Por NTU
Foto: Jonathan Silva/Ônibus Brasil
Levantamento realizado em 279 sistemas de ônibus coletivos urbanos no Brasil revela que no setor já houve 1.413 demissões e 2.024 suspensões de contratos trabalhistas; serviço está paralisado em 180 municípios
O setor de ônibus coletivo urbano já sente os reflexos da crise econômica gerada pelo coronavírus. É o que revela levantamento realizado junto a empresas associadas e entidades filiadas à Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), que representa o setor no Brasil. Considerando 279 sistemas municipais ou intermunicipais de transporte público pesquisados nos meses de março e abril deste ano houve suspensão total dos serviços determinada pelo poder público em 180 sistemas, e nos demais houve uma redução média de 80% no número de passageiros transportados. Estima-se que, em todo o país, 32 milhões de passageiros deixaram de ser transportados diariamente no período pesquisado, sendo que este cálculo não inclui os 180 sistemas paralisados.
A queda na demanda gerou prejuízos que podem chegar a R$ 2,5 bilhões por mês. Isso porque a oferta (frota em operação) foi apenas parcialmente ajustada à queda da demanda, conforme determinação dos órgãos gestores em cada cidade: caiu em média 25% em todos os sistemas, sem considerar as cidades onde houve paralisação dos serviços.
O levantamento da NTU incluiu todas as 26 capitais, o Distrito Federal e 14 regiões metropolitanas, além de várias cidades de grande, médio e pequeno porte. Os municípios da amostra reúnem 148,3 milhões de habitantes, respondendo por 70% da população brasileira, e representam 9,6% dos 2.901 municípios que são atendidos por serviço organizado de transporte público por ônibus urbano. Em todo o país são 1.800 empresas que operam uma frota total de 107.000 veículos e geram cerca de 1,8 milhão de empregos diretos e indiretos.
Clique aqui e veja o levantamento.
O presidente executivo da NTU, Otávio Cunha, esclarece que a redução de passageiros gera impacto devastador nas finanças do segmento, já que a tarifa é praticamente a única fonte de custeio do serviço. “O levantamento traz um recorte da pior crise econômica já enfrentada pelo setor e antecipa o cenário de colapso que se aproxima, conforme a situação das empresas agrava-se em cada município”, afirma. Apenas 11 sistemas de transporte público por ônibus possuem algum tipo de subsídio público, em sua maioria para custear gratuidades de estudantes, idosos e pessoas com necessidades especiais.
O estudo revela também que, a partir da drástica redução de passageiros, muitas empresas se viram obrigadas a dispensar funcionários. Até o momento foram registradas 1.413 demissões e 2.024 suspensões de contratos trabalhistas em 24 municípios do grupo pesquisado, afetando principalmente motoristas e cobradores. Foi registrada também a falência de uma empresa desde o dia 8 de abril, em Guarulhos-SP, e há o risco de falência de outras duas empresas no Paraná. “As medidas de auxílio ao setor serão decisivas para manter o serviço durante e depois da pandemia. Se isso não ocorrer, não sabemos o que vai restar desse transporte”, alerta Otávio Cunha.
Medidas alternativas
Entre as estratégias adotadas pelos operadores para evitar demissões em massa estão as férias antecipadas ou a redução de jornada e salários. A redução do salário e jornada dos colaboradores tem sido uma das alternativas para as empresas não decretarem falência; na maioria dos casos, a redução chega a 50%. Em alguns municípios, como Belo Horizonte-MG e Goiânia-GO, foi adotada uma estratégia de parcelamento dos salários. Em outros, como Manaus-AM e Americana-SP, foi adotada uma escala de trabalho onde os funcionários se revezam na operação do serviço. No Rio de Janeiro-RJ houve afastamento sem remuneração e afastamento com redução de salários nas empresas que operam no sistema metropolitano. Em Salvador-BA, a suspensão dos contratos por quatro meses foi aplicada aos aposentados que seguiam na ativa e a funcionários recém contratados.
Com os ajustes na oferta, têm sido registradas reclamações dos passageiros, principalmente em relação a maiores intervalos entre os ônibus e a episódios de superlotação observada em algumas cidades, especialmente nos horários de pico, já que, segundo recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), o distanciamento social continua sendo a medida mais efetiva no controle e redução na disseminação do novo coronavírus. Tais situações decorrem das determinações dos órgãos gestores locais quanto ao dimensionamento das frotas em operação em função da queda da demanda.
Para proteger passageiros e trabalhadores do setor, as empresas têm adotado várias medidas no combate à propagação do coronavírus. A principal delas é a intensificação da limpeza e higienização dos ônibus, terminais, estações e pontos de ônibus. Outras medidas incluem a disponibilização de álcool gel para motoristas, cobradores e usuários, limitação de passageiros a bordo, circulação com janelas abertas e a divulgação de informações sobre a pandemia.
Programa Emergencial
Desde o início da crise, a NTU vem alertando o poder público sobre a falta de alinhamento das medidas restritivas de oferta do transporte coletivo adotas por autoridades municipais e estaduais, e sobre a importância de diretrizes nacionais que poderiam ser dadas pelo Governo Federal. O setor também já informou ao Ministério da Economia sobre a dificuldade das empresas em honrar as folhas de pagamento e outros custos diante do desequilíbrio financeiro gerado pela Covid-19.
Nesse sentido, foi proposto ao Governo Federal a adoção do Programa Emergencial Transporte Social, que consiste na aquisição de créditos eletrônicos de transporte (tarifas) pelo poder público a serem destinados aos beneficiários de programas sociais, como o Bolsa Família. A aquisição seria feita no valor do prejuízo mensal enquanto durasse a crise da Covid-19, assegurando liquidez às empresas. “Não estamos pedindo auxílio financeiro, mas propondo a venda antecipada do serviço. Trata-se de medida emergencial, decisiva para manter a operação mínima do transporte público, que já foi abraçada por entidades do setor”, explica Otávio Cunha, referindo-se ao Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes de Mobilidade Urbana e à Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), apoiadores da medida, que conta também com o aval da Frente Nacional de Prefeitos (FNP).
Segundo a proposta, cada crédito eletrônico de passagem teria o valor da tarifa pública vigente no transporte coletivo por ônibus de cada localidade. Assim, o Governo Federal teria um estoque de passagens a ser empregado durante e depois da crise do coronavírus. O Programa Emergencial Transporte Social já tem apoio na Câmara dos Deputados: a proposta foi incluída na Medida Provisória Nº 936 por Emenda Aditiva do deputado federal Jerônimo Goergen (PP/RS) e aguarda votação.