Modalidades de aplicativos de transporte compartilhado, como o Uber Juntos, ajudam a reduzir o trânsito em cidades como São Paulo diminuindo a frota de carros particulares em circulação ou atraem quem já não se desloca por meios individuais habitualmente?
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil |
Uma pesquisa realizada pela Quest Inteligência, empresa de inteligência de mercado e satisfação de clientes, em conjunto com o GAESI, grupo de tecnologias de automação e gestão de processos da Escola Politécnica da USP – Universidade de São Paulo sustenta que a modalidade de carros compartilhados da multinacional Uber está tirando na cidade de São Paulo mais passageiros do transporte coletivo que convencendo as pessoas a deixar o carro em casa.
Segundo a pesquisa, 62% dos usuários do “Uber Juntos” vieram do transporte coletivo, sendo que metade deste total não assinalou nenhum outro tipo de deslocamento anterior, como táxis, carros de passeio ou motos. Assim, a maioria destas pessoas só andava de ônibus, trem e metrô.
A pesquisa foi realizada em todas as regiões da cidade de São Paulo e ouviu 351 usuários da modalidade “Uber Juntos” entre os dias 18 de fevereiro de 2019 e 19 de abril de 2019, durante os trajetos.
O índice de confiabilidade da pesquisa é de 95%.
Procurada pelo Diário do Transporte, a empresa Uber diz desconhecer a metodologia da pesquisa, considerou pequena a amostragem para que haja conclusões e ainda afirmou que a modalidade “Uber Juntos” pelo fato de circular somente em regiões centrais não concorre, mas complementa o transporte público.
“Em funcionamento apenas nas regiões centrais dos grandes centros, complementa o transporte público, permitindo que o usuário se desloque até o centro da cidade de ônibus, metrô ou trem, e realizando apenas os últimos quilômetros de Juntos. O sistema facilitar o acesso das pessoas às linhas de ônibus ou de trens, ampliando o acesso dos usuários à rede pública. (.) A Uber também não teve acesso à metodologia, portanto desconhece quais critérios foram considerados pela empresa contratada para a construir a amostra de 351 entrevistados, que representa 0,018% do universo de mais de 2 milhões de usuários que realizaram viagens de Uber Juntos nos primeiros seis meses do ano na capital paulista.” – ao fim da matéria, nota na íntegra
Já a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transporte, da prefeitura de São Paulo, responsável por gerir o trânsito e os diferentes meios de deslocamentos, disse nesta terça-feira, 16 de julho de 2019, que não comenta pesquisas que não conhece a metodologia e que, na cidade, o transporte por aplicativos é regulamentado . – nota na íntegra também ao fim da matéria.
A pesquisa da Quest Inteligência em parceria com a USP ainda revela que quando questionados sobre qual a alternativa para o mesmo deslocamento, depois do uso da ferramenta, 94,5% da amostra ainda consideraria o transporte público, como primeira ou segunda opção.
A pesquisa ainda mostra que 95,2% dos passageiros se tornaram usuários frequentes e que 4,8% dos novos usuários dificilmente voltarão a se locomover de forma “analógica”.
O principal atrativo da modalidade compartilhada é o preço baixo: quase metade das viagens pesquisadas (49%) teve custo menor que duas tarifas do transporte público em São Paulo (R$ 8,60). A tarifa básica dos ônibus municipais gerenciados pela SPTrans – São Paulo Transporte, dos serviços da CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, das linhas de Metrô (de operação pública ou privada) e do monotrilho da zona Leste têm tarifa de R$ 4,30.
O custo médio dos deslocamentos do “Uber Juntos” na cidade de São Paulo, de acordo com a pesquisa, foi de R$ 9,46 no período de levantamento.
O baixo custo médio das viagens pode ser analisado a partir da extensão dos deslocamentos: 5,6 km em média, segundo os dados.
Enquanto que pelo Bilhete Único da cidade de São Paulo é possível fazer até quatro embarques no transporte público em até três horas pagando uma tarifa (R$ 4,30), independentemente da hora do dia e da extensão do trajeto, os valores das viagens dos aplicativos mudam de acordo com a extensão e também com os horários, sendo mais altos quando há maior procura, ou seja, é a chamada tarifa dinâmica.
A pesquisa revela ainda que a maior parte dos usuários (76,9%) que anda de Uber Juntos tem Bilhete Único do transporte público de São Paulo.
Os percentuais são maiores entre as pessoas com idades mais baixas: 92,9% entre os passageiros de 18 a 20 anos e 78,7% com idades entre 21 a 30 anos.
A baixa ocupação dos carros, que nem sempre trafegam com todos os lugares preenchidos, e a sensação do conforto de um transporte individual são os principais diferenciais da modalidade que atraíram os passageiros, de acordo com as respostas.
PERFIS:
A maioria dos usuários do “Uber Juntos”, de acordo com a pesquisa, é formada por homens (57,8%). A maior parte dos passageiros desta modalidade tem formação de nível superior (69,2%) e idade entre 21 e 30 anos (53,56%).
Já quanto aos motoristas da modalidade “Uber Juntos”, a pesquisa aponta que 96,9% são homens. A maior parte dos condutores trabalha em média 10,2 horas por dia. Em média, estes motoristas transportam, em média por dia, dois passageiros no aplicativo “Uber Juntos”.
MODALIDADE PREOCUPA EMPRESAS DE ÔNIBUS:
Em todo o País, as empresas de ônibus se dizem preocupadas com modalidades de compartilhamento de carros por aplicativos como o “Uber Juntos”.
O assunto não é de agora.
Em novembro do ano passado, durante a 74ª Reunião Geral da FNP (Frente Nacional de Prefeitos), que ocorreu em São Caetano do Sul, no ABC Paulista, a NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), entidade que reúne mais de 500 viações, informou que as empresas de ônibus já perderam 5% dos passageiros para aplicativos como Uber e 99 em algumas cidades do Brasil.
A associação escreveu uma carta aberta aos prefeitos de todo o País solicitando que protejam o transporte coletivo do que consideram “concorrência desleal” criada por modalidades de transporte por aplicativo para mais de uma pessoa, como o Uber Juntos e o Pool +, da 99.
Conforme publicado pelo Diário do Transporte no dia 22 de novembro de 2018, as empresas de ônibus da cidade de São Paulo já demonstram insatisfação com a modalidade “Uber Juntos”. O SPUrbanuss, que é o sindicato que representa as companhias do subsistema estrutural (ônibus maiores com linhas que passam pelo centro da cidade), protocolou uma carta ao então secretário municipal de Mobilidade e Transportes, João Octaviano Machado Neto, pedindo que a prefeitura proíba a modalidade e a classifique como “transporte ilegal”.
O documento é assinado pelo presidente da entidade, Francisco Christovam, e ainda pede fiscalização com maior rigor sobre a Uber e a intervenção do Ministério Público do Estado de São Paulo.
O QUE DIZ A PREFEITURA DE SÃO PAULO:
Em nota ao Diário do Transporte, Secretaria Municipal de Mobilidade e Transporte disse nesta terça-feira, 16 de julho de 2019, que não comenta pesquisas que não conhece a metodologia e que, na cidade, o transporte por aplicativos é regulamentado.
A Secretaria Municipal de Mobilidade e Transporte (SMT) não comenta pesquisas cujo conteúdo e metodologia não sejam de conhecimento de seu corpo técnico. A SMT ainda esclarece que o transporte de passageiros por aplicativo possui regulamentação municipal cujo objetivo é melhorar a segurança dos motoristas e dos passageiros que utilizam transporte por aplicativos.
O QUE DIZ A UBER:
A empresa Uber diz desconhecer a metodologia da pesquisa, considerou pequena a amostragem para que haja conclusões e ainda afirmou que a modalidade “Uber Juntos” pelo fato de circular somente em regiões centrais não concorre, mas complementa o transporte público.
A Uber também citou matérias jornalísticas e uma pesquisa internacional que mostram que não há relação direta entre os aplicativos de transporte e a perda de demanda dos ônibus, mas sim a oferta de transporte coletivo sobre pneus, a prioridade dada aos automóveis e a expansão das malhas metroferroviárias.
“A Uber não teve acesso à pesquisa realizada pela Quest Inteligência. Segundo informações passadas pela reportagem, a pesquisa foi realizada em todas as regiões de São Paulo. O Uber Juntos, no entanto, só funciona no centro expandido da capital, em horários específicos. Os usuários entrevistados em outras regiões precisariam obrigatoriamente acessar a área de atuação do Juntos via outro modal.
O Uber Juntos é sistema que combina viagens individuais com trajetos convergentes para compartilhar o mesmo veículo. Em funcionamento apenas nas regiões centrais dos grandes centros, complementa o transporte público, permitindo que o usuário se desloque até o centro da cidade de ônibus, metrô ou trem, e realizando apenas os últimos quilômetros de Juntos. O sistema facilitar o acesso das pessoas às linhas de ônibus ou de trens, ampliando o acesso dos usuários à rede pública.
A Uber também não teve acesso à metodologia, portanto desconhece quais critérios foram considerados pela empresa contratada para a construir a amostra de 351 entrevistados, que representa 0,018% do universo de mais de 2 milhões de usuários que realizaram viagens de Uber Juntos nos primeiros seis meses do ano na capital paulista.
Além disso, sem ter acesso à íntegra da pesquisa não é possível saber, por exemplo, se foram apurados pela empresa contratada dados básicos como a frequência do suposto uso dos aplicativos em substituição ao transporte coletivo, se rotineira ou eventual, como em um dia de chuva ou outra situação específica em que o deslocamento por automóvel seja encarado pelo usuário como mais apropriado.
Da mesma forma, os dados apresentados não permitem concluir se a suposta substituição é permanente ou provisória. A Quest Inteligência afirma ter apurado uma “migração permanente de usuários” do transporte público para o Uber Juntos, com finalidade principal de deslocamento para o trabalho, porém a própria empresa calcula uma média de viagens em 3,8 por semana – dado incompatível com o cenário de usuários usando o app todos os dias para ir e voltar do trabalho, em que seria esperada uma média próxima de 10 viagens por semana (considerando duas viagens por dia, segunda a sexta).
É importante lembrar também que, em reportagens publicadas pelo jornal “Folha de S.Paulo” recentemente, a própria SPTrans analisa que um dos principais fatores da queda do número de passageiros do sistema de ônibus tem relação com a abertura de novas estações do metrô na capital.
Segundo a reportagem, a abertura das estações Higienópolis-Mackenzie e Oscar Freire, da linha 4-amarela do metrô, por exemplo, reduziu o número de passageiros do corredor de ônibus Campo Limpo-Rebouças-Centro em 7% entre agosto de 2018 ante o mesmo mês de 2017. No mesmo período, a linha 4-amarela registrou aumento de 12% no número de usuários. Outra reportagem apontou que o corredor de ônibus Vereador José Diniz-Ibirapuera-Santa Cruz registrou uma redução de 13% no número de passageiros transportados em outubro de 2018, logo depois da inauguração das novas estações da linha 5-lilás. O blog “Via Trólebus” apontou ainda que linhas de ônibus na região também verificaram redução acentuada de usuários, chegando a 63%, caso da 675L (Santo Amaro-Santa Cruz).
Pesquisadores da McGill University concluíram em estudo publicado em 2018 que a oferta de serviço ônibus e o índice de propriedade de automóveis são os fatores determinantes do número de usuários no transporte público A pesquisa analisou 13 anos de dados de transporte de 25 cidades americanas e os comparou com uma dezena de indicadores, entre eles a presença da Uber. A oferta de ônibus, medida em km percorridos pelos veículos (VRK), foi o principal fator de impacto no número de usuários. Os pesquisadores não encontraram relação estatística significativa entre o número de usuários e o serviço da Uber, embora observaram que a presença da empresa está associada a níveis maiores de uso do transporte público nas cidades analisadas.”
Diário do Transporte