Da Revista IstoÉ Dinheiro
Foto: Gabriel Wallace (Aeroin)
A palavra Itapemirim é sinônimo de transporte rodoviário de passageiros no Brasil há 68 anos. A empresa fundada na capixaba Cachoeiro do Itapemirim, cruza o Brasil com seus ônibus desde 1953 e, no fim de junho, deu início à sua viagem mais desafiadora em trajeto visível apenas nos radares: o céu do País. Sob desconfiança em razão de dívidas tributárias de R$ 2,2 bilhões do Grupo Itapemirim, a Itapemirim Transportes Aéreos (ITA) fez o voo inaugural entre São Paulo e Brasília. O planejamento atual atende oito cidades e, até meados de 2022, deve atingir 35 destinos nacionais. Já em 2023 a meta é criar raízes na Europa e, na sequência, nos Estados Unidos. “Já estamos conversando com investidores de Portugal e da Inglaterra, além de um terceiro país do continente”, disse à Dinheiro Sidnei Piva, presidente do Grupo Itapemirim. “A ideia é montar uma empresa em cada região. Vão voar por lá. E as duas terão ligação com a ITA no Brasil.”
A experiência no céu não é a primeira do Grupo Itapemirim. No início da década de 1990, a companhia operou transporte de carga no País, mas as atividades foram encerradas pouco tempo depois. Desta vez, no entanto, o executivo garante que o projeto é “para mais de 80 anos”, embalado por US$ 500 milhões que teriam sido investidos por um fundo árabe (o nome é mantido em sigilo), além de R$ 150 milhões de capital próprio do grupo. O dinheiro vem sendo utilizado no desenvolvimento da empresa. Cinco aviões Airbus A320ceo já integram a frota, que deverá ter 50 até a metade do ano que vem. O número de funcionários também segue em crescimento. Atualmente são 500, com previsão de contratação de 1,5 mil em agosto. O plano é alcançar 4 mil em 2022.
A confiança do executivo nos negócios é justificada. Além de a companhia aérea já estar com taxa de ocupação de 60%, apesar do curto período de atuação, Piva também considera o Grupo Itapemirim fora do processo de recuperação judicial (RJ), iniciado em 2016. No fim de maio, a organização protocolou uma petição para encerrar a ação na 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do foro central da comarca de São Paulo e aguarda decisão. Segundo ele, todas as cláusulas do processo estão sendo cumpridas. “Recuperamos a empresa, o que parecia impossível, e montamos o maior case de negócio que é uma companhia aérea.”
A experiência com a RJ da Itapemirim serve de base para o presidente comentar a situação da aérea Latam, em recuperação judicial nos Estados Unidos, por causa de dívidas de US$ 18 bilhões. A Azul estaria interessada em adquirir as operações domésticas brasileiras da empresa. Apesar de afirmar que aquisições fazem parte do jogo, Piva mostra-se contrário à compra ao destacar que o mercado nacional movimenta apenas 4% da população e que a disputa entre quatro ou mais companhias “aumentaria a concorrência e forçaria todas a melhorar a qualidade”.
E a aposta da ITA é brigar “por 40% do market share em até dez anos” — a intenção, na verdade, é alcançar a marca na metade do tempo. Além de customizar e reconfigurar os aviões para oferecer maior espaço entre as poltronas, a companhia oferece transporte gratuito na primeira bagagem e a marcação de assentos sem custo adicional. As decisões vão em direção contrária à política adotada pelas demais companhias nacionais, que têm cobrado pelos serviços. Piva afirmou que os benefícios serão mantidos gratuitamente graças à redução da margem de lucro.
Além dos diferenciais, a ITA pretende integrar os sistemas em 2,7 mil cidades atendidas pelo rodoviário. A ideia é que, futuramente, o cliente possa ver uma só empresa e, por meio de um site único, combinar a sua viagem, seja aéreo com rodoviário, ou escolher apenas aéreo ou rodoviário. O advogado Thiago Carvalho, especialista em aviação civil, afirmou que há espaço para as operações da companhia do Grupo Itapemirim. Para o sócio da ASBZ Advogados, a ITA irá suprir, ao menos em parte, a saída do mercado da Avianca. “Considerando que o segmento doméstico se recuperará antes do internacional e o foco da ITA é o mercado interno, esse cenário favorecerá os negócios.” Há a expectativa de que a malha aérea nacional retorne a patamares próximos daquilo que era antes da pandemia até o começo de 2022. Se a previsão irá se confirmar, só o tempo e o avanço da vacinação contra a Covid-19 irão dizer.