Motor dianteiro e calor: É hora de humanizar o transporte de verdade

Muito se fala em humanização do transporte: até mexer com o bolso. Nesta época de calor intenso se para quem trabalha e dirige o próprio carro ao conforto do ar-condicionado a situação já não é a das melhores, a exposição de várias classes de trabalhadores a altas temperaturas faz com que seja necessário rever alguns ambientes do exercício da profissão. É o caso de motoristas de ônibus, em especial os que trabalham com os modelos de motor dianteiro.
Com um termômetro digital de precisão, foi possível verificar que no posto de motoristas a temperatura varia entre 42 graus e 54 graus enquanto a temperatura externa marcava 31 graus.
“É a pior época do ano para trabalhar. Levo uma toalha para secar o suor, dá cansaço demais, dores no corpo. Tento levantar um pouco a calça porque a empresa não deixa vir com bermuda. E por cima, tenho de dirigir e cobrar. Chego em casa acabado” – diz o motorista de uma linha de Santo André, no ABC Paulista, que pediu para não se identificar.
“Não agüento. Falam para tomar água toda a hora. Eu compro água gelada, depois de 15 minutos está quente. Não dá pra beber. Nessa linha dá para colocar ônibus [com motor] traseiro. O patrão põe esses de motor dianteiro porque são mais baratos” – reclama o motorista de outra linha também de Santo André.
O que o condutor falou é um fato. Ônibus com motor dianteiro pode custar até 20% menos que um veículo de porte semelhante com motor atrás. Além disso, a manutenção destes modelos é mais barata também.
É fato que nas cidades brasileiras, as vias em má estado de conservação, a topografia irregular, com verdadeiros morros a serem desafiados pelos coletivos, o crescimento desorganizado dos municípios que faz com que vários bairros sejam compostos por vielas, se pensar em extinguir os ônibus de motor dianteiro é algo impossível no momento.
É importante destacar também que os modelos de ônibus mais novos têm um melhor isolamento acústico e térmico, mesmo sendo com motor dianteiro. Mas não há como negar que por maior que seja a tecnologia, motor na frente é sempre mais quente e barulhento.
Outro ponto importante de se frisar é que muitas linhas necessitam de veículos com esta configuração por causa das más condições de tráfego. No entanto, grande parte dos trajetos hoje atendidos por ônibus deste tipo poderia ter sim veículos mais confortáveis para o motorista que sempre extrapola a jornada de trabalho e não fica menos de 8 horas por dia ao volante.
Na Capital Paulista, grande parte dos ônibus é de motor traseiro. Na vizinha região do ABC, a realidade é diferente. Em Santo André, há poucos veículos assim, a exemplo de São Bernardo do Campo. Em São Caetano do Sul, só os modelos maiores, em Mauá, todos os ônibus têm motor na frente. A cidade já teve modelos articulados com motor central, mas a prefeitura trocou de empresa e em vez de articulados, a atual operadora Suzantur optou por veículos menores que os articulados, de três eixos, também com o propulsor na frente. Em Diadema e Rio Grande da Serra, os municipais também só contam com ônibus de motor dianteiro.
Com exceção de Rio Grande da Serra, em todas as cidades da região, há mais linhas que poderiam ter os veículos com motorização traseira ou central que são melhores tanto para passageiros como para motoristas. O corredor Metropolitano ABD, entre São Mateus (zona Leste da Capital) e Jabaquara (zona Sul), com extensão entre Diadema e estação Berrini da CPTM (zona Sul de São Paulo) parece ser outra realidade. Além de parte dos veículos ser composta por trólebus ou por ônibus diesel com ar-condicionado, não há motor dianteiro na frota. Por ser uma estrutura de corredor segregado, mais largo para manobras, com piso rígido e poucas interferências como lombadas e valetas, o tráfego destes ônibus melhores é possível.
Barulhentos: Outra característica dos ônibus de motor dianteiro é que eles são mais barulhentos em especial para quem está ao volante, passando mais de um terço do dia ao lado do propulsor.
Levantamento divulgado pelo Conselho Regional de Engenharia do Rio Grande do Sul, feito pelo engenheiro Adriano Colusi, em ônibus com motor dianteiro de marcas, modelos e anos diferentes mostra que trabalhar em coletivos deste tipo significa estar exposto ao limite ou até mesmo ultrapassar o tolerável de ruído de acordo com o Ministério do Trabalho. Enquanto o organismo pode tolerar 85 decibéis por oito horas (praticamente a jornada de um motorista), há modelos que em movimento chegam a emitir 87,1 decibéis. 

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