Por Agora RN
Foto: Matheus Felipe
Membros da Comissão de Transportes da Câmara Municipal de Natal cobram a licitação do transporte público. O posicionamento dos vereadores acompanha a posição do Sindicato das Empresas de Transportes Urbanos (Seturn), que informou que irá protocolar uma ação no Tribunal de Contas do Estado (TCE) pedindo a publicação da licitação.
A licitação do transporte de Natal se arrasta há mais de 10 anos, sem resolução. O presidente da Comissão de Transporte, vereador Milklei Leite (PV), disse ao AGORA RN que o grupo já cobrou diversas vezes um avanço por parte da Prefeitura do Natal. “Só iremos resolver o problema de transporte se houver a licitação, porque haverá normas e fiscalização. Até lá, é só enxugar gelo”, pontuou.
O parlamentar acredita que o Município precisa de mais agilidade no processo. “O Município está tentando. Participei de muitas reuniões junto à STTU [Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana], mas está muito lento e já era para estar encaminhada a questão da licitação. Já era para ter concluído o estudo, até porque a gente já sabe qual é o problema do transporte”, disse.
O estudo citado pelo vereador é um contratado no ano passado pela Prefeitura junto à Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), com o objetivo de apresentar soluções para atendimento das áreas desassistidas por causa de linhas devolvidas pelas empresas desde o início da pandemia. O levantamento, porém, ainda não teve resultado divulgado.
Assim como o Seturn, Milklei também defende o fornecimento de subsídios financeiros para melhorar a qualidade do serviço. “Não sei exatamente valores, mas o subsídio precisa existir porque várias cidades do Brasil fazem isso, justamente por causa das gratuidades e meias passagens. Temos que investir no transporte público para ter mobilidade de qualidade”.
Eribaldo Medeiros (PSB), que também é membro da comissão, esclarece que é dever do Executivo enviar o projeto de licitação à Câmara. “As empresas precisam, sim, que os governos federal, estadual e municipal subsidiem as meias passagens dos estudantes e a gratuidade dos idosos”.
O vereador teceu críticas ao sistema de transporte da capital potiguar. “Nós temos um dos piores transportes do Brasil, completamente sucateado, estamos perdendo linhas e a população sofrendo”, disse ele. “Me parece que o governo não tem interesse em fazer a licitação. Há uma insegurança jurídica muito grande, as empresas de ônibus estão trabalhando na clandestinidade”, continuou.
Outro membro da comissão, vereador Anderson Lopes (Solidariedade), afirmou que a licitação é uma das ferramentas que vai ajudar a melhorar o sistema de transporte público. “Antes, as empresas não tinham interesse na licitação, mas, agora, a situação do transporte piorou tanto que até as empresas querem que a licitação aconteça. Eles estão tendo prejuízos e sabem que esta ferramenta pode ajudá-los não só a melhorar a qualidade do sistema, como também contribuir para a retomada do lucro”.
O subsídio financeiro, que já é uma realidade em algumas capitais brasileiras, ajuda a baratear o valor da passagem. “Para fazer o sistema funcionar de forma satisfatória, será preciso investimento. E é claro que esse investimento não pode sair do bolso do usuário, pois o custo da passagem já é alto para nossa realidade. Esse investimento também não vai cair só sobre os empresários. Por isso, o subsídio é a saída mais coerente e viável. Esta é uma pauta importante, necessária e que precisa da união da nossa bancada federal para ser viabilizada”, defendeu Anderson.
Sobre a licitação, Anderson Lopes concorda que o processo segue de forma lenta. “Há anos se arrasta e por várias gestões. Como tenho falado várias vezes na tribuna da Câmara, eu espero que o prefeito Álvaro Dias tenha interesse em fazer essa licitação sair do papel porque até politicamente seria um feito histórico para sua gestão”.
Além da licitação e do subsídio financeiro, o vereador defende que a ferramenta mais importante é um plano de mobilidade urbana que destrave o trânsito em trechos que apresentam picos de congestionamentos diários. “Com essas ferramentas, Natal poderá finalmente avançar para melhorias”, observou.
“Temos que abrir a caixa preta do sistema de transporte”
Assim como os colegas parlamentares, o vereador Daniel Valença (PT) defende que a licitação é dever legal. “Sempre defendemos que fosse realizada. Agora, em diversas ocasiões, o Seturn defendeu que direitos de passageiros, estabelecidos em lei, sejam retirados para que as empresas participem do processo licitatório. Queremos sim a licitação, mas não a queremos de qualquer forma. É preciso que os direitos das usuárias e dos usuários sejam respeitados e que se garanta, concretamente, um serviço melhor, não a legalização de um serviço ruim”.
Também membro da Comissão de Transportes da CMN, o vereador alega que o transporte coletivo deve receber subsídios. “O poder público tem papel fundamental no fomento do transporte coletivo, criando políticas que o priorizem. Quanto melhor o transporte coletivo, menor a quantidade de carros nas ruas, o que diminui os congestionamentos, a poluição e até o número de acidentes. O problema é que o Seturn se nega a agir de forma transparente em relação aos dados e custos operacionais. Dizem, desde sempre, que as empresas vão falir, mas jamais mostram, de forma objetiva, as planilhas de gasto e de lucro. Não por menos se fala tanto na ‘caixa-preta’ do Seturn”, disse.
E continuou: “Como defender subsídios com verbas públicas, que devem ser acompanhadas com o máximo de zelo, para um setor que nega transparência? Se perguntarmos ao trabalhador se ele acha que as empresas de ônibus, que prestam de maneira péssima um serviço tão importante, devem receber ainda R$ 3 milhões, sem dúvidas que a resposta será não”.
Para o vereador, o prefeito Álvaro Dias (Republicanos) não age em relação ao transporte. “Em sua mensagem anual ao Legislativo, o prefeito sequer tocou na ideia de licitação. Ele não falou em transporte público, um dos maiores problemas que historicamente a cidade do Natal enfrenta. Chegou a dizer que não tem culpa pelo caos instalado, jogando a responsabilidade em seus antecessores. Ora, todos sabem que o sistema de transporte público em Natal sempre foi muito ruim, mas a piora da pandemia nos dias atuais é profunda”, frisou.
Segundo ele, “a responsabilidade da situação é de Álvaro Dias, mas também das empresas que buscam preservar seus lucros sem melhoria alguma para os usuários. O desaparecimento das linhas, por exemplo, tem a conivência da STTU, mas é derivado de ações do Seturn, que quer apenas os trajetos de maior lucro”.
Daniel Valença acompanha Anderson Lopes ao defender um plano de mobilidade urbana. “Temos que abrir a caixa preta do sistema de transporte. Não dá para não termos transparência máxima sobre qual o lucro das empresas versus a qualidade do serviço ofertado. Outro passo central é a realização da licitação, e que ela seja abrangente ao passo de possibilitar a participação de empresas de todo o país. Fundamental, também, romper com a tradição de que o Seturn diz como vai prestar o serviço de transporte. É o Estado e não a iniciativa privada quem deve gerir o sistema de transporte”.
“A secretária de mobilidade [Daliana Bandeira] sequer sabe quando as empresas mudam os itinerários ou extingue linhas. Além disso, acreditamos na viabilidade de a gestão municipal agir para a criação de uma empresa pública de transporte coletivo. Porto Alegre, João Pessoa, várias capitais apresentam boas experiências neste sentido. Por fim, colocaria em pauta também a tarifa zero. Já realidade em outras cidades, ela permitiria uma revolução em termos de mobilidade urbana. Não há solução fácil para um problema complexo, mas não podemos continuar penalizando usuárias e usuários de um serviço essencial para a coletividade da população natalense”, listou Daniel Valença.