Enquanto alguns setores do transporte coletivo já dão como certa a eliminação dos cobradores no sistema em Curitiba, outros ainda lutam para que os postos de trabalho sejam mantidos. Nesta ala dos que acreditam que haverá a eliminação de qualquer jeito, abre-se uma nova batalha: a da criação do cargo de agente de bordo, ou seja, uma mão de obra humanizada para auxiliar idosos e portadores de deficiências, dar informações aos usuários, organizar o embarque e desembarque, entre outros auxílios aos passageiros e ao motorista, em manobras mais arriscadas e para não desviar a atenção do condutor com questões não relacionadas ao trânsito. Assim, se os cobradores forem eliminados, assumiriam o novo cargo de agente de bordo.
Foto: Jonathan Campos |
O motorista de ônibus Jarbas Maranhão é um dos que defendem a criação do novo cargo, pois entende que cobrador ou agente são funções de extrema importância para auxiliá-lo. Caso contrário, o motorista tem que sair do seu posto de trabalho para ajudar pessoas a embarcarem e desembarcarem, dar informações, ou parar no meio do trajeto para ajudar pessoas passando mal dentro do coletivo, por exemplo – detalhes que acabam atrasando a linha. Também entende que é essencial alguém orientá-lo durante manobras sem visibilidade.
Cortar pra baratear
O prefeito Rafael Greca e a Urbanização de Curitiba S/A (Urbs) vêm considerando a possibilidade de substituir gradativamente os cobradores pela cobrança eletrônica de passagem, alegando que a eliminação dos postos de trabalho baratearia a tarifa. Hoje, 53% da planilha de custos do sistema de transporte é para a folha de pagamento de motoristas e cobradores). “Mas isso de reduzir tarifa é jogada de marketing. Podem até reduzir por uns dois ou três meses, mas depois jogam lá pros R$ 5. Isso só vai aumentar a lucratividade das empresas e da Urbs. Sem cobrador, a qualidade do serviço piora muito”, defende Jarbas.
Conforme o motorista, se a eliminação dos cobradores ocorrer, cerca de cinco mil trabalhadores ficarão desempregados. “A ideia do prefeito é demitir 5 mil pra agradar 1,5 milhão de passageiros [fluxo diário no sistema de transporte]. O país está em crise. Imagine mais 5 mil desempregados no mercado”, analisa.
Pequenas reduções
Nos últimos dois anos, releva o trabalhador, pequenas medidas tomadas pela prefeitura já reduziram em 10% a quantidade de cobradores. Entre elas estão a eliminação dos profissionais nos micro-ônibus (onde a cobrança é 100% eletrônica, só com o cartão de transporte); substituição dos ônibus grandes por micro-ônibus em algumas linhas com poucos passageiros aos fins de semana; colocação de apenas um cobrador em tubos com entrada dupla, após às 19h durante a semana e aos fins de semana; e a manutenção de dois cobradores em terminais que antes possuíam quatro ou mais, por exemplo. “Também existe a conversa de substituir os cobradores em todas as linhas convencionais (ônibus amarelo e laranja) pela cobrança eletrônica”, diz.
Humanização?
“Em Curitiba, temos cerca de 300 mil pessoas com alguma dificuldade de locomoção. O motorista não tem como sair do seu posto a todo momento para ajudar estas pessoas, por exemplo, ou os idosos, no embarque e desembarque, dar informações, orientar turistas. Os jovens se adaptam facilmente ao uso exclusivo do cartão de embarque. Mas e a melhor idade, os cadeirantes, o deficiente visual? Não vão se adaptar tão facilmentel. O agente de bordo daria toda essa assessoria”, diz Jarbas.
Em Sorocaba (SP), Belo Horizonte (MG) e Cascavel (PR), cita o motorista, há o agente de bordo, o que torna o serviço mais humanizado. Já em algumas cidades de Santa Catarina, argumenta ele, é o motorista quem faz a cobrança e ajuda os usuários, o que torna o serviço ruim e mais demorado. “Sem contar que nestas cidades está uma das tarifas mais caras do país”, afirma.
Em análise
A Urbs, que é a gestora do sistema de transporte, pode eliminar os postos de trabalho, mas não tem poder de criar novos cargos, como o de agente de bordo. Isso dependeria dos vereadores criarem um projeto de lei e ele ser aprovado em plenário. Na Câmara Municipal de Curitiba, ainda não há nenhum projeto em trâmite com este teor.
A vereadora Professora Josete (PT), depois de ser procurada por um grupo de trabalhadores, apenas colocou em seu site pessoal uma enquete, para que as pessoas opinem se um agente de bordo é ou não importante dentro dos coletivos. Ela entende que esta é uma tendência no mundo todo, mas também julga importante a manutenção dos trabalhadores.
Já a Urbs não se posiciona contra ou a favor do novo cargo. Apenas confirma que a extinção dos cobradores é discutida há tempos, mas que o assunto está parado e nada deve acontecer a curto prazo. O Setransp, sindicato das empresas de ônibus, não se posicionou sobre o assunto até o fechamento desta edição.
Contra
O Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Curitiba e região (Sindimoc) é totalmente contra a eliminação dos cobradores e nem cogita a hipótese da criação do agente de bordo. Por enquanto, o Sindimoc está tranquilo porque, na última convenção coletiva da categoria, uma cláusula aceita pelos empresários e homologada na Justiça do Trabalho estipula que não haverá cortes no número de postos de trabalho de cobradores até a próxima convenção coletiva, ou seja, até fevereiro de 2018.
“Essa é a mesma conversa que a CUT implantou em Campinas. Criaram o agente de bordo, transferiram os cobradores para a nova função e depois demitiram todo mundo. Se fizerem isso em Curitiba, alertamos que é golpe. Estudos mostram que onde houve a eliminação de cobradores, não houve redução de tarifa e só caiu a qualidade. E também não se deve considerar o argumento da redução de assaltos, porque os ladrões estão mais focados nos passageiros, que carregam celulares, dinheiro, joias. É claro que, se for criado o cargo de agente de bordo, 90% dos postos de trabalho de cobrador seriam cortados. Mas como demitir em massa é ilegal, jurídico e politicamente desgastante, farão gradualmente. O Sindimoc vai lutar com unhas e dentes para evitar isso”, defende o sindicato laboral, via assessoria de imprensa.
Baixou!
Porém um exemplo recente de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), derruba o argumento de que a retirada dos cobradores não barateia tarifa. No final de dezembro de 2015, quando 100% das linhas urbanas do município passaram a aceitar somente pagamento com cartão, o preço da passagem caiu de R$ 2,95 para R$ 2,85. Atualmente, enquanto a passagem em Curitiba custa R$ 4,25, a dos ônibus que transitam dentro da cidade metropolitana sai por R$ 3,70. Mas há reclamações sobre a impossibilidade de pagamento em dinheiro, principalmente por passageiros eventuais, como turistas ou pessoas que habitualmente não utilizam o transporte coletivo.
Natural
Em nota, o Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana (Setransp) informou que “vê o processo de substituição da função do cobrador como algo natural, afinal isso já ocorre nas cidades brasileiras que possuem os sistemas de transporte mais modernos”. Segundo a entidade patronal, “o papel das operadoras é oferecer requalificação aos seus colaboradores para que eles sejam profissionais mais capacitados, conquistem cargos mais altos e, portanto, mais bem remunerados e tenham mais segurança no ambiente de trabalho”. A respeito da proposta de criação do agente de bordo, o Setransp explicou que tem por preceito não comentar projetos do Legislativo.
Tribuna do Paraná