Foto: Alex Régis |
Mais de um terço dos deslocamentos no Brasil – cerca de 40% – ocorrem por meios não motorizados: a pé ou bicicleta. Desse total, 36% das viagens são feitas a pé e 4% por bicicleta, segundo dados da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Em dez anos, entre 2004 e 2014, o número de viagens feitas por bikes dobrou no país, segundo a entidade.
Os números da ANTP mostram que, apesar das dificuldades, as pessoas estão dispostas a pedalar para chegar ao destino, seja a lazer ou trabalho. Os desafios, porém, são grandes. As capitais brasileiras somam mais de 2,5 mil quilômetros de vias exclusivas para ciclistas (ciclovias ou ciclofaixas), mas parte delas apresenta problemas como falta de interligações para que as pessoas consigam fazer todo o seu trajeto em vias exclusivas.
“Temos uma boa malha cicloviária, mas falta conectividade”, afirma o diretor da Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), Rene Fernandes, que também critica a manutenção das vias. “Assim como há buracos nas ruas, existem buracos nas ciclovias e eles devem ser consertados”, diz Fernandes, que também é secretário-executivo da Câmara Temática de Bicicleta, que integra o Conselho Municipal de Trânsito e Transporte.
A adesão à bicicleta poderia ser maior se a infraestrutura oferecida ao transporte não motorizado fosse melhor. “O cidadão já utiliza a bicicleta como meio de transporte, mas utilizaria muito mais se a infraestrutura fosse melhor”, diz o diretor da Ciclocidade, amparado em pesquisas que mostram que, após a instalação de uma ciclovia em uma rua ou avenida, o fluxo de bicicletas na região aumenta em até 200%.
Para quem usa a bicicleta para ir ao trabalho, há desafios adicionais, como escassez de bicicletários. A ONG Mobilize lançou no ano passado um Guia de Mobilidade Corporativa, que orienta empresas a incentivar o transporte sustentável de seus funcionários.
O guia destaca ações como instalação de estrutura apropriada para os ciclistas, fornecimento de bicicletas, campanhas educativas e rotas para ciclistas e pedestres, inclusive no ambiente interno (grandes espaços corporativos que abrangem vários prédios ou campus universitário, por exemplo).
Há também o incentivo ao home office e escalonamento de horários para evitar horários de pico. “As empresas, que são naturalmente polos geradores de tráfego, têm a oportunidade de contribuir para um transporte mais sustentável”, diz o pesquisador Leonardo Kubitschek, um dos autores do guia.
A Bayer lançou em 2015 o programa BayBike. São 60 bicicletas à disposição dos funcionários e visitantes para rodar em ciclovias internas do complexo de 124 mil metros quadrados e 30 edifícios da sede da indústria farmacêutica, em São Paulo. “É uma alternativa sustentável e rápida de deslocamento, além de ser um incentivo para prática de atividade física”, diz o gerente de engenharia da Bayer, Luís Fernando Laurini.
De acordo com a pesquisa da ANTP, grande parte dos brasileiros se desloca a pé, seja por fatores econômicos (queda na renda, desemprego e custo do transporte), estruturais (falta de opção de transporte perto de casa ou trabalho) ou mesmo por opção. Os problemas de infraestrutura urbana, porém, são grandes, principalmente em relação às calçadas.
Pesquisa da Mobilize mostra que são registradas, apenas na Grande São Paulo, 170 mil quedas em calçadas todos os anos, o que gera um custo social de R$ 2,9 bilhões em despesas com tratamentos, perca de produtividade etc. “As ruas deixaram de ser um espaço destinado às pessoas para ser apenas dos veículos”, diz o presidente da Associação Brasileira de Pedestres (Abraspe), Eduardo Daros, que aponta problemas como falta de segurança aos pedestres, calçadas danificadas ou inexistentes em centenas de ruas e avenidas espalhadas pelas cidades brasileiras, principalmente nas periferias.
“A cidade inteira deve ser agradável e segura para quem anda a pé, e não apenas na Avenida Paulista ou no Parque do Ibirapuera”, diz Daros, lembrando que os calçadões devem ser bem planejados para evitar o que acontece hoje em regiões como o Centro de São Paulo, que ficam vazios fora do horário comercial. “O calçadão não pode ser uma solução isolada, ele tem de estar próximo ao transporte, para permitir maior acesso e estar à vida da cidade”, diz Daros.
Valor Econômico