Da Tribuna do Norte
Foto: Divulgação (CBTU Natal)
Francisca Maria dos Santos, de 58 anos, só sai de casa com uma “colinha” na carteira, com os horários das linhas do sistema de trens urbanos de Natal. Ela é uma das 13 mil pessoas que utilizam diariamente o sistema de transporte público operado pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). A dona de casa conta que está animada com a expansão da rede prevista para até novembro de 2022. A expectativa é de que mais sete mil potiguares sejam atendidos pela rede.
“Isso vai ser muito bom, é melhor que mais pessoas utilizem os trens. Eu prefiro mil vezes andar de trem do que de ônibus. É um sistema muito mais rápido, fácil. Eu ando desde sempre, quando ainda eram os trens velhos. No trem, a gente tem mais conforto, não tem trânsito, o pessoal fica menos estressado e chega mais rápido. Se você fechar o olho perde a parada e é mais barato que o ônibus”, conta Francisca, que costuma subir na estação da Ribeira e descer no bairro de Nova Natal. A tarifa cobrada nos trens é de R$ 2,50, enquanto nos ônibus urbanos a passagem custa R$ 4. Para 2022, há a expectativa de que os dois sistemas iniciem um plano de integração, segundo a Secretaria de Mobilidade Urbana de Natal (STTU).
Atualmente, o sistema de trens de Natal atende quatro cidades da região metropolitana: Parnamirim, Extremoz, Ceará-Mirim, além da própria capital. São Gonçalo do Amarante, São José de Mipibu e Nísia Floresta também passarão a ser contempladas após a conclusão do projeto de expansão, anunciado pelo Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR) ao custo de R$ 76 milhões. A via férrea total passará dos atuais 56,2 quilômetros para 84 quilômetros ao fim da obra e o número de trens passará de cinco para sete. Após a ampliação, a capital passará a ter o maior sistema de trens urbanos operado pela CBTU no Brasil. A companhia também atua em Belo Horizonte (MG), João Pessoa (PB), Maceió (AL) e Recife (PE).
Para a cientista social e especialista em planejamento urbano e regional, Maria do Livramento Clementino, o prolongamento das ferrovias deve refletir na melhoria do trânsito e da mobilidade urbana natalense. “Esse é um projeto que é para ontem e chega em bom momento, até com um certo atraso. O VLT [veículo leve sobre trilhos] é bastante adequado ao ambiente urbano porque é um transporte bem amigável, já é utilizado em grandes metrópoles do mundo. Em Natal isso vai ajudar a desafogar o trânsito porque isso vai permitir redefinir as linhas de ônibus, de modo a dar mais circularidade ao transporte de bairro. Quando se tem grandes corredores de VLTs, isso permite que as linhas ônibus sejam redefinidas”, explica.
A cientista, que também é socióloga e economista, reforça que a segurança nas margens da rodovia deverá ser reforçada por causa do aumento da demanda, influenciada principalmente pela rapidez do transporte e tarifa mais barata. Livramento destaca que a mudança poderá aumentar oportunidades de emprego. “Com esse aumento de 13 mil para 20 mil, a gente vai ter uma sobrecarga maior, então será preciso ter uma atenção na segurança dos passageiros nas margens, nas estações. Esse modal vai quebrar algumas barreiras como a da tarifa. Hoje uma pessoa que mora em Nísia, para trabalhar em Natal o custo de transporte é muito alto, às vezes não compensa. As empresas não se dispõem a pagar a tarifa interurbana. O trem vai facilitar essa integração e ampliar as oportunidades de trabalho, no que diz respeito ao deslocamento para o emprego”, afirma a professora do Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DPP/UFRN), Maria do Livramento.
Obras: O sistema terá o incremento da Linha Branca, expandindo assim o Ramal Sul, chegando a São José de Mipibu e Nísia Floresta. Já a Linha Roxa vai aumentar o alcance do Ramal Norte, com maior penetração nos municípios de Extremoz e São Gonçalo do Amarante. As obras da Linha Branca começaram em fevereiro deste ano. Estão sendo construídos 23,4 quilômetros de ferrovia e quatro novas estações (Boa Esperança, Cajupiranga, São José de Mipibu e Nísia Floresta).
Já as obras da Linha Roxa foram iniciadas no início deste mês, com o lançamento da pedra fundamental em cerimônia que contou com a presença do ministro do MDR, Rogério Marinho. Com isso serão acrescentados 4,2 quilômetros de ferrovia, além de três novas estações (BR-101 Norte, Guararapes e Vicunha). “É um serviço que não polui, não atravanca o trânsito. Dá conforto, segurança e melhora a proficiência dos trabalhadores, uma vez que não ficam preso ao trânsito”, afirmou Marinho à época do início das obras.
O presidente do Sindicato dos Ferroviários do RN (Sintefern), Jorge Luiz, alega que o aumento da rede de trens é um pleito antigo da categoria. Ele, inclusive, vê a possibilidade da ampliação de contratação de profissionais para atuar na administração das linhas. Atualmente, o sistema conta com cerca de 250 trabalhadores, entre maquinistas, operadores, mecânicos, bilheteiros e administradores. “Fazia muito tempo que a gente não desenvolvia as linhas do Rio Grande do Norte, são mais de 20 anos que é desse jeito aí”, opina Jorge Luiz.
De acordo com a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), a ideia é criar um ferro-anel metropolitano interligando São Gonçalo do Amarante e Macaíba, com o aumento da extensão da Linha Roxa para o sistema chegar até o Aeroporto Internacional Aluízio Alves. Existe ainda um desenho de traçado para criação das linhas Marrom e Laranja. Os novos itinerários pretendem ligar o bairro da Ribeira ao campus central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Ainda não há prazo para estas ampliações, segundo a Companhia.
Secretários comemoram expansão do sistema: A estratégia de estímulo ao uso do trem como alternativa de mobilidade urbana aliado ao turismo já é pensada por Márcio dos Santos, secretário de Transporte, Trânsito, Obras e Serviços Urbanos de Nísia Floresta. “Vai melhorar muito para quem pega ônibus para trabalhar em Natal e para voltar porque a tarifa será mais barata e a viagem mais rápida. Em relação ao turismo não tem nem o que falar, vai ser ótimo. Tem muitas pessoas que querem conhecer Nísia, mas não tem carro, não sabem como chegar, os horários dos ônibus não são muito bons, e a agora vai ter uma viagem direta. Aqui temos lugares muito bonitos, somos conhecidos como a terra da Lagoa do Bonfim, então isso vai ser um prêmio para toda a população”, comenta.
Em São Gonçalo do Amarante, o secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo, Vagner Araújo, destaca a importância do que chamou de primeiro passo: “Nós estamos muito felizes com a chegada do VLT, mas ele vai chegar apenas na extremidade do município, ali na BR-101. Essa rotina de pessoas que moram em São Gonçalo e trabalham em Natal é uma realidade muito dura porque há um gargalo de transporte, na dificuldade de acesso, precariedade do serviço de transporte coletivo de ônibus e muita gente acaba usando o automóvel gerando esse tumulto eterno. O VLT vai ajudar nisso porque com um transporte de qualidade, com boa frequência, as pessoas passarão a usar. Nossa expectativa é de que haja um aumento e que ele passe pelo aeroporto e pelas regiões centrais da cidade”.
Para o titular da Secretaria de Obras de São José de Mipibu, Alexon Adriano, a chegada do trem na cidade terá um papel crucial na recuperação da economia local após o período mais crítico da pandemia de covid-19. “Fomos contemplados com uma estação de parada e estamos pleiteando outras. Estamos fazendo trabalhos integrados com a secretária de Turismo para exploração dos engenhos, do turismo religioso para dar uma alavancada nisso. A própria secretaria de Saúde também será envolvida para que haja um controle sanitário porque a pandemia ainda está aí. Então isso tudo vai movimentar várias ações de vários setores da cidade e estamos muito animados”, ressalta.