Coletivo urbano está à beira do colapso

A falência do sistema de transporte público por ônibus no Brasil está prestes a se tornar realidade. Indicadores de perda de passageiros, de endividamento e de fechamento de empresas, além da visível deterioração da qualidade dos serviços prestados, são sinais evidentes desse lamentável processo que avançou sobre o setor.
Ilustração/ Arquivo UNIBUS RN

A tragédia anunciada não poupou as empresas, muito menos os passageiros. Ao contrário, o cidadão que depende do transporte coletivo para os deslocamentos diários passou a ser duplamente penalizado pela política equivocada do governo federal, que incentiva a propriedade e o uso de automóveis, provocando o crescimento vertiginoso dos congestionamentos urbanos. O resultado dessa perda de produtividade dos ônibus representa acréscimo de até 25% no preço das passagens.
Este é o pior dos mundos para o sistema de transporte público do Brasil. É o passageiro tendo de arcar com custos altos e ainda conviver com deslocamentos precários, sem conforto e sem garantias de chegar aos compromissos em tempo hábil, em função de regras definidas pelo poder público e da falta de priorização para os ônibus.
O atual retrato do transporte coletivo forjou-se nas últimas décadas. Desde meados dos anos 1990 o setor vem perdendo qualidade e desempenho, resultado do incentivo ao transporte individual. Nos últimos anos a situação se agravou, com sucessivas quedas no número de passageiros – da ordem de 25,9% no período de 2014 a 2017 – e o severo endividamento de mais de 30% das empresas, e 10% delas fecharam as portas entre 2014 e 2016.
Fatores como o acirramento da crise econômica, o represamento de tarifas e o consequente descumprimento dos contratos de concessão impulsionaram a degradação dessa atividade. No entanto, é preciso que se diga que muitas propostas de melhorias feitas pelas empresas operadoras foram ignoradas pelo poder público. Quando muito, foram apropriadas em discursos que não surtiram o efeito devido.
Assim, vieram as promessas do governo federal de um Pacto Nacional pela Mobilidade Urbana. A ideia não foi adiante, mesmo com o anúncio da implementação de projetos de melhoria na infraestrutura urbana – que hoje, de tão precária, é incompatível com o mínimo de qualidade exigida para esse transporte.
Por todo esse elenco de situações o setor finalmente dá um basta às promessas e se une para evitar a derrocada final. Colocou a situação “preto no branco”, no documento Carta de Brasília, enviado aos principais entes públicos ligados ao setor, e agora se volta à perspectiva de contribuir para a construção conjunta de novos planos de governo capazes de reabilitar a atividade no País.
Antecipa-se em divulgar propostas que incluem o financiamento de parte dos custos operacionais do transporte coletivo pelo transporte individual; englobam a retomada dos investimentos na infraestrutura urbana e a priorização do espaço destinado ao coletivo urbano; incluem a apropriação clara e transparente dos custos envolvidos na atividade e sua divulgação para toda a sociedade; sugerem a cobertura dos custos das gratuidades e de benefícios tarifários no transporte público por toda a sociedade, por meio dos orçamentos públicos, e não apenas pelos passageiros pagantes; e indicam outras ações necessárias e urgentes, que já foram enviadas às principais candidaturas à Presidência da República.
É hora de firmar um grande compromisso nacional em prol da reabilitação do transporte público no Brasil. As autoridades nos Estados e municípios ignoram que os ônibus urbanos transportam diariamente cerca de 40 milhões de passageiros e precisam ter condições mínimas para cumprir sua missão.
O alerta sobre a degradação do serviço de ônibus coletivo é feito desde 2013 pelo setor, só que agora o pedido de socorro não pode mais ser ignorado, sob pena de comprometer a continuidade do serviço, de ameaçar a sobrevivência das empresas e a manutenção de quase 500 mil empregos diretos gerados pela atividade. Quem assumirá o ônus?
Otávio Vieira da Cunha Filho
O Estado de SP

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