Melhora da mobilidade inspira novos negócios

Ilustração/UNIBUS RN
A dificuldade de encontrar motoristas de aplicativos que atendessem moradores da periferia de São Paulo levou o motorista Alvimar da Silva, que já tinha clientela fiel na região da Brasilândia, na Zona Norte de São Paulo, a atuar como motorista particular para atender esse público. “Fiz 500 cartões de visitas e distribui pelo bairro. O volume de chamadas me surpreendeu. Tive de delegar corridas entre os meus colegas e montei uma cooperativa.”

O passo seguinte foi lançar o aplicativo JaUbra, que hoje agrega 50 veículos. “Tenho recebido pedidos de motoristas de todas as regiões periféricas da cidade, que querem usar a ferramenta. Pessoas de Brasília, Goiás, Curitiba, Rio de Janeiro, entre outras localidades, também têm interesse.”
Silva conta que o aplicativo atual é terceirizado, mas que em breve a plataforma própria será concluída e, após ser homologada, ele poderá atender a todas essas demandas.
A JaUbra passou por aceleração no Ford Fund Lab e recebeu capital semente. “Com esse dinheiro, pude deixar a garagem de casa e alugar um ponto comercial. Também contratei a empresa para desenvolver o nosso aplicativo.” A gestão do negócio é feita por Aline, sua filha, que saiu do emprego em um banco para ajudá-lo.
A iniciativa de Silva é uma das soluções identificadas no estudo feito pela aceleradora Artemisia em parceria com o Ford Fund, braço filantrópico da Ford, denominado Tese de Impacto Social em Mobilidade, que identificou oportunidades de empreender no segmento.
“Garantir mobilidade é garantir o acesso a direitos básicos e promover uma sociedade mais saudável e autônoma”, afirma a diretora executiva da Artemisia, Maure Pessanha.
“O deslocamento restrito é elemento-chave para a exclusão social e contribui para a desigualdade. Nosso mapeamento mostra que é possível combater a segregação espacial, em especial dos mais pobres, a partir de uma nova lógica econômica”, acrescenta.
Gerente de estratégia de produto e porta-voz de mobilidade da Ford, Luciano Driemeier diz que o futuro da mobilidade é multimodal e integrado. “Nosso estudo vai auxiliar empreendedores a identificar oportunidades de negócios que irão contribuir para reduzir as dificuldades que permeiam a locomoção nas cidades e afetam a qualidade de vida da população.”
Motor. O kit para motorizar cadeiras de rodas, produzido pela Livre, é outro exemplo. Criado pelos irmãos gêmeos Júlio e Lúcio Oliveto, o negócio nasceu para ajudar a elevar a autoestima e a mobilidade de cadeirantes e idosos. “Com nosso kit, qualquer cadeira de rodas vira um triciclo motorizado, movido a bateria elétrica com autonomia para rodar até 25 km e que pode atingir 25 km/hora”, diz Júlio.
O kit é vendido pela internet e qualquer pessoa pode instalá-lo. “O preço mais acessível é R$ 4 mil. O modelo mais tecnológico sai por R$ 12 mil, atinge 45km/hora e pode ser usado em competições.”
Oliveto conta que 750 pessoas já utilizam a solução no Brasil, Argentina, Alemanha e Estados Unidos. “Oferecemos financiamento próprio, mas estamos buscando parcerias com ONGs e instituições financeiras para facilitar o crédito.”
Outra linha de trabalho da empresa é o Livre Experience, voltada à promoção de acessibilidade em grandes eventos. “No ano passado, participamos do Rock in Rio alugando triciclos elétricos às pessoas com deficiência permanente ou temporária, que puderam curtir a Cidade do Rock. Também estamos negociando com o Lollapalooza.”
Facilitar a vida dos usuários de transporte público é o alvo da Onboard Mobility, criada por Walter Santiago e dois amigos. “Usando inteligência artificial desenvolvemos o assistente virtual Bipay para recarga de Bilhete Único e celular, por meio de chat no Facebook.”
A meta maior da empresa, no entanto, é unificar o pagamento de todos os modais de transporte da Região Metropolitana de São Paulo, em um único cartão, proporcionando mais comodidade aos usuários.
“Hoje, quem mora em Osasco e trabalha em São Paulo precisa ter três cartões: o ‘Bem’ para circular dentro de Osasco, o ‘Bom’ usado no transporte que faz conexão intermunicipal, e o Bilhete Único, utilizado dentro de São Paulo.”
Júlio Santiago conta que em breve o negócio estará operando na Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG). “Em São Paulo, estamos em contato com as companhias de transporte para evoluir o projeto de integração, para que o pagamento de passagem dos diversos modais seja feito com um único cartão, ou até mesmo por meio do smartphone.”
A ideia de criar o aplicativo Carona a Pé surgiu quando a professora Carolina Padilha fazia o trajeto de sua casa à escola onde leciona caminhando. “Ela sempre via as mesmas crianças indo à escola, cada uma delas acompanhada por um adulto e pensou que poderia levá-las, já que estavam indo para o mesmo local”, conta a sócia Renata Morettin.
A ideia foi sugerida às mães e o projeto piloto teve início. “Criamos uma rota experimental, sem intenção de expandir, mas as crianças que não faziam parte do grupo começaram a reclamar que a professora Carol (Carolina) gostava mais de alguns alunos. Assim surgiu o Carona a Pé.”
Em 2016, outras escolas se interessaram pelo projeto e as três sócias iniciaram a profissionalização da gestão e traçaram um plano de crescimento. “Até o final de 2017 estávamos em três escolas particulares de São Paulo. Neste ano, por meio do edital Desafio InoveMob, promovido pela Toyota Mobility Foundation, fomos um dos cinco negócios selecionados entre cem inscritos. Ganhamos aporte financeiro para implantar o projeto em outra cidade.”
Hoje, o projeto está em oito escolas públicas de Belo Horizonte. “Formamos dois multiplicadores entre os funcionários de cada escola e depois treinamos os condutores, que são pessoas ligadas às crianças de cada rota e que se revezam.”
Entre os ganhos ela lista: a criança se apropria da cidade onde vive, ganha segurança ao andar em grupo, há redução no trânsito e na emissão de poluente. “Além disso, caso essas crianças venham a dirigir um carro, serão condutores mais conscientes, porque observam os delitos dos motoristas e chamam a atenção deles.”
CENÁRIO
47%
é o porcentual de paulistanos que ganham até dois salários mínimos e usam ônibus como principal meio de locomoção. Índice consta de estudo feito pela aceleradora Artemisia
57%
é o porcentual de moradores de comunidades do Rio que se deslocam a pé ou de bicicleta, frente a 37% dos demais habitantes. Bicicleta é modal com mais acesso em todas as classes sociais
64,1 bilhões
é o número de viagens que ocorrem por ano no Brasil envolvendo os diversos modais. Entre 2003 e 2014 houve aumento de 30% no número total de viagens, aponta o estudo da Artemisia
O Estado de SP

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