Por UNIBUS RN, em parceria com o site michaelpontes.com.br
Foto: Antonio Augusto (Secom TSE / Flickr)
Matéria atualizada em 25/09/2022, 11:00, para correção de informações
No dia 02 de outubro, será realizada mais uma eleição geral em todo o Brasil. Dentre os cargos em disputa, está o de governador – 27 serão eleitos neste ano. Um dos cargos em disputa é o de governador do Rio Grande do Norte, com nove candidatos disputando o comando do Centro Administrativo.
Dentre os diversos serviços que o governo de um estado precisa gerir, está o transporte público de passageiros. No caso potiguar, o governo é responsável pelo transporte intermunicipal, feito por ônibus e micro-ônibus – esta última categoria, operada por veículos do sistema opcional.
Porém, o transporte público não parece ser uma preocupação iminente de quem deseja comandar o RN a partir de 1º de janeiro de 2023. Levantamento feito pelo blog do jornalista Michael Pontes, da rádio Santa Rita FM, de Santa Cruz, em parceria com o UNIBUS RN, revelou que nenhum dos nove postulantes ao cargo de governador registrou propostas para a área de transporte de passageiros em seus programas de governo.
O levantamento teve como base os programas de governo enviados pelos competidores ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ao solicitarem o registro de suas candidaturas. O programa de governo é um documento obrigatório para as campanhas e é de acesso público no site do tribunal.
A pesquisa não identificou nenhuma ação que pode ser implementada por quem vença o pleito em qualquer área do transporte de passageiros, seja ela rodoviária ou ferroviária. Também não foi identificada alguma proposta de integração com sistemas de transporte público das maiores cidades do estado – Natal, Mossoró, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante.
“Se não há nenhuma proposta dos candidatos ao governo na área de transporte, acredito que, não havendo atenção devida e propostas concretas para a melhoria do transporte intermunicipal, vai haver maior precarização do sistema. Consequentemente, vai continuar acontecendo o cenário atual, com mais falências de empresas de ônibus”, avalia o engenheiro Flávio Dantas, especialista em transporte público.
Para Flávio, se a falta de ações para o transporte público se mantiver, o cenário atual de crise pode perdurar por mais tempo, trazendo ainda outro problema. “É notório que existe demanda [de passageiros]. Mas, se não há incentivos do governo, não há estudos ou projetos para que se melhore o transporte intermunicipal, é o cenário ideal para o crescimento do transporte clandestino. Com as empresas deixando de operar, devido a questões econômicas, o passageiro não terá outra alternativa a não ser se arriscar com os operadores irregulares. Pois, demanda existe”, diz.
Entretanto, a falta de propostas de quem quer governar pode configurar uma oportunidade perfeita para alguma melhoria no sistema. “Penso que [a falta de propostas] não é ruim. Na verdade, considero que os governos deveriam deixar o serviço ser prestado de modo privado, fazendo apenas o básico, retirando os impostos, como o que já aconteceu com a isenção do ICMS do diesel e que falta sobre o veículo, e apenas definir indicadores de desempenho”, avalia Rubens Ramos, mestre em engenharia de transportes e professor titular do Departamento de Engenharia Civil da UFRN. “[Tem que] dar liberdade empresarial. A meu ver, o excesso de intervenção governamental é um dos fatores de base de nossos problemas. Está mais do que na hora do transporte coletivo voltar à sua essência, um serviço privado ofertado à sociedade, sem a rigidez e as amarras de serviço público”, completou.
O transporte intermunicipal do Rio Grande do Norte passa por uma crise sem precedentes. Dezenas de linhas foram devolvidas, várias cidades do interior estão sem atendimento de transporte público e a operação de loteiros, que operam as rotas ilegalmente com veículos de menor porte, ocorre por todo o estado, tendo pouca – ou nenhuma – fiscalização nas cidades e nas estradas. Isso sem contar com a crise econômica causada pela perda de passageiros após a decretação da pandemia de COVID-19, fragilizando a situação de empresas de ônibus a tal ponto que, só em 2022, duas companhias encerraram suas atividades.
O que o especialista faria
Ouvido pelo UNIBUS RN, Rubens Ramos, uma das principais referências em engenharia de transportes a nível nacional e principal nome do segmento no meio acadêmico atuando em solo potiguar, indicou três sugestões que faria aos candidatos para que o usuário do transporte público tenha acesso a um melhor serviço.
“Primeiro: Deixar de querer mandar em tudo. Acabar essa ilusão de que governo pode planejar melhor que o mercado, e apenas definir metas de desempenho”, diz Rubens, explicando que conceder liberdade empresarial e de tarifa pode trazer um serviço de melhor qualidade para o usuário. “Não há o que temer. O serviço de Uber, por exemplo, já impõe limites a preços abusivos”, completa.
O segundo ponto defendido pelo professor é uma espécie de reforma tributária, uma vez que esses encargos acabam sendo pagos, na conta final, pelos passageiros. “Cabe manter a isenção do ICMS sobre energia (hoje no diesel, amanhã na energia elétrica), ampliar a isenção do ICMS para o veículo (hoje [a empresa] paga imposto) e manter a isenção do ISS. Das três isenções, já temos duas, que tem que ser mantidas e ampliadas para o veículo”, completa Rubens.
A terceira ação sugerida por Ramos é a concessão de subsídios no sistema. Essa concessão, porém, nas palavras do acadêmico, funcionaria se for concedida apenas a quem realmente precisa. “Se idoso tem gratuidade, então dê um ‘passe idoso’, pagando-se por ele. Se o estudante tem meia passagem ou passe livre, se dê um ‘passe estudante’, também se pagando por ele. Se portadores de deficiência tem gratuidade, se dê um passe para esses casos. E para aqueles que tem menor capacidade de pagar, devido à renda, se crie um ‘passe social’”, explica.
Ainda em relação aos subsídios, Rubens Ramos critica o modo como gestores públicos aplicaram a medida, destinando esses descontos para as empresas de ônibus em vez dos passageiros. “Penso que o caminho é subsidiar os usuários, não as empresas. Subsidiar as empresas distorce a oferta: Torna ela excessiva, torna os empresários e gestores acomodados”, diz. Para o professor, o subsídio ideal é aquele concedido aos passageiros. “Subsidiar os usuários mantém uma lógica de mercado e de demanda. Vai se subsidiar quem quer usar, quem realmente demandar o serviço”, completa.
Propostas empresariais
Aproveitando o momento de campanha política, a FETRONOR, entidade que representa as empresas de ônibus em nível nordestino, entregou aos principais candidatos ao Governo do RN a chamada “Carta de compromisso com o transporte”, que é uma série de demandas e pedidos dos empresários do transporte no Rio Grande do Norte.
O conteúdo da carta envolve temas como o combate ao transporte clandestino; implantação de subsídios para o Setor; manutenção e ampliação da isenção de impostos; e melhoria na infraestrutura das rodovias estaduais e das rodoviárias administradas pelo Governo do Estado.
A carta foi entregue aos candidatos mais bem colocados nas últimas pesquisas de intenção de votos divulgadas pela imprensa.
Tentativa anterior de organização
Em 2017, o Governo do Estado chegou a fazer reuniões visando uma futura licitação do transporte interurbano (Grande Natal) e do transporte intermunicipal. Em um primeiro momento, seriam licitadas as linhas que não estavam sendo exploradas pelos motivos de caducidade, cancelamento, ou desistência das empresas pela sua operação, além das linhas que estavam com autorização precária – ou seja, havia uma empresa operando a linha, mas de forma temporária devido à desistência da exploração por parte de alguma outra empresa.
Nesta lista constam linhas do sistema alternativo e do sistema regular, operadas por ônibus, como por exemplo as linhas Natal / Santa Cruz, Natal / Afonso Bezerra e Natal / Touros (Via RN-064) do sistema alternativo, as linhas Natal / Martins (Via BR-304), Natal / Parelhas (Expresso), Natal / Nova Cruz (Via Canguaretama) do sistema regular por ônibus, além das linhas com autorização precária, como, por exemplo, as linhas 134 (Natal / Ceará Mirim – Via Ribeira), Natal / Sitio Novo e algumas linhas metropolitanas atualmente operadas pela empresa Trampolim da Vitória (I, M, G, S, R).
Ao todo, seriam licitadas 16 linhas com autorização precária e mais 87 linhas entre caducas, extintas ou devolvidas ao DER. Porém, essa ação não teve prosseguimento.
Já em agosto do ano passado, o governo do Estado renovou a concessão da licença de operação de várias linhas do transporte opcional metropolitano e intermunicipal. Chegou-se a anunciar que ocorreria a licitação do sistema de transporte regular, mas não foi indicado algum prazo para isso. Desde então, nenhum edital foi lançado.