Passageiros e motoristas relatam rotina de medo nos ônibus do Grande Recife

Do PORTAL UNIBUS
Foto: Reprodução (MR Films)

Uma tentativa de assalto ocorrida na Avenida Domingos Ferreira, no bairro de Boa Viagem, zona sul do Recife, terminou em violência e expôs com brutalidade a insegurança enfrentada diariamente por quem depende do transporte público. A vítima, um enfermeiro de 49 anos, foi esfaqueada diversas vezes na cabeça dentro de um ônibus da linha 440 CDU-Caxangá, após reagir à ação de dois criminosos que tentavam roubar seu celular. O crime, registrado na última semana, aconteceu por volta das 20h13, horário considerado o mais perigoso para usuários do sistema, segundo dados oficiais.

De janeiro a abril de 2025, foram contabilizados 52 assaltos a ônibus na Região Metropolitana do Recife, segundo levantamento da Gerência Geral de Análise Criminal e Estatística (GGACE) da Secretaria de Defesa Social (SDS) divulgado pelo jornal “Diário de Pernambuco”.

Apesar de representar uma queda superior a 25% em relação ao mesmo período de 2024, quando ocorreram 70 registros, o número ainda revela a persistência de um cenário alarmante. A maior parte dos crimes, 31 casos, ocorreu no turno da noite e madrugada. No ano anterior, do total de 229 assaltos a ônibus registrados, 176 aconteceram nesses horários.

A violência não se restringe aos passageiros. Motoristas e cobradores também relatam viver sob constante tensão. A motorista Gilvanusa Alves da Silva, de 56 anos, atua no setor há 22 anos e diz já ter passado por 16 assaltos, o mais recente deles no último dia 20, quando um criminoso invadiu o ônibus que ela conduzia na Avenida Agamenon Magalhães, no Derby, e roubou um colar de um passageiro, que caiu e fraturou a clavícula ao tentar recuperar o objeto. Ela prestou queixa e acionou o Samu. Gilvanusa também relatou um episódio anterior em que foi agredida após impedir que seis jovens embarcassem de forma irregular. Eles apedrejaram o coletivo e uma pedra atingiu seu rosto, exigindo atendimento hospitalar.

O motorista Alexandre Gomes, de 47 anos, também foi alvo da violência no mês passado. Ele saía do Terminal Integrado Joana Bezerra com destino ao TI Xambá quando um homem, fingindo ser passageiro, anunciou um assalto e levou seu celular. Alexandre relata que o criminoso agiu com frieza e o abordou diretamente, afirmando que “só queria a renda”.

Além dos crimes dentro dos ônibus, os arredores das paradas também são considerados perigosos. De janeiro a abril de 2025, foram 111 casos de roubos a transeuntes nesses locais, uma leve queda em relação ao mesmo período de 2024, que registrou 113 ocorrências. No acumulado do ano passado, foram 363 roubos desse tipo. O cenário leva muitos motoristas a temer paradas em pontos considerados inseguros. Ainda que exista uma norma do Grande Recife que proíba “queimar parada”, o presidente do Sindicato dos Rodoviários de Pernambuco, Roberto Carlos, ressalta que, diante de uma ameaça à integridade física, o condutor deve priorizar a segurança.

O sindicato também observa que o alvo dos criminosos mudou. Atualmente, os assaltantes preferem roubar pertences dos passageiros, como celulares, em vez de buscar a arrecadação do coletivo. “Os bandidos migraram para dentro do ônibus. Não é mais pelo dinheiro do caixa. É pelos celulares”, pontua Roberto Carlos, ao Diário de Pernambuco.

A sensação de insegurança é reforçada por relatos de quem utiliza o transporte todos os dias. A agente de call center Eduarda Soares, de 27 anos, trabalha no centro do Recife e afirma ter presenciado dois assaltos com colegas de empresa em menos de um mês. Um deles envolveu uma funcionária que teve o celular roubado e cuja namorada foi agredida ao tentar reagir. No outro, uma arma branca foi usada para intimidar a vítima. Eduarda e colegas passaram a antecipar o retorno para casa como forma de evitar os horários mais críticos.

Na Avenida Guararapes, a equipe de reportagem do jornal “Diário de Pernambuco” encontrou passageiros usando mochilas na frente do corpo, celulares guardados e semblantes de apreensão. Elaine Cristina, de 35 anos, também agente de call center, afirma que já presenciou cerca de 10 assaltos nos dois anos em que trabalha no centro. “A gente fica com medo. Aqui falta policiamento”, desabafa.

Como resposta, a Secretaria de Defesa Social (SDS) menciona a atuação da Operação Transporte Seguro, que realiza abordagens em coletivos e terminais, além da Operação Medina, voltada ao combate de vandalismo e “surf” em ônibus. Também há uma Força-Tarefa específica para crimes em coletivos. Segundo a SDS, dos 570 mil deslocamentos mensais do Sistema de Transporte Metropolitano, 46 resultaram em registros de roubo em abril de 2024, número que caiu para 30 no mesmo mês de 2025.

Apesar disso, o presidente do sindicato insiste na necessidade de medidas mais efetivas, como o retorno das blitz de abordagem a veículos. “Funcionava. A gente sabia quem tinha mandado de prisão. Era um filtro necessário”, afirma Roberto Carlos, reforçando o apelo por ações mais firmes para garantir segurança a trabalhadores e passageiros.

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