Subsídios ao transporte público devem aumentar

Do Valor Econômico
Foto: Paulo Pinto/Fotos Publicas/Ilustração

Tanto o prefeito Bruno Covas (PSDB) como seus sucessores terão um gigantesco desafio a ser enfrentado nos próximos anos. Em razão da pandemia, segundo dados da assessoria de imprensa da SPTrans, a estimativa de passageiros transportados nos ônibus urbanos em 2021 deve ficar em 2,07 bilhões, volume 22% inferior aos 2,63 bilhões de 2019.

Não deixa de ser um alento em relação a 2020, quando a queda atingiu 60%, somando 1,56 bilhão de passageiros. O movimento mais baixo exigiu um subsídio da ordem de R$ 3,315 bilhões e com perspectivas ainda superiores para este ano, já que a Prefeitura anunciou que o valor de R$ 4,40 das passagens está congelado até dezembro – em 2015, o subsídio era de R$ 1,92 bilhão. Caso não houvesse o subsídio, a tarifa seria de R$ 6,52, segundo a SPTrans.

A dificuldade já havia sido prevista, em junho, pelo Tribunal de Contas do Município (TCM), ao anunciar que o subsídio previsto no Orçamento de 2020, no montante de R$ 850 milhões, seria extrapolado pela administração municipal, principalmente em razão das medidas emergenciais de saúde e transporte assistencial.

Segundo estimativa do TCM, o custo do sistema de ônibus urbano é de aproximadamente R$ 9 bilhões, recursos que incluem receitas da Prefeitura e repasses da União. Para piorar o quadro, em dezembro, o presidente Jair Bolsonaro vetou um auxílio de R$ 4 bilhões ao sistema de transporte nas cidades com população acima de 200 mil habitantes. Para estancar os custos, a Prefeitura extinguiu o transporte gratuito de idosos entre 60 e 64 anos (em vigor desde 2013), o que deverá propiciar uma economia de R$ 338 milhões, segundo a SPTrans.

O modelo paulistano conta com peculiaridades. De acordo com os 32 contratos firmados, em 2019, é o único no Brasil no qual as concessionárias recebem por quilômetro rodado, independentemente do volume de passageiros transportados, o que, em um primeiro momento, é considerado positivo para conter a superlotação nos veículos. Desde 2013, ano em que eclodiu o “movimento dos 20 centavos”, prevaleciam contratos emergenciais, renovados periodicamente.

Para Ciro Biderman, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), caso a Prefeitura e as concessionárias não busquem alternativas ao que está disposto nos contratos, a tendência é que o sistema se transforme em uma “bomba relógio” ainda este ano. “Os contratos têm prazo de 15 anos, com reajustes anuais. Com a queda no volume de passageiros e da arrecadação, o custo do sistema deve subir em torno de R$ 500 milhões”, calcula.

Do lado da Prefeitura, afirma Biderman, “deve haver uma releitura dos mecanismos de controle para fiscalizar a relação entre ônibus em circulação e passageiros transportados, enquanto os empresários devem atentar para a qualidade dos serviços”.

Em relação ao modelo, Biderman pessoalmente é favorável à remuneração por passageiro transportado, entendendo que os investimentos das empresas visariam o bem estar do usuário. “Remunerar por quilômetro rodado é interessante, mas precisaria haver sistemas responsivos de demanda, pelos quais as linhas seriam reprogramadas de forma dinâmica (caso de Helsinki, na Finlândia). É inconcebível que um sistema que consome R$ 9 bilhões anuais não disponha de tais recursos”, diz. Segundo a SPTrans, esta questão, chamada por Redes de Referência, está prevista nos contratos.

Ex-consultor da CET, o engenheiro Sergio Ejzenberg, mestre em transportes pela Poli-USP, responsabiliza o conteúdo dos contratos, a seu ver, inadequados em relação ao futuro dos modais de transporte.

“Os contratos foram fechados com olho no retrovisor. A pesquisa Origem e Destino do Metrô aponta que 80% das viagens são para trabalho ou estudo. No caso dos ônibus, com o home office, o ensino a distância e o e commerce, a tendência é que o volume nunca mais retorne aos de 2019. Hoje, trajetos por aplicativos já são mais rápidos e baratos.”

Segundo Ejzenberg, as empresas adquiriram uma frota maior de ônibus articulados, que são remunerados acima dos convencionais e micro-ônibus, gerando maiores custos à Prefeitura.

Para Orlando Strambi, coordenador do departamento de engenharia de transportes da Poli-USP e conselheiro da WRI Brasil, a solução para o transporte coletivo envolve conceitos amplos, como o modelo Ruas Completas. Elaborado pela WRI, o modelo contempla o espaço viário como um conjunto a ser compartilhado por diferentes modais (pedestre, carros, bicicletas e ônibus), mas privilegiando o ônibus, que atende uma porcentagem maior da população. “A avenida Paulista é um bom exemplo do que poderia ser feito”.

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