Aplicativos de transporte modificam a forma de se movimentar
Deslocar-se de um ponto para outro, dentro de uma mesma cidade, pode ser uma tarefa mais difícil do que deveria. Longas distâncias, centros pulverizados e um custo relativamente alto no transporte constroem algumas das dificuldades que o brasileiro apresenta ao exercer a sua mobilidade.
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil – Ilustração |
O crescimento expansivo da tecnologia permitiu uma clara transformação em áreas consolidadas na sociedade através das novas possibilidades e dos novos arranjos socioculturais. Em meio a essa revolução nos sistemas, novos métodos surgiram e têm modificado, ou complementado, o pensamento sobre temas como medicina, comunicação e alimentação.
Com a mobilidade urbana, essa relação não é diferente.
“A aplicação de novas tecnologias para mobilidade é a revolução em si”, explica Tomás Izquierdo, diretor de transporte urbano e interurbano da Indra, multinacional de consultoria e tecnologia com presença na Espanha e na América Latina. Essa revolução propiciou o surgimento de um novo setor dentro da mobilidade. A nova mobilidade, como é denominada, consiste na união entre os aplicativos para smartphones e novos modelos de economia compartilhada que atuam no tema. Inserindo outros agentes na prestação de serviços de deslocamento, principalmente com os aplicativos de viagens sob demanda, empresas e startups passaram a observar a mobilidade urbana como um ambiente propício para novas realidades.
Com presença em mais de 700 cidades ao redor do mundo, a Uber, empresa norte-americana de viagens sob demanda, foi uma das pioneiras na ideia do e-hailing (ato de requisitar um veículo via dispositivo eletrônico).
Fundada em 2009, a companhia tem, no Brasil, o seu segundo maior mercado, atrás apenas dos Estados Unidos, e iniciou a venda das suas ações em maio deste ano na bolsa de valores de Nova Iorque, sendo cotada em US$ 82 bilhões.
O estudo Mapa da Qualidade de Vida de 2018, realizado pelo Grupo Zap em 12 capitais do Brasil, apontou que 52% dos habitantes já utilizam os aplicativos de mobilidade para se locomover, reforçando a presença do brasileiro na nova mobilidade.
O sucesso do modelo de transporte individual foi além das quatro rodas. As bicicletas e os patinetes elétricos inseriram meios de deslocamento que resultaram na micromobilidade, que consiste em deslocamentos em pequenas distâncias. Na prática, empresas como a Grow Mobility – união entre a brasileira Yellow e a mexicana Grin, que, juntas, operam mais de 135 mil bicicletas e patinetes elétricos ao redor do mundo – identiicaram um nicho de mercado para percursos menores.
A entrada desses agentes no mercado da mobilidade acabou estimulando viagens de curta distância, que antes as pessoas não realizariam. Para Izquierdo, essas tecnologias já quebraram as barreiras para melhorar a conectividade e a acessibilidade, resultando em um transporte mais eicaz. “A micromobilidade trouxe elementos de transformação, cuja evolução deve levar a uma menor dependência dos veículos tradicionais e a uma mobilidade mais sustentável”, conta.
No início dos anos 2000, acreditava- se que a internet traria menos necessidade de deslocamentos.
Em paralelo às facilidades que a conectividade trouxe, ela também inluenciou no compartilhamento de informações sobre outros lugares, trânsito e o espaço de modo geral. “Com tanta informação e recurso, na prática, a internet propiciou um aumento na mobilidade, a qual, no Brasil, veio junto com a melhora que tivemos na renda e a facilidade para aquisição de veículos”, explica o arquiteto, urbanista e docente da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Júlio Vargas.
A “nova classe média”, termo criado por Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), tem papel fundamental na lógica atual da mobilidade urbana. De 2003 a 2008, o número de brasileiros considerados pobres caiu em 3 milhões. A ascensão da classe D para a classe C acompanhou o aumento expressivo no número de veículos, somado ao crescimento do poder aquisitivo no período, reletiu no aumento das taxas de mobilidade do brasileiro.
Para além desses fatores, as empresas que se inseriram no setor dos deslocamentos apresentam facilidades que antes não existiam, e isso relete em uma maior participação popular nos transportes. “Além da mobilidade geral ter aumentado por essas questões gerais de renda, novas oportunidades e mais atividades para fazer, as empresas estão oferecendo veículos ou sistemas de transportes que podem estimular as pessoas a se mexerem ainda mais”, conta Vargas.
JORNAL DO COMÉRCIO – RS