Transporte coletivo sob demanda: “Senhora, seu miniônibus chegou”!

A passageira solicita um transporte coletivo pelo aplicativo do seu celular e é orientada a esperar o veículo num ponto de ônibus virtual, próximo de onde ela se encontra. Recebe também a placa do veículo, o nome do motorista e a previsão de chegada. Devido a um congestionamento no trânsito, o miniônibus atrasa — e a empresa operadora troca mensagens com a cliente, avisa sobre a demora e pergunta se ela ainda quer esperar pelo serviço. No final, para compensar o inconveniente, ela ainda ganha um crédito para usar numa próxima viagem.
Reprodução/G1 GO
A cena parece filme de ficção cientifica, mas é real. Aconteceu na Rua 23, no centro de Goiânia, poucos dias depois do início da operação em caráter experimental do CityBus 2.0, no último dia 11 de fevereiro. Primeiro serviço de transporte público coletivo por aplicativo de celular da América Latina, o CityBus 2.0 foi lançado pela HP Transportes Coletivos, operadora de ônibus urbano que atua também em Brasília por meio da Urbi Mobilidade Urbana.
A cliente Adriane Albernaz fez questão de contar sua história no Instagram. “Gente, que experiência! O crédito é total deles. Meu desejo é que dê muito certo e que expanda para mais bairros. Se tiver um serviço coletivo que funciona, a gente não precisa usar tanto o carro. Vamos ter um trânsito melhor, com menos poluição, estresse… foi uma vivência incrível!”.
Ela não é a única pessoa empolgada com a novidade. No primeiro balanço divulgado pela HP, referente aos primeiros 30 dias de operação do CityBus 2.0, o serviço teve 22 mil cadastros na plataforma do aplicativo e 98% de aprovação dos clientes — avaliação geral da experiência de 4,9 estrelas, numa escala de 1 a 5. Os itens que receberam melhor avaliação foram respectivamente motoristas, conforto do veículo, embarque rápido e bom trajeto, atributos que normalmente não são reconhecidos na prestação do setor de transporte coletivo.
“Recebemos esses números com muita alegria e humildade. Eles nos mostram que estamos no caminho certo, mas também que ainda podemos melhorar. E o mais importante é que temos recebido o feedback dos usuários”, afirma a diretora Executiva da HP, Indiara Ferreira, que destaca a interação com os usuários como o caminho de evolução para o serviço. “Todas as dúvidas estão sendo respondidas. Temos 100% de respostas em até 5 horas”, pontua Ferreira.
Origem da inovação
Goiânia tem uma tradição de inovação no transporte público: foi a primeira cidade a implantar um sistema de bilhetagem eletrônica no País, o Sistema Inteligente de Tarifação de Passagens (Sitpass), inaugurado em 1998. Vinte anos depois, a capital volta a ser exemplo com o lançamento do CityBus 2.0. O novo serviço surge como resposta a um dos principais desafios de mobilidade nas grandes e médias cidades — o excesso de carros nas vias, que causa congestionamentos cada vez maiores, comprometendo o desempenho operacional do transporte público. Em Goiânia, por exemplo, a velocidade média dos ônibus caiu mais de 30% nos últimos 5 anos, chegando a 8km/h em algumas das principais avenidas. Isso faz com que o transporte público coletivo seja cada vez menos atrativo à população, o que motivou a HP a apostar neste produto único e inédito.
“A necessidade das pessoas tem mudado dia a dia, elas exigem mais conforto com menores gastos e tempo de viagem. A HP estava muito incomodada porque a população tem deixado o coletivo para o (transporte) individual, e isso é horrível para as cidades. Nós nos sentimos na obrigação de contribuir com a melhoria da mobilidade humana. Estamos trazendo a transformação por meio da era digital com um serviço público coletivo”, destaca Indiara Ferreira.
Foram dois anos de preparação e estudos, nos quais a HP embarcou numa verdadeira jornada, desenvolvida em parceria com o Hub de Inovação Gyntec/PontoGet de Goiânia. “Nesse período, parte da equipe da HP Transportes foi capacitada em metodologias que garantiram o desenvolvimento deste novo projeto”, explica Hugo Santana, diretor de Transportes da empresa. Segundo ele, foram investidos cerca de R$ 5 milhões para a aplicabilidade do serviço e aquisição dos 14 miniônibus utilizados nesta etapa inicial que cobre as ruas de 11 bairros do Centro Expandido de Goiânia dentro da área de concessão da empresa. “Em sua fase piloto, o CityBus 2.0 irá empregar a mão de obra inicial de 30 motoristas com capacidade para atendimento de até 3.500 viagens por dia”, conclui Hugo.  
Um elemento determinante para o lançamento do serviço nesse curto intervalo de tempo foi a adoção de uma plataforma tecnológica já testada e aprovada na realização de viagens coletivas, fruto de uma parceria internacional com a Via, empresa responsável pelo desenvolvimento do algoritmo utilizado no aplicativo de celular.
A plataforma digital de transporte responsivo à demanda (DRT – Demand Responsive Transit) da Via está atualmente disponível em 50 cidades dos Estados Unidos, Europa, Ásia e Oceania com diversos usos. Na cidade de Arlington, nos Estados Unidos, foi utilizada para substituir a antiga rede de transporte público de rotas fixas por um serviço flexível. Em Cingapura, está substituindo rotas de ônibus de baixa demanda. Já na cidade de Sidney, na Austrália, é usada para cobrir o início e o final das jornadas, de forma integrada aos serviços oferecidos pelos operadores locais de ônibus.
E, em Goiânia, a plataforma teve que ser traduzida para o português e adaptada às condições operacionais locais, para utilização de um transporte público coletivo complementar. A adaptação incluiu a introdução de novas funcionalidades, como a aceitação do pagamento em dinheiro, além do cartão de crédito — modo de pagamento padrão nos demais países.
Segundo o vice-presidente de Parcerias Globais da Via, David Adelman, a plataforma, lançada em 2013, já conta com mais de 50 milhões de viagens concluídas em todo o mundo e oferece o mais avançado algoritmo para “conectar veículos com passageiros”. Ele explica que a inovação não pretende substituir o serviço de transporte coletivo urbano tradicional, mas oferecer um transporte complementar mais acessível, confiável e dinâmico. David cita estudos feitos em cidades onde serviços desse tipo foram adotados indicando que a demanda de passageiros triplicou. “Estamos preparando as cidades para o futuro. Todos os especialistas são unânimes em afirmar que, mesmo se os veículos forem elétricos e autônomos, o transporte será um grande problema se não for coletivo”, afirma.
Para Edmundo de Carvalho Pinheiro, presidente da HP e membro do Conselho Diretor da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), o passo dado com o CityBus 2.0 é importante porque significa que os operadores de transporte público estão se posicionando também para trabalhar com inovação, fazendo uso da tecnologia para assegurar mais competitividade ao transporte público coletivo. “É uma experiência que vai servir para todo o setor, e é isso que estamos nos propondo. Precisamos nos preparar para enfrentar uma competição cada vez mais acirrada no mercado de mobilidade”, destaca.
Para o sucesso da iniciativa, o envolvimento do poder público é essencial. E a Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos de Goiânia (CMTC) respalda a proposta. “Nesse primeiro momento é (um projeto) experimental, mas estamos apostando nisso. Acredito que é uma iniciativa que vem para somar na questão do transporte público coletivo e dar uma nova oportunidade para o usuário, que passa a contar com mais uma opção de transporte com segurança”, relata o presidente da CMTC, Fernando Meireles.
O projeto de implantação do CityBus 2.0 será realizado de forma gradual, em cinco etapas, e a expansão ocorrerá à medida que cada etapa seja consolidada. A próxima fase deve ser lançada em um prazo inferior a seis meses. Nesse período de testes, ele está disponível no Centro Expandido de Goiânia que compreende 11 bairros como os Setores Central, Sul, Oeste, Marista, Bueno, Bela Vista, Serrinha, Nova Suíça, Jardim Goiás, Universitário e Aeroporto. Os miniônibus poderão ir para outras regiões da cidade desde que seja aprovado e solicitado pela população, já que a HP Transportes tem condições de ampliar o serviço de acordo com a demanda.
HP Transportes
Criada em 1969, a empresa atua no segmento de transporte público coletivo na Região Metropolitana de Goiânia. Atualmente, a HP Transportes oferta mais de 2.200 viagens por dia útil, transportando 130 mil passageiros diariamente nas 136 linhas compartilhadas que servem ao Arco Sul da Região Metropolitana de Goiânia, que inclui Goiânia, Aparecida de Goiânia, Hidrolândia e Aragoiânia, percorrendo mais de 65.000 km/dia. A HP emprega 1.100 colaboradores diretos e gera aproximadamente 4.000 empregos indiretos. Também fazem parte do grupo a Urbi Mobilidade Urbana, uma das operadoras do transporte público coletivo de Brasília, e um centro de serviços compartilhados, o SiAN, ambos instituídos em 2014.
Como funciona?
O CityBus 2.0 atende à necessidade de deslocamento para curtas distâncias, no conceito universal de microtransporte. Qualquer pessoa que tenha um celular do tipo smartphone, seja Android ou iOS, poderá baixar o aplicativo CityBus 2.0, fazer seu cadastro e começar a utilizar o serviço:
1 – A pessoa solicita o miniônibus pelo aplicativo; informa o número de passageiros, sua localização e o destino desejado e indica a forma de pagamento (crédito ou dinheiro).
2 – O aplicativo traça a melhor rota com o ponto de embarque, chamado de “ponto virtual” — porque não é um ponto de ônibus fixo, mas sim a localização mais próxima do cliente dentro da rota traçada, que pode até ser um ponto de transporte coletivo convencional. Indica também a identificação do motorista e a placa do miniônibus. O algoritmo atualiza constantemente as rotas dos veículos, adaptando-as à demanda.
3 – O cliente se desloca até o ponto de embarque, cerca de 20 metros, e aguarda a chegada do veículo. Essa foi a média de metros que tem se consolidado nesses 30 dias. Além disso, é possível monitorar a localização do miniônibus em tempo real.
4 – O cliente embarca e faz sua viagem até o ponto mais próximo possível do seu destino. Cada miniônibus transporta 14 passageiros sentados e é equipado com ar-condicionado, porta automatizada antiesmagamento e outros itens de conforto e segurança. No final, o cliente avalia como foi a sua experiência pelo próprio aplicativo.
Viagens mais baratas
A tarifa é flexível, conforme a distância percorrida, com preço inicial a partir de R$ 2,50. Quando recebe a solicitação, o aplicativo calcula a distância e informa ao cliente o valor da viagem. Por sugestão dos próprios usuários, o sistema passou a aceitar viagens em grupo, com tarifas que podem ficar até 63% mais baratas que os preços praticados por aplicativos de uso individual.
Na primeira fase, o atendimento do City Bus 2.0 será delimitado, no aplicativo, a uma área geográfica virtual denominada “Centro Expandido” de Goiânia, que engloba 11 bairros como os Setores Central, Sul, Oeste, Marista, Bueno, Bela Vista, Serrinha, Nova Suíça, Jardim Goiás, Universitário e Aeroporto. O serviço funciona de segunda a sábado das 6 às 23 horas, com linhas e horários flexíveis. Mas já há demanda dos usuários pela expansão da área de atendimento.
Nos primeiros 30 dias de operação, o tempo médio de deslocamento do veículo até o passageiro, assim que solicitado pelo aplicativo, foi de sete minutos, com exceção dos horários de pico, quando a espera chegou a 14 minutos. Segundo a HP Transportes, os atrasos são decorrentes da falta de priorização para o transporte coletivo nas vias. “Para se ter um transporte público coletivo de qualidade não bastam apenas veículos novos e confortáveis, são necessárias políticas públicas e infraestrutura voltadas para o desenvolvimento de uma mobilidade humana coletiva e sustentável”, observa Indiara Ferreira.
Segundo o consultor externo do projeto do CityBus 2.0, Miguel Ângelo Pricinote, o CityBus 2.0 utilizará a inteligência artificial para melhorar as rotas tornando-as mais ágeis para atender as demandas com precisão e reduzir o tempo de espera. “Aos poucos, o aplicativo vai traçando rotas melhores, mais ágeis, verificando onde há mais demanda e enviando os veículos para os locais. Dessa forma, o usuário que esperava em média 13 minutos pelo transporte, pode passar a esperar 10, oito minutos, e até menos do que isso, com o decorrer da utilização constante do app”, detalha.
NTU

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