Muito se discute se a ética é universal ou varia de lugar para lugar. O que ético para um japonês, por exemplo, é o mesmo para um brasileiro? O debate, que já dura séculos, está sendo reavivado por um novo elemento: carros sem motorista.
Veículos automáticos já circulam em fase de testes por algumas cidades americanas e da Europa. A indústria automobilística alega que vão tornar as estradas mais seguras, o trânsito mais racional e poupar dezenas de milhares de vidas, perdidas todos os anos em acidentes.
Mas o futuro impõe aos fabricantes, aos políticos e aos governos e consumidores algumas discussões morais. Que critérios um carro automático usará em um acidente?
Quando um motorista pisa no freio ou mesmo faz uma manobra arriscada para evitar atropelar um pedestre que cruzou a rua de maneira ilegal, mesmo com a lei a seu favor, tomou uma decisão moral. Mas até hoje são decisões individuais, como programar a inteligência artificial para reagir na mesma situação?
Encontrar uma resposta levou um grupo pesquisadores do MIT, o Massachusetts Institute of Technology, a criar em 2016 a Máquina Moral, um site onde os visitantes podem experimentar 13 diferentes situações envolvendo veículos automáticos no trânsito nas quais a morte de alguém é inevitável.
Um dos cenários pergunta: o sistema que controla o carro deve preferir salvar a vida de alguém mais jovem ou mais velho? Rico ou pobre? Uma mulher ou um homem? Alguém magro ou obeso? Ou será que não deveria fazer nada?
Um dos cenários do experimento do MIT. Como um carro deve reagir? — Foto: The Moral Machine |
Em dois anos, 2,3 milhões de pessoas de 233 países participaram do experimento, fornecendo 39,6 milhões de respostas. Mas os resultados, publicados em outubro pela revista Nature, indicam como será complicado um único comportamento para os carros.
Em um acidente de trânsito, as noções de certo ou errado variam em três grandes regiões do mundo, o Ocidente (os países da América do Norte e os europeus de maioria cristã), o Oriente (asiáticos e muçulmanos) e o Sul (a América do Sul e ex-colônias francesas).
Brasileiros, por exemplo, preferem que os carros poupem os motoristas mais do que os pedestres. Já os iranianos querem o contrário, que os pedestres sejam poupados. Australianos defendem que a segurança das pessoas magras tenha preferência sobre as demais.
O estudo só concorda em três pontos. A maioria dos pesquisados preferiu que os carros priorizem a vida de humanos à de animais. Também achou que um grupo com mais pessoas deve ter mais chances de ser salvo do que um com menos pessoas. E ainda, polêmico, que os mais jovens devem ser poupados mesmo ao custo das vidas dos mais velhos.
Alguns críticos do experimento questionam se estas decisões são mesmo importantes na prática, porém os pesquisadores sustentam que são os dilemas morais que os motoristas já enfrentam no dia a dia. Também afirmam que os resultados mostram as nuances culturais que as empresas terão de levar em conta para programar seus veículos.
Seja como for, o estudo sugere que nossas contradições e decisões irracionais também afloram quando estamos dirigindo. E é bem provável que serão transferidas para as máquinas.
G1 Economia