Falta de subsídios aos transportes é o principal entrave para Brasil estar alinhado ao que há de mais avançado no mundo

Sistemas de transportes públicos com aplicativos de celulares que permitem maior interação entre os operadores e os passageiros; vários serviços e comodidades a bordo de um ônibus urbano, como acesso com qualidade à internet e pacote exclusivo de entretenimento; carregadores de celulares e notebooks em qualquer ponto dentro do veículo e, principalmente, as ruas e avenidas das cidades com os não poluentes e mais silenciosos ônibus elétricos.

Tudo isso já poderia ser realidade nos médios e grandes complexos urbanos no Brasil se o poder público participasse mais e, a exemplo do que já ocorre nas cidades de países mais desenvolvidos, subsidiasse pelo menos parte dos transportes coletivos.
Os subsídios, entretanto, não deveriam ser apenas para cobrir eventuais rombos financeiros dos sistemas, mas para avanços na qualidade de prestação de serviços, melhoria da imagem do transporte público junto à sociedade (o que poderia fazer com que mais pessoas deixassem o carro em casa) e para deixar os sistemas eficientes.
A opinião é do presidente da Metrocard, associação que reúne as empresas da região Metropolitana de Curitiba, Lessandro Zem, e do vice, Haroldo Isaak.
Ambos participaram da Busworld Europe 2017, maior feira de mobilidade urbana da Europa, que ocorreu no final de outubro em Kortrijk, na Bélgica, e reuniu quase 400 expositores de 36 países.
“Enquanto tratarem o transporte público unicamente custeado pela tarifa, ficará cada vez maior o abismo das tecnologias, avanços operacionais, conforto e qualidade”, disse Lessandro.
O entendimento dos executivos vai ao encontro do que o consultor e jornalista da área de transportes, José Carlos Secco, que também esteve cobrindo o evento. Secco disse que o ônibus é um dos meios de transporte mais adequados às necessidades em relação à mobilidade e que a gestão pública, em conjunto com os operadores, deve proporcionar avanços para os sistemas no Brasil.
“O ônibus é sim um modal fundamental para a mobilidade e para o bem-estar da sociedade e é visto e tratado desta maneira no mundo afora. Não há retórica. Os cidadãos, querendo ou não, vão precisar utilizar o ônibus. É fato. Então, o dever da gestão pública, dos operadores e da indústria é prover o usuário com o melhor”, disse o consultor, que ainda destacou que os trólebus voltam a ser vistos como alternativas interessantes para aliar baixos custos de operação e preservação ambiental, 
O trólebus como tendência mundial já com modernização nos modelos também foi destacado pelo vice-presidente global da Iveco Bus, Sylvain Blaise, em visita ao Brasil, no início desta semana, durante o Iveco Bus Experience, um programa em parceria com o setor acadêmico para discutir como deve ser o transporte coletivo no Brasil.
“A Iveco acredita sim no trólebus, que evoluiu. É uma solução de mais de 100 anos que agora volta a ser considerada pelo mundo desenvolvido pelo baixo custo e sua modernização. Hoje os trólebus possuem baterias, que permitem que trafeguem por trechos de linhas (e não somente em casos de emergência) sem estarem conectados aos fios aéreos. Atualmente, a Iveco tem cerca de dois mil trólebus em circulação” – disse o executivo.
Sobre tecnologia e modelos futuros de transportes para o Brasil, o presidente da Metrocard, Lessandro Zem, ainda afirmou, ao Diário do Transporte, que o Projeto CIVI, selecionado pela prefeitura de Curitiba, num processo de manifestação de interesse, para reformular os transportes em parte da capital paranaense e da região metropolitana, reúne as principais características dos veículos e sistemas apresentados no evento internacional.
Pela proposta, seria criada uma malha de corredores de aproximadamente 100 quilômetros de extensão, divididas em cinco eixos troncais: Aeroporto/Centro Cívico; Tamandaré/Cabral; Linha Verde; Araucária / Boqueirão; e Norte/Sul.
Haverá estações subterrâneas como as de metrô, em ao menos seis quilômetros desta rede. Os ônibus seriam elétricos puros ou híbridos.
CIVI – City Vehicle Interconnect é a nomenclatura que indica que ônibus, estações, passageiros e os CCOs seriam integrados por meio de tecnologia. Cerca de 300 estações tubos seriam interconectadas por cabos de fibra ótica e os passageiros teriam wi-fi, painéis com informações sobre os horários e as linhas, além de ar-condicionado nos espaços. Hoje a ausência de ar condicionado e a defasagem dos modelos de estações-tubos estão entre algumas das críticas que recebe o sistema de transportes de Curitiba e região.
Ônibus elétrico da Volvo com a “recarga de oportunidade”. Baterias podem ser recarregadas de forma rápida no meio do percurso

Lessandro também defendeu, na entrevista, que os empresários de ônibus se unam em prol do financiamento público dos transportes e que se modernizem.
“Os empresários devem estar adaptados às mudanças de conceito da tecnologia, da produtividade, da profissionalização visando otimização de custos no sistema e defender o subsidio no transporte coletivo de forma irreversível”
CONFIRA A ENTREVISTA NA ÍNTEGRA:

Diário do Transporte:  Quais as novidades que o senhor acompanhou na Busworld Europe 2017 e que acredita serem viáveis para o Brasil? 
Lessandro Zem: Há inúmeras novidades a serem implantadas, mas atualmente muito se esbarra no custo que isto refletiria nas passagens do transporte coletivo, pois no Brasil não há cultura de subsídio direto ao transporte, existe cultura que tudo deve ser pago pelo usuário, e isso prejudica muito as novidades de serem implantadas. Tais como sistemas informatizados de contagem de passageiros por câmeras, USB em todos os pontos do veiculo (para carregamento dos celulares), publicidade diversa no interior do coletivo seja via display ou bancos, sistema de interatividade via aplicativos, bagageiros internos, e a maior tendência: de ônibus 100% elétricos/ híbridos.
Diário do Transporte: Em relação aos transportes na Região Metropolitana de Curitiba, o que é tendência no mundo e que ainda não foi aplicado no sistema, mas poderia?
Lessandro Zem: USB em vários pontos do veículo, sistema de entretenimento via aplicativo, publicidade via display, bagageiro interno e câmeras de contagem e segurança, lógico que tudo novamente relacionado ao custo de implementação.
Diário do Transporte:  Como, na visão dos especialistas e expositores, deve ser o ônibus do futuro? 
Lessandro Zem: Em sua maioria elétricos/híbridos e com muita tecnologia a bordo.
Diário do Transporte: Diante do que o senhor viu no evento, em que o Brasil está adiantado e no que estamos atrasados?
Lessandro Zem: No Brasil, em razão da cultura, a bilhetagem eletrônica é mais avançada, visando a segurança e uso indevido dos cartões.  Mas ainda estamos atrasados nas implementações efetivas na disposição das tecnologias para usuários e operadores.
Diário do Transporte: A Metrocard, juntamente com a Volvo e com um grupo de construtoras, tem o projeto CIVI, para a capital e região metropolitana. Em linhas gerais, no que este projeto é compatível com as tendências que o senhor acompanhou no evento? 
Lessandro Zem: No projeto realizado nesta parceria estamos totalmente alinhados ao que foi exposto no evento, tudo muito ligado à interconectividade, tecnologia a disposição dos usuários e operadores e a tendência de ônibus híbridos/elétricos, e na linha de PPP- Parceira Público Privada que existe subsídio pelo poder público.
Diário do Transporte: Em relação ao financiamento dos transportes, hoje no Brasil, basicamente feito somente pelas tarifas. Como os especialistas internacionais veem a questão e o que serve para o país?
Lessandro Zem: Este é o nosso maior problema: enquanto tratarem o transporte público unicamente custeado pela tarifa, ficará cada vez maior o abismo das tecnologias, avanços operacionais, conforto e qualidade… Exemplo disso é que temos várias leis que nos proíbem inclusive de realocarmos mão de obra para uma requalificação, veja o caso dos cobradores. A tendência mundial é tudo automatizada, para redução de custos e maior aproveitamento operacional das estruturas, visando sempre a qualidade, conforto, atratividade, ao buscar um custo atrativo ao usuário.
Diário do Transporte: Falamos dos sistemas, bilhetagem e modelos de ônibus do futuro. E como devem ser os empresários de ônibus e os passageiros do presente-futuro? Em que precisamos evoluir? 
Lessandro Zem: Os empresários devem estar adaptados às mudanças de conceito da tecnologia, da produtividade, da profissionalização visando otimização de custos no sistema e defender o subsidio no transporte coletivo de forma irreversível, pois sem ele infelizmente não haverá transporte coletivo sustentável e que possa trazer o que são aplicados nos países europeus. E o passageiro do futuro deve estar alinhado com o mundo tecnológico de aplicativos, pagamentos virtuais, sentir o beneficio do transporte coletivo sobre o individual… enfim…. avaliar que o ônibus é mais rápido, seguro, que tem maior qualidade de vida e que seu custo é extremamente positivo a ele.
Diário do Transporte

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Pular para o conteúdo