Ganhava repercussão, há cinco anos, o fim das operações da empresa Riograndense em Natal. Tradicional, a Riograndense era a empresa mais antiga do Estado, tendo sido fundada em 1951, inicialmente com operações de linhas rodoviárias e da grande Natal. A partir dos anos 90, também ingressou no transporte urbano, operando linhas na capital, Natal, até aquele domingo, 12 de agosto de 2012, dia em que os ônibus foram recolhidos e um recado informava aos operadores que a empresa não iria mais atuar “em razão do desequilíbrio econômico-financeiro do contrato com a prefeitura”.
Cobradores e motoristas que foram trabalhar no início da manhã deste domingo foram pegos de surpresa ao não encontrarem os ônibus da Viação Riograndense na garagem por volta das 4h. Segundo o motorista Hélio Ferreira, o dono da empresa, José Venâncio Flor, chegou na sede à meia-noite e levou os ônibus para Parnamirim e Cidade da Esperança. A informação não chegou por um comunicado oficial, mas sim por meio de um funcionário que ficou encarregado de passar o que tinha acontecidos aos demais colegas.
“Chegamos para trabalhar e não vimos os ônibus. É estranho eles decretarem falência quando não houve indício de que isso ia acontecer. Eles estavam pagando nossos salários e o vale-alimentação normalmente”, disse Hélio Ferreira.
Trecho de reportagem do jornal Tribuna do Norte
A Riograndense já dava sinais de que sua situação não era das melhores. A empresa tinha uma frota pequena, com apenas 30 carros, mas com grande dificuldade de manutenção e consequentemente incapaz de atender suas linhas (03 – Nova Natal/Campus, 03 – Nova Natal/Viaduto de Ponta Negra, 28 – Nova Natal/IFRN, e 45 – Brasília Teimosa/Campus). Alguns meses antes de encerrar as operações, chegou a repassar a operação da linha 45 (que tinha o terminal na Praia do Meio) para a empresa Santa Maria, e concentrar suas atividades no conjunto Nova Natal (onde também ficava sua garagem), tentando reforçar a operação na área. Meses depois, retomou a operação da 45.
Após o fim das atividades em Natal, a Riograndense emitiu nota afirmando que a falência já era esperada e acusou a falta de políticas para o setor de transporte como principal impedimento para as linhas continuarem a trafegar. A empresa citou que as políticas incentivavam o transporte individual de carros e motos. Além disso, a nota emitida pela Riograndense cita que os ônibus da empresa trafegavam em linhas congestionadas – sem alternativas para impor velocidade no serviço – e em “ruas esburacadas”. A empresa ainda criticou a defasagem na tarifa do transporte, e a falta benefícios fiscais para o setor de transportes, em Natal.
“A Riograndense, infelizmente, paralisou suas atividades neste domingo, dia 12 de agosto de 2012. E outras empresas seguirão este caminho caso o governo não tome decisões políticas visando revisar e adequar os valores da tarifa, reduzir a carga tributária como acontece em outros setores empresariais, a exemplo da isenção do ICMS do óleo diesel das embarcações pesqueiras e do querosene de aviação; redução do ISS como ocorre em várias capitais (Fortaleza, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, dentre outras); subsídio e controle de gratuidades.”
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“O serviço do transporte coletivo de Natal está à beira do caos. Caso não se adotem medidas urgentes e efetivas para a solução dos problemas aqui mencionados, a Riograndense é apenas uma amostra do que ocorrerá com os demais operadores de transporte da cidade”.
Trecho de nota divulgada pela Riograndense
Na ocasião do fim das atividades urbanas, a linha 132 – Jardim Petrópolis/Centro, de caráter semi-urbana, também deixou de ser operada pela Riograndense. Ela foi à única absolvida integralmente por outra empresa: a Oceano – que já a operava, em conjunto com a Riograndense.
Os usuários de Natal não puderam mais contar com os trajetos que eram oferecidos pela Riograndense. Somente em janeiro de 2013, quase seis meses após o fim das operações urbanas, foi que parte do conjunto Nova Natal – principal área atendida pela Riograndense – teve acesso à zona sul com uma opção de linha de ônibus. Isto aconteceu com a adaptação da linha 10-29 (Nova Natal/Nova Descoberta), que cobre parte do trecho da antiga linha 03, ligando usuários do conjunto Nova Natal a zona sul e ao Campus Universitário. Mesmo assim, a linha é motivo de constantes reclamações, a ponto da mudança de seu itinerário, para melhor atender o conjunto, ter sido negociado durante um aumento de tarifa recente em Natal.
Os trajetos das linhas 28 e 45 seguem sem qualquer perspectiva de serem retomados. A 45, inclusive, se quer é citada no edital de licitação proposto pela Secretaria de Mobilidade Urbana de Natal – STTU – demonstrando que o órgão não tem interesse em reativá-la, prejudicando os usuários.
Com a indefinição das linhas que iriam suprir a Riograndense – principalmente quando a 10-29 ainda não tinha iniciado suas operações – o sistema de trem urbano viu aumentar consideravelmente sua demanda, e passou a realizar viagens a partir da estação do conjunto Nova Natal para a Ribeira. Os usuários viram no trem uma opção mais ágil, aliada ao baixo preço da tarifa (R$ 0,50). Isso fez, inclusive, com que a única linha urbana de ônibus que restou partindo do Nova Natal em direção ao centro de Natal, a 64 (Nova Natal/Petrópolis, operada pela empresa Guanabara) tivesse sua frota diminuída de 17 para 15 veículos. A outra linha que também ligava o Nova Natal ao centro, a 10 (Nova Natal/Ribeira, também operada pela Guanabara) deixou de existir, e uniu-se com a 29 (Soledade II/Campus), formando a 10-29.
Já a Riograndense – que, como já dito tem suas origens nas linhas rodoviárias – voltou ao segmento que a originou, e passou a arrendar suas linhas. A empresa aproveitou a frota e estrutura já existente, alugando os trajetos a alguns de seus funcionários, que hoje mantém a viva a empresa nas estradas potiguares, atendendo municípios e distritos da grande Natal, litoral norte e da região agreste. Além deles, diversos outros locatários agregam seus ônibus à empresa, e operam suas linhas, formando uma espécie de cooperativa. Alguns dos veículos que haviam circulado nas linhas urbanas, inclusive, hoje operam na área rodoviária da empresa.
TRAJETÓRIA URBANA DA RIOGRANDENSE
No início dos anos 90, a Riograndense passou a operar linhas urbanas de Natal. A empresa era responsável pelas linhas 03 (Nova Natal/Campus), 28 (Nova Natal/ETFERN [a época]), 45 (Brasília Teimosa/Campus) e 59 (Brasília Teimosa/Guarapes [a época]). Fez grandes investimentos na renovação de sua frota ao longo de, praticamente, toda a década, com veículos novos e usados.
Entre o final dos anos 90 e a entrada do novo milênio, a empresa fez a renovação com 20 novos ônibus – 10 Urbanuss e 10 Micruss, da montadora Busscar, com motores Mercedes-Benz. Apesar disso, repassou a linha 59 para a empresa Conceição (que a opera até hoje). A Riograndense ainda chegou a comprar dois ônibus zero quilômetro, também da Busscar, com chassi Volkswagen, no início dos anos 2000.
A qualidade de seus serviços piorou consideravelmente a partir desta época. Novas renovações de frota para a área urbana só foram feitas em 2007, e as últimas em 2009 – estas, em uma compra conjunta com as demais empresas de transporte de Natal.
No final de suas operações, ainda haviam ônibus fabricados em 1994 circulando na frota da Riograndense.
Fotos: Acervo UNIBUS RN/Marcelo Andrade/Alex Azevedo/Helckton Fernandes/Daniel Silva