PE: Oito anos depois, governo de Pernambuco refaz licitação das linhas de ônibus do Grande Recife

Do Jornal do Commercio (Via Coluna Mobilidade)
Foto: Rafael Fernandes (Gentilmente cedida ao UNIBUS RN)

Lá vamos nós mais uma vez. Oito anos depois, o governo de Pernambuco vai refazer a licitação das linhas de ônibus em operação na Região Metropolitana do Recife, o famoso STPP (Sistema de Transporte Público de Passageiros da RMR), que responde pela grande maioria dos deslocamentos urbanos do Grande Recife.

Será um pacote de R$ 15,3 bilhões em 20 anos de contrato – renováveis por mais cinco anos -, dos quais R$ 2,9 bilhões serão de contraprestações do poder público (subsídios), R$ 2,2 bilhões serão investimentos e R$ 12,4 bilhões serão referentes a tarifas e receitas acessórias, como ganhos com publicidade e outras receitas extra tarifárias, por exemplo. Por ano, será o equivalente a R$ 146 milhões em subsídios públicos e R$ 76.730 milhões em investimentos privados.

PPP no lugar de concessão comum: A maior diferença, segundo o governo de Pernambuco, será em relação ao modelo de contrato adotado até agora. Não será uma concessão comum, mas uma Parceria Público Privada (PPP), o que, na visão do Estado, garantirá recursos para o transporte público.

Hoje, embora o STPP venha recebendo subsídios públicos de pouco mais de R$ 200 milhões – começou com os dois lotes concessionados -, não é um recurso carimbado, certo no orçamento do governo.

“Isso vai mudar e a nossa estimativa é de um subsídio anual de R$ 150 milhões para os três lotes.Os contratos serão PPPs e não uma concessão comum. Estamos reconhecendo que a operação precisa de aporte financeiro público e estaremos carimbando recursos do orçamento do Estado para o setor. Esse recurso virá do FPE (Fundo de Participação dos Estados)”, explica o secretário-executivo de Parcerias e Estratégias da Secretaria de Planejamento de Pernambuco (Seplag), Marcelo Bruto.

O valor de subsídio estimado para os três lotes – as duas concessionárias já em operação, que atualmente ficam com R$ 90 milhões do total de subsídios, não estão incluídas – teve como base a rede básica de setembro de 2021. “O Estado coloca mais de 200 milhões por ano no STPP, mas considerando os dois lotes já licitados. Esse novo valor de subsídio será apenas para os três lotes da nova licitação”, reforça o secretário.

Melhoria do serviço: Segundo explica o Estado, a melhoria do serviço virá com a mudança no modelo de remuneração dos operadores, que passará a ser feita, também, pela demanda de passageiros – uma forma de o operador ir buscar o cliente, o que o forçará a melhorar o serviço.

A alteração da demanda do IPK – Índice de Passageiro por Quilômetro – de até 3%, o ganho ou a perda são do concessionário de cada lote. Entre 3% e 5%, o ganho/perda será do poder concedente (Estado) no percentual de 75%. Entre 5% e 10%, esse percentual do Estado subirá para 90%. Enquanto que, acima de 10%, o ganho ou a perda será totalmente do Estado.

“Quanto maior esse indicador (o IPK), maior é a produtividade do serviço de transporte, ou seja, quanto mais passageiros forem transportados com menos quilometragem, melhor. Atualmente, o pagamento é feito só pelo passageiro transportado. Se cai a demanda, o operador reduz o serviço. Deixamos um risco de 3% para estimular que vá atrás do passageiro. O princípio é não deixar a queda do passageiro bater no operador para evitar que reduza o serviço”, explica Marcelo Bruto.

Audiência pública e inovações: A proposta, que será submetida a uma audiência pública no dia 31/5, online pelo Youtube do governo de Pernambuco e está aberta a sugestões até o dia 13 de junho, tem aspectos bem diferentes do modelo de 2014. E, na visão do governo do Estado, inovadores sob o aspecto da regulação de contratos, gestão, transparência e governança.

Sob o aspecto da transparência, a proposta prevê que cada vencedor terá que criar uma nova empresa para gerenciar o contrato, mesmo que seja um consórcio. Terá que criar uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) para gerir o contrato. “Isso evitará que se misture os negócios. Uma das empresas vencedoras pode ter atuação em outros setores, por exemplo. Com a SPE evitamos a mistura, entendemos melhor a operação e conseguimos mais transparência nos contratos”, diz Marcelo Bruto.

Governança: Outro aspecto da inovação, segundo o Estado, é relacionado à governança e “clearing” para a tecnologia a ser introduzida no futuro sistema licitado. Será exigida a criação de uma nova empresa para gerir os serviços tecnológicos, entre eles a bilhetagem eletrônica (que é a venda e compra dos créditos eletrônicos do VEM), e o Centro de Controle Operacional (CCO), por exemplo.

Os vencedores da licitação terão direito a ter assento nela, ao lado do Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano (CTM), assim como o Metrô do Recife e as duas concessionárias que já atuam no sistema, por exemplo. Mas a empresa terá uma gestão executiva. Também será contratado um verificador independente para fiscalizar os serviços e cobrar os indicadores de desempenho.

Os operadores ganharam na Justiça, há mais de 10 anos, o direito de vender e arrecadar os créditos eletrônicos, repassando-os ao poder público. “Esse direito não será retirado, mas eles integrarão uma empresa de gestão executiva, onde terão assento. É um dispositivo que temos nos contratos de PPPs e que usaremos”, diz o secretário.

Menos lotes: Outra importante mudança – que não agradou aos operadores do sistema, já se sabe – é que a RMR não será mais dividida em cinco lotes. Serão três: Lote 3 (90 linhas operadas no Recife (Zona Norte), Olinda e em Paulista), Lote 4 (65 linhas operadas no Recife (Zona Sul), Jaboatão dos Guararapes, Cabo de Santo agostinho e Moreno), e Lote 5 (109 linhas operadas no Recife (área central e Zona Sul) e em Jaboatão).

O Estado e os documentos relacionados à nova licitação, entretanto, deixam claro que o número de lotes está em avaliação. O cenário usado como base (dados de 2021) considera o total de 265 linhas, uma frota em operação de 2.181 ônibus e a cadastrada com 2.545 ônibus – o que representaria 78% do STPP, com oito operadores.

O entendimento é de que a redução simplifica a gestão dos contratos – seriam dois contratos a menos – e diminui os conflitos na operação da rede. Mas a crítica já feita durante a apresentação da proposta no Conselho Superior de Transporte Metropolitano (CSTM) é que a redução restringe a participação.

Sem inovações: A proposta para a nova licitação das linhas de ônibus do Grande Recife, entretanto, não apresenta algumas inovações que vêm sendo introduzidas na renovação dos contratos do setor no País. É o caso da divisão entre a operação do sistema e o controle da frota de veículos.

A separação das duas atividades começou a ser adotada nos contratos de sistemas de transporte público elétricos – pioneiramente por Santiago, no Chile, que vem promovendo a ampliação da base elétrica do seu sistema de transporte coletivo.

No Brasil, o Rio de Janeiro lançou licitação pública do sistema de transporte convencional (não elétrico) no modelo, assim como São José dos Campos (SP). Curitiba (PR) planeja adotar a mesma proposta de operação de serviço separada de frota para um corredor de ônibus totalmente elétrico que está viabilizando com financiamento do Banco Mundial.

Segundo Marcelo Bruto, seria muito arriscado apostar em tamanha disruptura para a nova licitação do sistema do Grande Recife. O Estado garante, entretanto, que o modelo da nova concorrência prevê um anexo para novos investimentos que permitirá a aquisição de novos serviços elétricos, alongados.

“De fato, nossa proposta de contrato não prevê a aquisição da frota separada de operação. Girar a chave é difícil. achamos arriscado fazer tamanha mudança para um sistema que não tem sequer contrato. Com exceção de Santiago, que é um modelo de transporte elétrico, avaliamos que as experiências no Brasil ainda são muito novas, como é o caso do Rio de de São José dos Campos. São modelos que precisam ser testados, que têm prós e contras”, pontuou.

Entenda a história: A primeira licitação foi realizada depois de mais de dez anos de discussões, idas e vindas, em 2013, mas apenas a menor parte dela – o equivalente a pouco mais de 20% do sistema – foi homologada e passou a valer em 2014. Apenas dois dos sete lotes em que a RMR foi dividida passaram a ter concessionárias públicas – o Consórcio Conorte (que opera o BRT Norte-Sul e linhas da área Norte do Grande Recife) e a Mobibrasil (operando o BRT Leste-Oeste e a região Oeste da RMR).

O governo do Estado tinha pressa por causa do projeto do BRT pernambucano – às vésperas da Copa do Mundo de 2014 e bancado com o dinheiro do governo federal -, mas já previu, ainda na época, que não conseguiria bancar a parte pública do restante do contrato. E, assim, os cinco lotes foram colocados de lado.

Menos de dois anos depois, o governo já argumentava que teria que refazer os estudos porque o custo projetado para a operação concessionada tinha sido muito elevado e refletia uma época em que o País estava muito bem financeiramente. O setor empresarial concordou e o STPP permaneceu no esquema da permissão precária, sustentado por um regulamento ultrapassado e engessado.

Em 2020, a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) foi contratada para iniciar os estudos, tendo o contrato assinado somente no início de 2021. Em setembro do mesmo ano, a equipe da Seplag entrou no processo para acompanhar os estudos.

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