade, o que afasta ainda mais os usuários”, alerta Giancarlo Gama. Para ele, a implantação da tarifa zero pode quebrar esse ciclo e reposicionar o transporte público como política essencial de mobilidade urbana e inclusão social.
A proposta apresentada pelo Instituto considera ainda a ampliação da frota e a melhora da qualidade do serviço, com foco nas regiões periféricas da cidade, atualmente com baixo acesso ao transporte público. Para Gama, não há barreiras técnicas ou financeiras intransponíveis: o que falta, segundo ele, é vontade política.
“Assim como foi possível criar o Sistema Único de Saúde, é possível fazer um sistema de transporte gratuito. Já existem mais de 100 cidades brasileiras com tarifa zero. O Brasil é hoje o país com maior número de cidades com essa política no mundo”, afirma o especialista. Ele destaca que grandes cidades como Teresina (PI), Santo André (SP) e até o Rio de Janeiro discutem modelos semelhantes, e que Belgrado, na Sérvia, com mais de 1 milhão de habitantes, já opera com transporte gratuito.
Um exemplo de comparação direta está no próprio orçamento de Natal: segundo relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RN), a minuta do edital da nova licitação do transporte público poderia representar desperdícios de até R$ 281,6 milhões. O valor equivale a quase o dobro do necessário para implantar o sistema de tarifa zero.
Além do impacto positivo para os usuários, a política de transporte gratuito pode funcionar como vetor de desenvolvimento econômico, fortalecendo o acesso a direitos como saúde e educação. “Se eu tenho que pagar para ir ao médico ou à escola, não estou tendo meu direito plenamente garantido. A tarifa zero é investimento, não custo”, defende Giancarlo.
A Jevy Cidades atua nacionalmente no apoio técnico a municípios interessados em modernizar o sistema de transporte coletivo. Fundado por Giancarlo Gama, cientista político pela USP e mestre em Políticas Públicas pela Universidade de Oxford, o instituto desenvolveu um manual de implementação da tarifa zero após visitas técnicas a cidades brasileiras e europeias — incluindo Tallinn (Estônia) e Belgrado (Sérvia), que são referências internacionais na gratuidade do transporte.
Em Natal, o estudo foi realizado com apoio do mandato da vereadora Brisa Bracchi (PT), que participou do programa Mobiliza Tarifa Zero e articula o debate dentro do Legislativo municipal. A expectativa do Jevy é que o material técnico sirva como ponto de partida para uma discussão mais ampla sobre o futuro da mobilidade urbana na capital potiguar.