Da Agência AutoData
Foto: Divulgação (BAE Systems / Via Secco Comunicação)
A BAE Systems, companhia inglesa originada no setor de defesa e que há 25 anos diversificou seus negócios com a produção de powertrains, planeja investir no Brasil. Muito interessada na América Latina, um mercado de 55 mil ônibus por ano, a empresa procura, por enquanto, parcerias com fabricantes locais para injetar recursos e iniciar a produção local.
A ideia é fazer frente à importação de veículos híbridos e elétricos, principalmente da China, e ao mesmo tempo tornar viável o custo da solução sem ter de lidar com oscilações cambiais.
Em entrevista exclusiva à Agência AutoData, o diretor de desenvolvimento de negócios da divisão Power & Propulsion Solutions, Ian Wilson, responsável pela operação global da BAE Systems, afirmou que possui a expectativa de, até dezembro, ter acordo assinado com alguma empresa no Brasil para iniciar a produção local. Ele contou que já entrou em contato com algumas delas e estabeleceu conversas “bastante positivas” para trazer a produção de seu trem de força ao País. No entanto nenhum negócio foi fechado, por ora:
“Nosso conceito de trabalho é estar, de maneira muito próxima, junto aos produtores locais. Nós não acreditamos que hoje exista apetite por uma solução pronta, e sim a necessidade de trabalhar junto a esses fabricantes para integrar as nossas soluções às suas plataformas”.
O diretor assinalou que nos últimos dois anos houve grande esforço de redução global de preços a fim de fazer frente aos importados. Ele observou que vêm aparecendo muitos novos entrantes, como a BYD. “Que trazem medidas drásticas ao mercado e, como não conseguimos alterar essas mudanças, podemos navegar nessas transformações e tentar nos posicionar da melhor maneira possível”.
Ao olhar especificamente para a América Latina, Wilson destacou a forte entrada de importações chinesas: “O que não vimos foi o surgimento de ônibus elétricos produzidos por fabricantes locais. Por isso acreditamos que existe uma possibilidade, um nicho de mercado, para empresas que estejam dispostas a ajudar fabricantes locais a desenvolver produtos elétricos, que terão condições de competir com importações principalmente, e não exclusivamente chinesas”.
Como a maior parte da produção de trem de força da BAE Systems se dá nos Estados Unidos a variação do dólar pode pesar contra, especialmente nos países latinos, além de a empresa considerar a diversificação essencial à gestão de risco. O que reforça a ideia de instalação de manufatura local: “Em mercados grandes o suficiente para que esse investimento se justifique sempre olhamos para produtores locais, a fim de tornar viável nosso custo. É algo que está nos nossos planos como uma necessidade efetiva do mercado”.
A respeito do estreitamento de conversas com governos locais a fim de demonstrar seu interesse no avanço da eletrificação, a exemplo da cidade São Paulo, que pretende ter 20% da frota de ônibus composta por veículos não poluentes até o fim de 2024, com cerca de 2,6 mil unidades, o executivo disse esperar que nos próximos meses, com a esperada trégua da pandemia, possa viajar ao Brasil.
“Acho que minha esposa ficará muito feliz de me ver pelas costas de novo, assim que eu puder entrar em um avião”, brincou Ian Wilson, bem-humorado, ao complementar que esse contato poderá ser feito junto com um parceiro local, o que está sendo buscado, ou com a interface da embaixada ou do consulado de seu país. Como vantagem Wilson citou a atuação nos três níveis de propulsão: híbrida, elétrica e nas células de hidrogênio: “Podemos ser um intermediador para esclarecer benefícios e desafios de cada uma das modalidades a partir da nossa experiência”.
A companhia, que dispõe, hoje, de 14 mil sistemas seus operando ao redor do mundo, sustenta como outro diferencial o fato de ter muitos componentes em comum com as versões disponíveis: “Podemos oferecer solução com 100% de uma das modalidades ou com um misto das três dependendo das características de cada cliente e mercado. Se comparar o híbrido e o totalmente elétrico há grande número de componentes iguais. O motor é o mesmo, os itens eletrônicos e placas de controle são os mesmos. Então existe potencial de comunização que facilita a manutenção do sistema e a transição do híbrido para o elétrico e a operação dos ônibus como um todo”.
Desafios: Sobre a falta de infraestrutura no Brasil para o avanço da eletrificação Wilson reconheceu ser grande desafio, pois, apesar da evidente forte pressão política para que a produção seja de zero emissão, é preciso lidar com a questão: “Exatamente por isso gostamos de trabalhar em conjunto com fabricantes locais a fim de que eles determinem o que é mais adequado para aquele mercado. Queremos ouvir deles o que é o melhor para eles em vez de ditar a eles o que têm de fazer”.
Pelo mesmo motivo a opção inicial seria atuar em conjunto com empresas locais e não trazer operação para iniciar produção solo.
Wilson lembrou que o Brasil é um dos primeiros países latino-americanos onde a BAE Systems planeja iniciar algum tipo de operação: “Estamos conversando com empresas de cinco países da região. Mas temos um interesse massivo no Brasil porque possui uma frota enorme de ônibus e também uma indústria automotiva de peso. Então faz muito sentido para nós”.
Colômbia, Chile e México estão à frente no processo de eletrificação e, portanto, há a possibilidade de a BAE Systems anunciar parceiro para fornecimento, ou produção, em um desses países antes do Brasil.
O executivo reforçou que seu modelo de negócios é, geralmente, diretamente com fabricantes de chassis, “que é onde colocamos nossos sistemas de propulsão”. Ou eles encaroçam o chassi diretamente ou vendem para outro encarroçador. “Então pode acontecer, dependendo do mercado e da necessidade, que a nossa relação seja com um terceiro país que esteja vendendo chassis eletrificados para o mercado brasileiro, por exemplo”.
A respeito da melhor solução para o Brasil Wilson respondeu que é como adivinhar os números da loteria do próximo sábado. Por enquanto não se arrisca a dizer e afirmou que isso pode variar conforme a cidade: “A ausência de infraestrutura, como você citou, não será solucionada do dia para a noite. Então podemos começar com um modelo híbrido e depois migrarmos para um 100% elétrico ao longo de alguns anos. Não é possível afirmar que a mesma solução será utilizada no país inteiro”.
Ele citou que em San Francisco, nos Estados Unidos, existem algumas gerações distintas de produtos em circulação ao mesmo tempo. E que o sistema híbrido que desenvolvem é o linear, que possui trem de força elétrico complementado ou que também opera com um motor a diesel. Neste caso a bateria é recarregada conforme o veículo freia.
Projeções: Quanto Custa? Wilson disse que não poderia, ainda, apontar um valor para esses investimentos que a empresa está disposta a fazer porque dependerá de quem é o parceiro, de qual é a necessidade, de qual é o mercado e de que nicho atenderá. Quanto à expectativa de tempo para que a eletrificação se estabeleça nas linhas de ônibus urbanos do País ele estimou, com base na experiência em outras localidades, que nas grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, RJ, em dois ou três anos deva se iniciar a aceleração de processo que levará de cinco a dez anos para ser concluído.
“Nas grandes linhas de transporte interestaduais e intermunicipais acredito que deva levar um pouco mais de tempo, e aí talvez a tecnologia já seja diferente, de células de hidrogênio, mas essa tende a levar mais tempo.”
A BAE Systems fornece equipamentos, como navios militares e canhões navais, radares, veículos blindados e controles de voo comerciais e militares para Forças Armadas do Brasil. Desde 1998 mantém escritório em Brasília, DF, para dar suporte às operações e, em 2019, estabeleceu base também no Rio de Janeiro.