Presidenciáveis esquecem de ferrovias em plano de governo

Divulgação/CBTU – Ilustração
Nem parece que o país enfrentou no período pré-eleitoral crise de abastecimento com o movimento dos caminhoneiros e discutiu a redução da dependência do transporte rodoviário para o escoamento de carga.
O sistema ferroviário, apontado como alternativa ao tráfego de caminhões, foi praticamente esquecido por candidatos à Presidência da República em suas propostas de governo apresentadas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Dos 13 candidatos que querem substituir Michel Temer no Palácio do Planalto a partir de 1º de janeiro, quatro —Alvaro Dias (Podemos), Geraldo Alckmin (PSDB), Henrique Meirelles (MDB) e Vera Lúcia (PSTU)— não tratam do tema.
Os três primeiros falam apenas em melhorar logística, transportes ou infraestrutura.
Mas, mesmo entre os outros nove candidatos, associações do setor apontam a deficiência das propostas, apresentadas em alguns casos de forma genérica e vistas como superficiais ou irreais.
São os casos das propostas de recriação da extinta Rede Ferroviária Federal, de João Goulart Filho (PPL), e a de levar o país a 150 mil quilômetros de trilhos, integrante do “Plano de Nação para a Colônia Brasileira” de Cabo Daciolo (Patriota).
A rede ferroviária foi liquidada em 2005 e deixou dívida ao Tesouro Nacional de R$ 13,6 bilhões, além de passivo judicial superior a R$ 6 bilhões —a maioria de ações trabalhistas.
Atualmente, a malha do país tem 28,2 mil km, segundo estudo da CNI (Confederação Nacional da Indústria), e chegar a 150 mil km é considerada uma proposta impossível.
A extensão atual é praticamente a mesma que o Brasil tinha na década de 1920 e qualquer projeto ferroviário leva tempo médio de dez anos entre a concepção e a conclusão.
Entre os candidatos que têm aparecido à frente nas pesquisas Datafolha, Jair Bolsonaro (PSL) diz que é preciso integrar modais de transporte.
Fernando Haddad (PT), cujo plano foi entregue quando o candidato da sigla ainda era o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, afirma que o crescimento econômico exigirá investimentos em transporte de cargas e passageiros.
Ciro Gomes (PDT) também cita o transporte de passageiros —além do de cargas—, quase incipiente no país.
Já Alckmin afirma que vai priorizar investimentos em infraestrutura em parceria com a iniciativa privada para aumentar a competitividade.
Marina Silva (Rede) aborda o tema ao propor a renegociação de contratos da malha ferroviária, o que permitiria o aumento de investimentos.
Entre os problemas enfrentados pelo setor ferroviário estão concessões desatualizadas, falta de compartilhamento de trilhos, entraves de interconexão das ferrovias e o não uso de um terço da malha.
A alegada falta de políticas públicas também permite que cargas sejam transportadas em longas distâncias em caminhões, o que encarece o preço final dos produtos e gera perda de competitividade da economia nacional.
Segundo a CNT (Confederação Nacional do Transporte), as ferrovias transportam só 20,7% das cargas no país, ante os 61,1% do volume transportado por meio de rodovias.
“Quando comparamos o que foi proposto e o que nós apresentamos como sendo prioritário existe uma distância, uma diferença brutal”, disse Bruno Batista, diretor-executivo da CNT.
A confederação encaminhou aos candidatos propostas para o transporte. Elas contemplam os principais problemas de cada modal, investimentos, projetos prioritários, gargalos e soluções.
Para Batista, a ausência de projetos prioritários dos candidatos causa insegurança ao setor, o que, aliado à situação política e econômica, paralisa investimentos.
“Os candidatos, e talvez por uma própria tradição nefasta dos governos federais nos últimos anos, nunca viram o transporte como prioridade. De certa forma, não causa espanto isso não estar sendo abordado com a atenção que deveria.”
Ainda segundo ele, é preciso que o país priorize obras para aliviar o transporte rodoviário, o que será possível fazer de forma mais rápida com a estrutura ferroviária.
Para o diretor-executivo da ANTF (associação dos transportadores ferroviários), Fernando Paes, é sintomático que as ferrovias não tenham sido contempladas nos programas dos presidenciáveis.
Ele, porém, disse ter notado discurso diferente ao conversar com as equipes dos candidatos. “Elas estão interessadas em entender quais são as políticas públicas ou o programa de governo em andamento para o setor”, diz.
A prioridade do setor é a prorrogação antecipada das cinco concessões ferroviárias de cargas que, com três projetos que devem sair do papel, poderão fazer até 2025 as linhas férreas responderem por 31% do transporte de cargas.
Sem as concessões, o índice pouco cresceria, diz Paes.
Outro problema apontado pelo setor é que, de todos os presidenciáveis, só Haddad, Ciro, Boulos e Daciolo citaram investimentos no transporte ferroviário de passageiros.
Esse é o principal pedido feito pela Abifer (associação da indústria ferroviária) em documento enviado aos candidatos a presidente.
Entre 2010 e 2017, o setor entregou em média 334 carros de passageiros por ano, total que será de 298 neste ano. Para 2019, não há pedidos.
Isso fez os 10.000 empregos de 2017 serem reduzidos pela metade e a previsão é que o total seja inferior a 2.500 no próximo ano.
“Como temos as renovações antecipadas de concessões encaminhadas para ocorrer até o início do ano que vem, elegemos o transporte de passageiros no programa pela falta de visão futura imediata”, afirmou Vicente Abate, presidente da associação.
Segundo ele, de forma geral, os programas dos candidatos propõem menos do que o setor de fato precisa.
Folha de SP

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