Enquanto a maioria dos cariocas que anda de ônibus abomina ficar em engarrafamentos, Wellington da Conceição Barbosa adora entrar em coletivos quando o trânsito está bem lento. E, para ir ao trabalho, ele escolhe justamente os que passam por vias mais congestionadas. Não é para menos. O trabalho de Wellington é sobre rodas. Ele ganha a vida há 12 anos cantando e tocando violão em coletivos que circulam pelo Rio e, quando o tráfego está mais pesado, consegue apresentar-se com menos solavancos, além de garantir mais atenção do público. Morador do bairro do Cachambi, na Zona Norte, pode ser visto — e ouvido — diariamente nas linhas que passam pelos bairros do Méier, Lins, Grajaú e Tijuca. O repertório é das antigas: canções como “Casinha branca”, de Gilson, “Sonhos”, de Peninha, e hits de Márcio Greyck, Gilliard e José Augusto.
“Meu público é principalmente de gente mais velha, e eles pedem este tipo de música. Mas às vezes alguém mais jovem pede alguma do Legião Urbana ou do Jota Quest”, explica Wellington, que é filho de uma cantora de forró com um violonista de música clássica.
Alheio ao clima carnavalesco, na última quinta-feira, Wellington Barbosa entrou num ônibus da linha 247 no bairro da Tijuca e, em vez de uma marchinha ou um hit mais animado, cantou um hino contra a repressão política da década de 60, “Para não dizer que não falei das flores” , de Geraldo Vandré. Antes de começar, explicou porque estava ali e quem foi Vandré. O ônibus estava vazio e, ao final da apresentação, vários passageiros bateram palmas e doaram moedas. Houve, ainda, quem ignorasse o show e seguisse viagem mexendo no smartphone. Duas senhoras comentaram que a música ajudava a passar o tempo no engarrafamento.
Trabalhando de segunda a sexta-feira, o músico fatura em média R$ 120 por dia com seus shows em coletivos. E coleciona história de passageiros, tanto de fãs quanto de desafetos. Numa viagem num ônibus da linha 249, aos primeiros acordes foi destratado por uma médica, que reclamou do barulho. Foi defendido pelos outros passageiros, que, para provocar a “reclamona”, seguiram da Rua Dias da Cruz até a Avenida Rio Branco pedindo uma série de músicas ao artista.
“Sempre faço a mesma coisa. Pago a passagem antes de entrar e explico aos passageiros que estou ali trabalhando, mas que ninguém é obrigado a me dar dinheiro. Paga quem gostar. E eu nunca entro em ônibus lotado, tem que ter no máximo cinco pessoas em pé. Não quero correr o risco de machucar alguém com o violão”, diz ele, que trabalha usando sapato de couro, calça jeans e camisa social.
Wellington conta que já passou dificuldades quando trabalhava vendendo balas e doces nas ruas, mas que após trocar de “mercadoria” nunca mais passou fome. “Há 12 anos, cheguei em casa, depois de um dia de trabalho, desesperado, chorando, sem dinheiro para comprar comida para minha família. O filho de um amigo me viu e perguntou: “Por que, em vez de tocar de graça nas festas dos amigos, você não pega seu violão e vai tocar nos ônibus?” Fiz isso no dia seguinte e ganhei R$ 180 num só dia”.
Fonte e foto: Jornal O Globo (RJ)